sábado, 20 de junho de 2015

Nova CPMF: contra a sonegação e caminho para o “Imposto Único”.


 Perdão por título tão extenso. Considerando a falta de tempo da maioria dos leitores e a pletora de textos disponíveis, é recomendável esclarecer logo, ao estilo do twitter, se quem escreve é contra ou a favor de tal ou qual proposta legislativa.

Neste artigo, usarei os termos “imposto, tributo e contribuição” como se fossem sinônimos, o que não são, obviamente. Tributo é um termo genérico. Tomo essa liberdade redacional apenas evitando dano à eufonia, com a repetição cansativa da mesma palavra, às vezes na mesma linha. Prossigamos.

Em fevereiro de 2013 publiquei no meu site — www.franciscopinheirorodrigues.com.br — um artigo, “Imposto único, com redução da carga tributária”. Como esse artigo deve ter sido lido por pouquíssimas pessoas e o tributo, hoje extinto, voltou à discussão, resolvi reapresentá-lo, parcialmente modificado. Agora não mais como “provisório”. Seu grande mérito está em possibilitar a substituição — sem risco para as finanças públicas e com alívio do contribuinte —, de dezenas de tributos por um pequeno número deles, no médio prazo. No longo ou longuíssimo prazo a meta — talvez impossível — seria a existência de um único tributo. O sonhado “paraíso tributário”.

Quando se menciona, neste artigo, “Imposto Único” essa expressão deve ser entendida menos como um “único” imposto — algo próximo da utopia — e mais como um drástico enxugamento dos mais de cinquenta tributos que hoje atormentam e sugam os contribuintes brasileiros. Atormentam com a burocracia e sugam com o saque excessivo do dinheiro do cidadão. A “nova” CPMF deve ser encarada pelo seu melhor ângulo, aparentemente não percebido pelo próprio governo federal: um teste de arrecadação e uma forma de tributar a movimentação da riqueza de uma forma prática, sem burocracia e sonegação. Se todos pagarem, da mesma forma, os tributos, todos pagarão menos, e com menos papelada.

Na Biologia, na Física, na Medicina, na Engenharia, e demais áreas, até mesmo artísticas, a experimentação serve como prova da verdade ou mentira, utilidade ou desperdício na forma de executar qualquer trabalho. Sem testes a Ciência nunca poderia ter chegado onde chegou. Na tributação o emperramento e os desvios continuam firmes, por décadas. Basta ver as constantes divergências interpretativas, nos Tribunais, entre fisco e contribuintes. Até pouco tempo atrás, mais de um trilhão de reais de crédito — ou abuso — tributário estava pendente, na justiça federal, aguardando a decisão “final” — uma quase utopia —, do Poder Judiciário. E sem culpa dos magistrados. Assim, por que não adotar um sistema mais simples de arrecadação em que o dinheiro do imposto, vá direto, para o Tesouro Nacional? Como, depois, dividir sensatamente o “bolo” entre Estados e Municípios já é outro assunto, aqui não abordado.

Grandes avanços — em qualquer área —, geralmente dependem de um sacrifício inicial. É o caso do algo “idealista” Imposto Único que jamais poderá ser adotado sem um sério “teste” de arrecadação. Esse “teste”, circunstancial, seria uma nova CPMF, cobrando um determinado percentual em toda movimentação financeira via cheque, cartão de crédito ou de débito, e transferência eletrônica. A meta de toda tecnologia — inclusive a fiscal — é atingir um resultado com o mínimo de gastos, desperdícios, demoras, fraudes, burocracias e cansaço de quem a utiliza. U’a melhor tecnologia interessa tanto para o governo — seja qual for o partido — quanto para o contribuinte.

