Lamento discordar desse grande jornal, o “Estadão” —
14/07/2016, A3 —, que assino há mais de vinte anos e que só tem um defeito
formal: letras miúdas demais. Mas para que servem as lupas? Importei uma, da
China, com 14 cm de diâmetro. Com luz, maravilha! Demorou quase um mês para
chegar, mas chegou! Vou pedir outra. O problema não é do jornal, óbvio, mas da
minha encorpada cronologia biológica, conjugada com um probleminha ótico especial.
No mais, é jornal modelo, corajoso, investigativo e coerente. Sem ele o Brasil não
teria avançado tanto na busca da moralização da prática política.
Onde discordo, topicamente, do jornal? Na sua condenação
redonda, absoluta, inapelável, da CPMF, não a considerando como início de uma
técnica nova, promissora, ótima para simplificar a arrecadação dos tributos.
Especialmente — neste momento brasileiro —, para arrancar, mais rapidamente o
país do atoleiro fiscal em que foi lançado por anos seguidos de uma
administração federal incompetente, demagógica e nada honesta. Interessada mais
em se perpetuar no poder do que em beneficiar os pobres. Pobres que agora, após
darem o voto, em confiança, sentiram-se enganados e voltaram à antiga pobreza, via
desemprego.
Aprecio o invulgar esforço mental, até físico, do competente
ministro Enrique Meirelles visando curar — em alguns anos —, uma espécie de “doença”
crônica, orçamentária, fiscal e moral que, ultimamente, está em fase agudíssima,
gerando inflação, desemprego, insegurança, interinidade, cisão política (!?) dentro
da Corte Máxima, ameaças “jararaquianas” de retorno ao poder, Congresso confuso
e população mais ainda.
Não haveria, talvez — perguntaria ao lúcido Meirelles —, um
meio qualquer, uma “nova técnica” que permitisse a recuperação rápida, em poucos
meses, de nossa economia, sem precisar dos longos planos anuais por ele
mencionados em entrevistas?
Intimamente, Meirelles sabe perfeitamente o que deveria
fazer. Acontece que o notável economista está consciente de que não é um rei,
com poder absoluto, e a democracia tem o seu calcanhar de Aquiles: a
necessidade de agradar a grande maioria. Como existem mais tolos do que sábios,
em todos os países — ninguém pode contestar isso —, e o poder do voto está na
maioria, é fácil imaginar a difícil tarefa, mentalmente honesta, de propor o
que é certo, ou momentaneamente certo, mas que parece errado. Especialmente em
um país já encharcado de tributos. Refiro-me à CPMF, remédio neste momento,
amargo, mas que, aplicado conjuntamente com outras terapias, pode retirar mais
depressa o país de uma crise que o ridiculariza perante outros países menos
devastados por seus governantes.
Neste artigo, sugiro um pouco de “mel financeiro” para
compensar o amargor do tratamento severo, à maneira de certos remédios, para menores
de 12 anos, que incluem um pouco de açúcar para melhor aceitação das crianças (os
revoltados eleitores). Esclareça-se: os laboratórios colocam o açúcar para o
bem delas. Sem o leve adocicado, elas não tomariam o xarope. E não há enganação
do laboratório porque o açúcar está mencionado na bula. É para a garotada
gritar e menos e não fazer escândalo. Não se pode, bater em criança.
Situações extremas, excepcionais — nosso débito trilionário,
se incluídos os juros da dívida —, exigem remédios igualmente excepcionais. Assim
como acontece na Medicina, a contundência do tratamento varia conforme o situação
real — sem trocadilho — do doente; não conforme a simpatia ou antipatia que ele
sente por tal ou qual método de curar. Na situação de “ou operamos ou ele
morre!”, é geralmente a família, não o paciente, quem dá a palavra final. O
praticamente “condenado” não pode, ou deve, escolher, ao gosto, entre homeopatia,
florais, alopatia, quimioterapia, radioterapia, cirurgia não-invasiva, arriscadamente
invasiva, transplante, amputação ou até mesmo castração: — “O que você prefere,
pergunta o médico” —, já cansado com a dúvida do cliente —: “ser enterrado
inteiro, logo, logo, ou ficar vivo, desfalcado em algumas gramas e tomando pílulas
de hormônio?”
