Perdão
por título tão extenso. Considerando a falta de tempo da maioria
dos leitores e a pletora de textos disponíveis, é recomendável
esclarecer logo, ao estilo do twitter, se quem escreve é contra ou a
favor de tal ou qual proposta legislativa.
Neste
artigo, usarei os termos “imposto, tributo e contribuição” como
se fossem sinônimos, o que não são, obviamente. Tributo é um
termo genérico. Tomo essa liberdade redacional apenas evitando dano
à eufonia, com a repetição cansativa da mesma palavra, às vezes
na mesma linha. Prossigamos.
Em
fevereiro de 2013 publiquei no meu site —
www.franciscopinheirorodrigues.com.br
— um artigo, “Imposto único, com redução da carga tributária”.
Como esse artigo deve ter sido lido por pouquíssimas pessoas e o
tributo, hoje extinto, voltou à discussão, resolvi reapresentá-lo,
parcialmente modificado. Agora não mais como “provisório”. Seu
grande mérito está em possibilitar a substituição — sem risco
para as finanças públicas e com alívio do contribuinte —, de
dezenas de tributos por um pequeno número deles, no médio prazo. No
longo ou longuíssimo prazo a meta — talvez impossível — seria a
existência de um único tributo. O sonhado “paraíso tributário”.
Quando
se menciona, neste artigo, “Imposto Único” essa expressão deve
ser entendida menos como um “único” imposto — algo próximo da
utopia — e mais como um drástico enxugamento dos mais de cinquenta
tributos que hoje atormentam e sugam os contribuintes brasileiros.
Atormentam com a burocracia e sugam com o saque excessivo do dinheiro
do cidadão. A “nova” CPMF deve ser encarada pelo seu melhor
ângulo, aparentemente não percebido pelo próprio governo federal:
um teste de arrecadação e uma forma de tributar a movimentação da
riqueza de uma forma prática, sem burocracia e sonegação. Se todos
pagarem, da mesma forma, os tributos, todos pagarão menos, e com
menos papelada.
Na
Biologia, na Física, na Medicina, na Engenharia, e demais áreas,
até mesmo artísticas, a experimentação serve como prova da
verdade ou mentira, utilidade ou desperdício na forma de executar
qualquer trabalho. Sem testes a Ciência nunca poderia ter chegado
onde chegou. Na tributação o emperramento e os desvios continuam
firmes, por décadas. Basta ver as constantes divergências
interpretativas, nos Tribunais, entre fisco e contribuintes. Até
pouco tempo atrás, mais de um trilhão de reais de crédito — ou
abuso — tributário estava pendente, na justiça federal,
aguardando a decisão “final” — uma quase utopia —, do Poder
Judiciário. E sem culpa dos magistrados. Assim, por que não adotar
um sistema mais simples de arrecadação em que o dinheiro do
imposto, vá direto, para o Tesouro Nacional? Como, depois, dividir
sensatamente o “bolo” entre Estados e Municípios já é outro
assunto, aqui não abordado.
Grandes
avanços — em qualquer área —, geralmente dependem de um
sacrifício inicial. É o caso do algo “idealista” Imposto Único
que jamais poderá ser adotado sem um sério “teste” de
arrecadação. Esse “teste”, circunstancial, seria uma nova CPMF,
cobrando um determinado percentual em toda movimentação financeira
via cheque, cartão de crédito ou de débito, e transferência
eletrônica. A meta de toda tecnologia — inclusive a fiscal — é
atingir um resultado com o mínimo de gastos, desperdícios, demoras,
fraudes, burocracias e cansaço de quem a utiliza. U’a melhor
tecnologia interessa tanto para o governo — seja qual for o partido
— quanto para o contribuinte.
Sei
perfeitamente que 98% dos brasileiros não suporta a mera menção de
qualquer novo tributo, provisório ou não. Não querem ler, ou
sequer ouvir, nenhuma palavra em favor de novo ônus financeiro.
Sentem-se, no geral, tão “saqueados” pelos governantes, nas
esferas federal, estadual e municipal, que muitos já consideram
“compreensível” algum grau de sonegação, vista como única e
informal “legítima defesa contra esses governos que só pensam
neles mesmos, gastando a rodo, aqui e no estrangeiro, nomeando
parentes, amigos e cabos eleitorais, etc.” Em síntese, o grito do
brasileiro que paga os inúmeros tributos mas não recebe os serviços
correspondentes é um só: “os brasileiros não aguentam mais tanto
imposto!”