Sei perfeitamente que 98% dos brasileiros não suporta a mera menção de qualquer novo tributo, provisório ou não. Não querem ler, ou sequer ouvir, nenhuma palavra em favor de novo ônus financeiro. Sentem-se, no geral, tão “saqueados” pelos governantes, nas esferas federal, estadual e municipal, que muitos já consideram “compreensível” algum grau de sonegação, vista como única e informal “legítima defesa contra esses governos que só pensam neles mesmos, gastando a rodo, aqui e no estrangeiro, nomeando parentes, amigos e cabos eleitorais, etc.” Em síntese, o grito do brasileiro que paga os inúmeros tributos mas não recebe os serviços correspondentes é um só: “os brasileiros não aguentam mais tanto imposto!”

No entanto, é justamente para diminuir a excessiva quantidade de impostos no Brasil que se faz necessário um tipo de tributo que suprima inúmeros outros. Sem prejuízo da arrecadação — até melhorando-a! — e permitindo a todos — “cereja do bolo” —, ricos e pobres, pagarem futuramente menos tributos. Isso mesmo, um bendito paradoxo: pagar menos impostos logo após encerrado o “teste de arrecadação” (a nova CPMF). O tão odiado “imposto do cheque”, extinto em 1º de janeiro de 2008, já comprovou sua eficácia, sem o desvio do dinheiro público antes dele chegar ao Tesouro. Ele foi extinto porque foi mal utilizado. Era para ser destinado apenas à Saúde mas isso não ocorreu. Por isso desmoralizou-se. E tinha um defeito grave: não cancelava outros tributos, apesar do montante arrecadado (mais de 40 bilhões por ano).

Agora poderia ser diferente. Com a nova versão da extinta CPMF, todos pagarão, em igual proporção, um imposto que acompanha, sem ilusões e constantes desvios, a real circulação do dinheiro.

Quando redigia este artigo fiquei agradavelmente surpreendido, ao ler, no jornal “O Estado de S. Paulo”, pág. A4, edição de 16/06/15, que nosso íntegro Ministro da Fazendo, Joaquim Levy, em artigo publicado no jornal Valor Econômico, edição de 17 de setembro de 2007, teceu elogios rasgados à CPMF, nos seguintes termos: “A CPMF é hoje um dos tributos que gera menor distorção na economia. Além de sua arrecadação, verificável e barata, ela alcança agentes que escapam de outros impostos, aumentando a equidade do sistema como um todo”.

Críticos da CPMF quiseram tirar proveito da suposta contradição do ministro porque agora mostra-se contrário à sua reutilização. Não há contradição dele quanto às virtudes desse tributo. Como explicou, ele é momentaneamente contra a proposta porque “há pouca disposição do Congresso para aumentar a carga tributária”. Apenas por motivos táticos, políticos, ele discorda de sua nova cobrança, neste delicado momento político. Não chegou a relacionar expressamente esse tributo com a ideia do Imposto Único (ou tendente a ele) porque não foi indagado a respeito. Talvez, se indagado especificamente, em “off”, considere que um novo sistema tributário — mais simples, não burocrático, indesviável na sua arrecadação — seria benvindo, e não só no Brasil. Um sistema que dispensasse os cidadãos de uma enorme perda de tempo guardando comprovantes, preenchendo guias e mais guias, contratando contadores e advogados para solucionar as constantes e inevitáveis dúvidas jurídicas decorrentes da pletora legislativa e reguladora, bem como a repercussão de um tributo nos demais. Um péssimo subproduto desse cipoal tributário é, como disse atrás, o congestionamento da Justiça, travada por milhões de demandas tributárias.