Talvez eu tenha exagerado na deselegância da última
comparação, mas a intenção foi boa, tal o preconceito existente contra um
imposto que seria o ovo de colombo para um novo mundo tributário mais
simplificado. Que não desperdice tanto tempo e energia com a invencível burocracia,
confusa e inerente ao atual sistema fiscal, inchado de normas. Com guias e mais
guias, prazos e mais prazos, milhares de páginas de assuntos tributários
complexos, suscitando divergências de interpretação e até ensejando a venda de
decisões administrativas, como já noticiado na mídia. E pior: obrigando o
contribuinte a buscar a madeira e montar, ele mesmo, a própria cruz, sob pena
de cadeia. O fisco apenas envia um e-mail, ou publica uma norma, e o
contribuinte que se vire, imprima guias, escreva, calcule, etc. Se errar, multa
ou xilindró, terror fiscal que nem sempre é mera fanfarronice.
Na Revolução paulista de 1932 a população, por idealismo,
entregava suas joias — até as sentimentais alianças de ouro —, aos revoltosos.
Queriam ajudar na compra de armamentos contra um governo que consideravam
ditatorial, o de Getúlio Vargas. E esforços assemelhados sempre ocorreram, em
qualquer país, quando a população considera válida a filosofia de “vão-se os
anéis; que fiquem os dedos”.
Vivemos, hoje, uma situação parecida. Para sair de um
profundo fosso econômico-financeiro, Meirelles, faz das tripas coração e
esquadrinha todos os cantos da economia para elaborar um deglutível plano de
ação que conserte as finanças e torne nosso país mais atraente para
investidores externos, com isso criando empregos e restabelecendo a normalidade
da economia.
Meirelles apresenta três Planos. A, B e C. Neste último
estaria a eventualidade — que gostaria de evitar —, de aumentar impostos. E aí
estaria, latente, a CPMF. A respeito desta, reporto-me ao longo artigo — “A
volta da CPMF, agora com redução do I. Renda. Depardieu e Putin” — no meu blog,
http: //francepiro.blogspot.com/.
Tenham a bondade ou tolerância de ler. Se estiver errado
será nos detalhes, nos números, não no sentido, na concepção, que nem é minha.
No Brasil, quem vem lutando, há anos, pelo “imposto único” — e a CPMF seria o primeiro passo — é o jurista
Marco Cintra, um idealista que não deixa apagar a chama.
Em apertadíssima síntese, a CPMF — que incidiria nos
pagamentos via cheques, cartões de crédito e débito, saques e transferências
eletrônicas, tem as seguintes vantagens: ela é praticamente insonegável. É mais
fácil, ao governo, fiscalizar bancos financeiras do que milhões de empresários.
Retrata a realidade da economia; não prejudica tanto os realmente pobres, que
costumam pagar suas compras com dinheiro vivo. Tem um tremendo poder de
arrecadação. Digo isso tudo mesmo consciente de que muitos detalhes precisam
ser examinados e dosados, com utilização de sofisticadas estatísticas, não ao
meu alcance de não-especialista. O que interessa é a avaliação correta, não
aterrorizada, desse imposto por pessoas de alta competência. Um deles, entre os
melhores, o Min. Henrique Meirelles.
Uma pergunta cuja resposta gostaria que viesse do próprio
Meirelles: qual seria, provavelmente, a arrecadação da CPMF se sua alíquota
fosse de 1%, ou 1,5%? Outra pergunta: com ela, mais os cortes possíveis nos
gastos, mais as privatizações e outras medidas — securitização, etc. — seria
possível “consertar” nossas finanças até abril do ano que vem? Se não isso,
quando alcançaríamos a normalidade com a ajuda da CPMF? E nem menciono aqui os
efeitos da diminuição da roubalheira do dinheiro público, graças à Lava Jato,
assunto que não é da alçada de Meirelles.