No
entanto, é justamente para diminuir a excessiva quantidade de
impostos no Brasil que se faz necessário um tipo de tributo que
suprima inúmeros outros. Sem prejuízo da arrecadação — até
melhorando-a! — e permitindo a todos — “cereja do bolo” —,
ricos e pobres, pagarem futuramente menos tributos. Isso mesmo, um
bendito paradoxo: pagar menos impostos logo após encerrado o “teste
de arrecadação” (a nova CPMF). O tão odiado “imposto do
cheque”, extinto em 1º de janeiro de 2008, já comprovou sua
eficácia, sem o desvio do dinheiro público antes dele chegar ao
Tesouro. Ele foi extinto porque foi mal utilizado. Era para ser
destinado apenas à Saúde mas isso não ocorreu. Por isso
desmoralizou-se. E tinha um defeito grave: não cancelava outros
tributos, apesar do montante arrecadado (mais de 40 bilhões por
ano).
Agora
poderia ser diferente. Com a nova versão da extinta CPMF, todos
pagarão, em igual proporção, um imposto que acompanha, sem ilusões
e constantes desvios, a real circulação do dinheiro.
Quando
redigia este artigo fiquei agradavelmente surpreendido, ao ler, no
jornal “O Estado de S. Paulo”, pág. A4, edição de 16/06/15,
que nosso íntegro Ministro da Fazendo, Joaquim Levy, em artigo
publicado no jornal Valor Econômico, edição de 17 de setembro de
2007, teceu elogios rasgados à CPMF, nos seguintes termos: “A CPMF
é hoje um dos tributos que gera menor distorção na economia. Além
de sua arrecadação, verificável e barata, ela alcança agentes que
escapam de outros impostos, aumentando a equidade do sistema como um
todo”.
Críticos
da CPMF quiseram tirar proveito da suposta contradição do ministro
porque agora mostra-se contrário à sua reutilização. Não há
contradição dele quanto às virtudes desse tributo. Como explicou,
ele é momentaneamente contra a proposta porque “há pouca
disposição do Congresso para aumentar a carga tributária”.
Apenas por motivos táticos, políticos, ele discorda de sua nova
cobrança, neste delicado momento político. Não chegou a relacionar
expressamente esse tributo com a ideia do Imposto Único (ou tendente
a ele) porque não foi indagado a respeito. Talvez, se indagado
especificamente, em “off”, considere que um novo sistema
tributário — mais simples, não burocrático, indesviável na sua
arrecadação — seria benvindo, e não só no Brasil. Um sistema
que dispensasse os cidadãos de uma enorme perda de tempo guardando
comprovantes, preenchendo guias e mais guias, contratando contadores
e advogados para solucionar as constantes e inevitáveis dúvidas
jurídicas decorrentes da pletora legislativa e reguladora, bem como
a repercussão de um tributo nos demais. Um péssimo subproduto desse
cipoal tributário é, como disse atrás, o congestionamento da
Justiça, travada por milhões de demandas tributárias.
Realmente,
pelo que se lê na mídia, a nossa carga tributária é uma das mais
altas do mundo, com pouco retorno. Por que isso ocorre? Por vários
fatores: incompetência, desonestidade, inércia, demagogia,
irresponsabilidade pessoal e fiscal, amor à “prole ampliada”
(nepotismo e empregos públicos sem concurso), e tudo o mais
relacionável ao caráter. Tais condições não serão abordadas
aqui mas uma coisa é incontestável, e digo de novo: se todos os
brasileiros pagassem os respectivos tributos, todos pagariam menos.
Uma melhoria da justiça fiscal, a nível pessoal. O montante da
arrecadação seria maior. Bancos e demais instituições financeiras
certamente não se atreveriam a alterar seus computadores e demais
aparelhos eletrônicos para não registrar as movimentações
financeiras. O Banco Central e a Polícia Federal teriam meios de
fazer a fiscalização. É mais fácil fiscalizar um número
relativamente pequeno de bancos do que centenas de milhares de
firmas. Uma das vantagens secundárias de um imposto do tipo da CPMF
está em preservar a moral de eventuais funcionários, menos
resistentes em resistir às tentações do dinheiro.
Obviamente,
se a transferência do dinheiro ocorre entre contas da mesma pessoa,
não há o que tributar, porque na verdade o dinheiro não circulou,
a menos que alguém explique, e convença, que essa operação pode
esconder alguma fraude fiscal.