Realmente, pelo que se lê na mídia, a nossa carga tributária é uma das mais altas do mundo, com pouco retorno. Por que isso ocorre? Por vários fatores: incompetência, desonestidade, inércia, demagogia, irresponsabilidade pessoal e fiscal, amor à “prole ampliada” (nepotismo e empregos públicos sem concurso), e tudo o mais relacionável ao caráter. Tais condições não serão abordadas aqui mas uma coisa é incontestável, e digo de novo: se todos os brasileiros pagassem os respectivos tributos, todos pagariam menos. Uma melhoria da justiça fiscal, a nível pessoal. O montante da arrecadação seria maior. Bancos e demais instituições financeiras certamente não se atreveriam a alterar seus computadores e demais aparelhos eletrônicos para não registrar as movimentações financeiras. O Banco Central e a Polícia Federal teriam meios de fazer a fiscalização. É mais fácil fiscalizar um número relativamente pequeno de bancos do que centenas de milhares de firmas. Uma das vantagens secundárias de um imposto do tipo da CPMF está em preservar a moral de eventuais funcionários, menos resistentes em resistir às tentações do dinheiro.

Obviamente, se a transferência do dinheiro ocorre entre contas da mesma pessoa, não há o que tributar, porque na verdade o dinheiro não circulou, a menos que alguém explique, e convença, que essa operação pode esconder alguma fraude fiscal.

Verificada a arrecadação efetiva desse novo e inteligente tributo — por um período de poucos meses, talvez três ou quatro — a critério do Congresso e do Poder Executivo — esses dois Poderes extinguiriam determinados tributos ou reduziriam as alíquotas de outros, tendo em vista o enorme reforço financeiro resultado da alta arrecadação da nova CPMF, que não será usada apenas visando à saúde, embora, no momento esta mereça um cuidado preferencial.

Tento, aqui, convencer o leitor a repensar o assunto, visto ainda com enorme antipatia porque encarado como “mais um imposto!” e ponto final. Não poderá ser apenas isso. A própria lei que criar esse “revolucionário” tributo dirá expressamente que após “x” meses de arrecadação o Governo terá que reduzir a sua arrecadação, em “y %”. Ou extinguindo tributos ou reduzindo alíquotas em tais ou quais impostos, sob pena de processo de responsabilidade. Essa cláusula, da obrigatoriedade da diminuição do número de impostos, ou dos percentuais atualmente existentes, não pode faltar, caso vigore a nova CPMF. Os contribuintes já não confiam nos governos. Sem uma ameaça legal de perda do cargo e/ou cadeia, os contribuintes não aprovarão uma nova CPMF.

A CPMF extinta em 2007 arrecadou, só naquele ano, com uma alíquota de 0,38% a quantia de 36,5 bilhões de reais. Há quem mencione que foi mais do que isso.

Não se alegue que com o desconto do “imposto do cheque”, no cartão de crédito/débito e no pagamento via transferência eletrônica, o sonegador passará a transportar fisicamente — no bolso, cueca, pasta e mala —, grandes volumes de dinheiro vivo. Se ele assim agir, os primeiros a saberem disso serão os assaltantes, transfigurados em sanguinários “fiscais” da sonegação. Após os primeiros tiros ou coronhadas dos meliantes, os “cofres ou mulas de duas pernas”, assustados e sangrando, voltarão às formas tradicionais de pagamento.

Não teríamos, portanto, frise-se, apenas “mais um imposto”. Ele seria o passo inicial para a substituição gradativa de “n” tributos por uns poucos. Sua finalidade máxima estaria no combate à sonegação e na simplificação das obrigações tributárias. Hoje, quem paga Imposto de Renda são os assalariados e os contribuintes mais íntegros — prejudicados pelos concorrentes que pagam pouco, ou nada, e com isso podem vender seus produtos e serviços com preço mais baixo. A obediência fiscal, atualmente, é uma desvantagem.

Não muito tempo atrás li, na imprensa, que os brasileiros estão, em massa, comprando apartamentos na Flórida, pagando com dinheiro vivo, “cash”. Essa forma preferencial de pagamento não seria um indício de “Caixa 2” em grande escala?