Se a resposta for positiva — e sei que seria honesta — não
seria isso um estímulo para os brasileiros aceitarem esse esforço extra, embora
penoso, para “nos tirar rapidamente do buraco? Invoquemos o bem comum.
Na Inglaterra, durante a guerra contra a Alemanha de Hitler,
seus habitantes aceitaram com patriotismo, um forte racionamento. Dois
brasileiros que lá estiveram, nessa época, foram a um restaurante caro e cada
um pediu um bife. A carne foi servida e, como estava saborosa, os brasileiros
pediram outro bife. O garçom disse que não poderia fazer isso porque a lei, por
causa da guerra, só permitia aos restaurantes, servir um bife para cada
freguês. Os brasileiros argumentaram que essa lei era tola porque o cidadão inglês
poderia, terminada a refeição, ir a outro restaurante e pedir outro bife. O
garçom respondeu que nesse caso o freguês não seria inglês. Quem relatou esse
fato, em jornal, foi o inteligente João Melão Neto.
Não acho impossível que o contribuinte brasileiro, melhor
esclarecido pela mídia, venha a aceitar — como remédio amargo mas bem
intencionado, evitando sonegação e não “desviável” —, a CPMF, que pode, até,
futuramente, ser aceita em definitivo, desde que substituindo um ou uma série
de tributos. Assim como a geringonça voadora de Santos Dumont foi o ovo da hoje
sofisticada aeronáutica — que suplanta a velocidade do som e transporta até
elefantes —, a CPMF será um dia considerada o “14 Bis” tributário capaz de
evitar a sonegação e nos livrar da burocracia e roubo do dinheiro público antes
que chegue ao tesouro nacional.
Menciono, agora, o “açúcar” já referido, capaz de tornar
menos amargo o promissor remédio que precisa ser testado na prática. Esse
“adoçante” seria a drástica e concomitante redução de algum tributo que nos
incomoda muito, todo ano: a declaração de rendimentos. Lembrei-me — não sou,
obviamente, um tributarista — do Imposto de Renda, com alíquota máxima de
27,5%, que, no caso dos assalariados, é descontado no próprio holerite. Se a
CPMF for acoplada à simultânea redução, por exemplo, do I. Renda na fonte, com
alíquota — mero exemplo — de 10% para todos os ganhos, esse “alívio” tributário
certamente diminuirá a indignação pública contra “um maldito novo imposto!”
Obviamente, para conciliar o objetivo de aumento de tributos
com a simultânea diminuição do IR na fonte será preciso, sempre a título de
exemplo, que a CPMF seja fixada em 1,5%, sendo 1% para o governo aplicar onde
for mais urgente e necessário, e 0,5% para reduzir o percentual do IR.
Vladimir Putin, apesar de um ex-comunista disciplinado,
fixou, na Russia, poucos anos atrás, o percentual de 10% para todo o ganho
anual, seja ele muito ou pouco. Isso atraiu Gerard Depardieu para a cidadania
russa, quando ele soube que na França havia a intenção de elevar para 75% o
percentual desse tributo. Se Putin aumentou, o percentual depois, por causa do
cerco econômico da Rússia, não sei. Sei apenas que se o Brasil decidisse
padronizar, em definitivo, tal alíquota do imposto sobre rendimentos, milhares
de fortunas, de todo o planeta, afluiriam, em massa, para viver e/ou investir
no Brasil.
Se Meirelles considerar mais eficaz “compensar” o amargor da
CPMF com outro tributo — em vez da redução do IR na fonte —, nada a opor de
minha ignorante parte. Pensei no IR porque é um tributo que mexe diretamente
com o bolso (alma) do contribuinte. Com outros tributos isso não acontece.
Como este artigo já se esticou demais, fica aqui a
“consulta” ao brilhante Henrique Meirelles, tido como um trabalhador compulsivo
e capaz de avaliar quantitativamente a “ideia louca”.
Ideias são como ovos. Olhando-os não sabemos no que se
tornarão.
Será uma pena se este “palpite tributário” não chegar aos
olhos ou ouvidos de Meirelles. Ninguém poderá dar informação mais exata do que
ele, que conhece os detalhes do nosso fenomenal endividamento.
(16-07-2016)
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