Verificada
a arrecadação efetiva desse novo e inteligente tributo — por um
período de poucos meses, talvez três ou quatro — a critério do
Congresso e do Poder Executivo — esses dois Poderes extinguiriam
determinados tributos ou reduziriam as alíquotas de outros, tendo em
vista o enorme reforço financeiro resultado da alta arrecadação da
nova CPMF, que não será usada apenas visando à saúde, embora, no
momento esta mereça um cuidado preferencial.
Tento,
aqui, convencer o leitor a repensar o assunto, visto ainda com enorme
antipatia porque encarado como “mais um imposto!” e ponto final.
Não poderá ser apenas isso. A própria lei que criar esse
“revolucionário” tributo dirá expressamente que após “x”
meses de arrecadação o Governo terá que reduzir a sua arrecadação,
em “y %”. Ou extinguindo tributos ou reduzindo alíquotas em tais
ou quais impostos, sob pena de processo de responsabilidade. Essa
cláusula, da obrigatoriedade da diminuição do número de impostos,
ou dos percentuais atualmente existentes, não pode faltar, caso
vigore a nova CPMF. Os contribuintes já não confiam nos governos.
Sem uma ameaça legal de perda do cargo e/ou cadeia, os contribuintes
não aprovarão uma nova CPMF.
A
CPMF extinta em 2007 arrecadou, só naquele ano, com uma alíquota de
0,38% a quantia de 36,5 bilhões de reais. Há quem mencione que foi
mais do que isso.
Não
se alegue que com o desconto do “imposto do cheque”, no cartão
de crédito/débito e no pagamento via transferência eletrônica, o
sonegador passará a transportar fisicamente — no bolso, cueca,
pasta e mala —, grandes volumes de dinheiro vivo. Se ele assim
agir, os primeiros a saberem disso serão os assaltantes,
transfigurados em sanguinários “fiscais” da sonegação. Após
os primeiros tiros ou coronhadas dos meliantes, os “cofres ou mulas
de duas pernas”, assustados e sangrando, voltarão às formas
tradicionais de pagamento.
Não
teríamos, portanto, frise-se, apenas “mais um imposto”. Ele
seria o passo inicial para a substituição gradativa de “n”
tributos por uns poucos. Sua finalidade máxima estaria no combate à
sonegação e na simplificação das obrigações tributárias. Hoje,
quem paga Imposto de Renda são os assalariados e os contribuintes
mais íntegros — prejudicados pelos concorrentes que pagam pouco,
ou nada, e com isso podem vender seus produtos e serviços com preço
mais baixo. A obediência fiscal, atualmente, é uma desvantagem.
Não
muito tempo atrás li, na imprensa, que os brasileiros estão, em
massa, comprando apartamentos na Flórida, pagando com dinheiro vivo,
“cash”. Essa forma preferencial de pagamento não seria um
indício de “Caixa 2” em grande escala?
Não
sou, obviamente, um tributarista. Opino aqui como mero cidadão
contribuinte, sempre surpreendido com a imensa complexidade fiscal.
Não consigo entender como ainda existem contadores e tributaristas
em condições de acompanhar, com total rigor, as abundantes e por
vezes discutíveis obrigações fiscais. Quando leio sobre a
infindável luta das nossas autoridades, tentando inibir a evasão de
divisas, e do Ministério Público tentando trazer de volta ao país
o produto do Caixa 2 — ou façanhas mais sérias —, fico me
perguntando se os crimes financeiros não ocorreriam em muito menor
escala se a carga fiscal fosse mais reduzida, mais clara e mais
justa, alcançando todos os contribuintes e não apenas, como disse,
os “certinhos”, por índole ou “coagidos” pelo desconto no
holerite.
Somente
grandes estadistas ou invulgares parlamentares terão coragem de
convencer os cidadãos de que a obsessão pelo imediatismo é própria
das crianças e dos adultos de curta visão. Quanto aos espertos, que
hoje desfrutam das falhas ou contorções legais, esses jamais
aceitação a mudança do status quo.
Vale
a pena tentar modificar essa desigualdade, em que o punido é o
contribuinte cumpridor da lei, não o que consegue viver à sua
margem, usando truques contábeis ou “molhando a mão” de algum
eventual funcionário conivente.
(19-06-2015)