Não sou, obviamente, um tributarista. Opino aqui como mero cidadão contribuinte, sempre surpreendido com a imensa complexidade fiscal. Não consigo entender como ainda existem contadores e tributaristas em condições de acompanhar, com total rigor, as abundantes e por vezes discutíveis obrigações fiscais. Quando leio sobre a infindável luta das nossas autoridades, tentando inibir a evasão de divisas, e do Ministério Público tentando trazer de volta ao país o produto do Caixa 2 — ou façanhas mais sérias —, fico me perguntando se os crimes financeiros não ocorreriam em muito menor escala se a carga fiscal fosse mais reduzida, mais clara e mais justa, alcançando todos os contribuintes e não apenas, como disse, os “certinhos”, por índole ou “coagidos” pelo desconto no holerite.

Somente grandes estadistas ou invulgares parlamentares terão coragem de convencer os cidadãos de que a obsessão pelo imediatismo é própria das crianças e dos adultos de curta visão. Quanto aos espertos, que hoje desfrutam das falhas ou contorções legais, esses jamais aceitação a mudança do status quo.

Vale a pena tentar modificar essa desigualdade, em que o punido é o contribuinte cumpridor da lei, não o que consegue viver à sua margem, usando truques contábeis ou “molhando a mão” de algum eventual funcionário conivente.

(19-06-2015)


segunda-feira, 8 de junho de 2015


 
                                        Sobre o autor

Dr. Francisco César é desembargador aposentado do TJESP e escritor. Autor dos romances "A rainha da boate", "Do amor e outras fraudes" e "Criônica". Este último ele não classifica como ficção-científica.Descreve apenas a angústia de um banqueiro brasileiro que se considera injustiçado.  Tanto pela Justiça — que o condenou como homicida da esposa — como pelas limitações da Medicina, que rotulou seu câncer como incurável.

 
Depois de solto, cheio de planos, soube, pelos médicos, que estava condenado. Mas não aceitou o prognóstico. Pensou assim: — “Daqui a dez, vinte ou trinta anos, a Medicina estará diferente. Esperarei, congelado, o progresso técnico na única forma hoje a meu alcance: na ‘geladeira’ de -196 graus Celsius negativos. Podre, isso é certo, não estarei.

 
O resto são detalhes, vencíveis. A humanidade já realizou ‘milagres’ técnicos muito mais difíceis que impedir o congelamento da água em nossas células, o maior problema da Criogenia. Importante: depois de escrito e publicado o romance o autor soube da existência de rãs das regiões árticas que ficam congeladas durante meses, sem que a água das suas células se congele e, dilatando-se, rompam a membrana celular.
Sobre esse detalhe, o leitor poderá ler o sucinto “complemento” do livro em um artigo no seu blog, “Um livro injustiçado: Criônica. Autor? Este seu criado”

Francisco Cesar publicou também um livro de contos, "Tragédia na ilha grega" e duas coletâneas de artigos (mais de160), “Verdades que melindram”, I e II, na forma de eBooks — bem como alguns exemplares impressos e distribuídos como brindes —  sobre política internacional e justiça.

Francisco Cesar nasceu em Fortaleza-CE  mas vive em São Paulo desde os dois anos de idade. Formou-se em Direito pela Faculdade Paulista de Direito (PUC). É casado, pai de quatro filhos e avô de seis netos.

Depois de aposentado, vem escrevendo assiduamente na internet, sobre justiça brasileira, política internacional, governo mundial e outros temas gerais, os mais polêmicos da atualidade.

Dr. Francisco Cesar escreve também sobre assuntos de interesse apenas humano, trágicos e cômicos, interessado que é na compreensão — a mais abrangente possível —, do ser humano como um todo. Segundo ele, o Homem é uma pulga de duas pernas, simultaneamente vulgar e nobre, lixo e diamante, conforme o momento. Se não se autodestruir, talvez ainda conquiste o universo. Talvez sejamos, hoje, o equivalente da ameba terrestre primordial que um dia navegará entre as galáxias. Como? Não sabemos. Assim como nossas vovós amebas também não sabiam que evoluiriam até o presente momento. 

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