Foto: Felipe Lampe
(Resumo de sugestão enviada ao Min. da Justiça)
Prezado Ministro Sérgio Moro,
Aproveitando sua presença na reunião-almoço do IASP, no dia 07/02/2019, tomo a liberdade de lhe encaminhar, via assessoria, uma sugestão que — se transformada em lei —, livrará a justiça cível da intolerável morosidade que tanto desanima aqueles que dela precisam, já que não é possível fazer justiça pelas próprias mãos. Não é sem motivo que a opinião pública — mal informada sobre as verdadeiras causas da demora no término dos processos cíveis — reclama contra os vencimentos da magistratura: — “Com tanta ‘moleza’ qualquer salário de juiz é imerecido...” . Mole não é o juiz, mas o atual sistema, imensamente ingênuo.
Em resumo, evitando minúcias técnicas, minha sugestão é que V.Exa. consiga no Congresso uma curta — embora difícil — alteração na legislação processual civil que diminuirá a demora de tramitação dos processos cíveis. Essa alteração será, no cível, o equivalente, parcialmente já alcançado — falta apenas a lei —, na área penal: dar efetividade às condenações da segunda instância.
A proposta é no sentido de que decidido, na segunda instância cível, que o litigante — geralmente é o réu, mas nem sempre — deve pagar ao adversário a quantia “x” — ou aquela estimada pelo órgão de apelação —, o devedor só poderá recorrer aos tribunais superiores, se depositar em juízo o valor fixado no acórdão — ou pelo menos 50% dele, caso haja resistência insuperável do Congresso. Isso porque sem um “desembolso” efetivo, “doloroso”, não haverá qualquer desestímulo contra a intenção do devedor de jogar para um distante e incerto futuro o pagamento de sua dívida.
Há, nos recursos com essa intenção de demora uma espécie de “chantagem recursal” contra a parte credora: — “Caro credor: ou você concorda em receber, agora, só um terço do que lhe devo – e o caso está encerrado –, ou só receberá tudo em remoto futuro”.
Nossa legislação, no cível, já prevê a “sucumbência recursal” — nova condenação em honorários no julgamento de cada recurso — mas sem qualquer efeito desestimulador da protelação. Primeiro, porque todas as sucumbências somadas — nas quatro instâncias — não podem exceder a 20% do valor da causa, ou da condenação. Se, por exemplo, na sentença, o devedor for condenado a pagar 15%, nos três recursos posteriores a soma das novas sucumbências não poderá ir além de 5%, mesmo perdendo seus recursos de apelação, recurso ordinário (STJ) e extraordinário (STF) todos visando a demora.
Segundo, porque todas as quantias relacionadas com a sucumbência só serão “desembolsadas” — sentidas “na alma”, o bolso — no final do processo, anos e anos depois, na fase de execução. O devedor pensa, tranquilizado: — “Daqui a cinco, dez ou mais anos, muita coisa pode acontecer. Talvez todos nós estaremos mortos”. E seu advogado, embora honrado, não pode se dar ao luxo de rejeitar ótimos clientes, “esticando o processo”, porque se o fizer, o cliente procura outro advogado que dirá: —“Minha obrigação é defender os direitos de meus clientes, usando a legislação em vigor. Eu tenho família para sustentar”.
Essa brecha legal — a protelação como estímulo legal para não pagar o que é devido — explica o débito de tributos federais, não pagos, de bilhão de reais, que dormem nas pilhas de processos, beneficiando o devedor mas desmoralizando a justiça cível e seus operadores, chamados de “morosos”, quando a morosidade não é deles, mas do sistema defeituoso pela sua ingenuidade.
Alguém poderá argumentar que o devedor fiscal pode continuar insistindo em chegar ao distante STF, mesmo perdendo nas duas instâncias iniciais, porque está sinceramente convicto de suas razões, sendo injusto que o Estado lhe negue o direito de esgotar todas as instâncias só porque não tem o dinheiro para depositar em juízo a quantia fixada no julgamento da apelação.
Se esse for o caso o devedor, teimoso e incansável recorrente, poderá pedir um empréstimo bancário para fazer o depósito que lhe permitirá prosseguir recorrendo seguidamente. É previsível que os “teimosos”, conhecendo os juros cobrados pelos bancos para o depósito condicionador dos recursos após a apelação prefira fazer um acordo com o credor. Esclareça-se que o depósito (quantia) aqui sugerido para recorrer após a segunda instância, não será levantado pelo credor. Ficará, congelado, rendendo juros e correção monetária, até que o processo termine, decidindo quem, a final, tem razão; ou por acordo entre as partes. Quem ganhar a causa, não havendo antes um acordo, levantará o dinheiro. Detalhes sobre esse item descabe neste momento. Basta a ideia.
A exigência do depósito, referido neste texto, funcionará como um teste bem objetivo da sinceridade de quem recorre. Impossível concordar com a alternativa de o devedor apenas apresentar um papel onde está escrita a palavra “caução” de um imóvel ou uma garantia que não signifique um desembolso do devedor que perdeu na segunda instância, após examinar as provas. É essencial que o depósito referido seja feito em quantia. Se não for assim, perderá toda a eficácia.
Os devedores, aos milhões, e de milhões, sabem perfeitamente que quanto maior a demora melhor para o próprio bolso. Na área tributária, os contribuintes honestos, que pagam seus impostos regularmente, sentem-se uns tolos porque seus concorrentes, hábeis sonegadores mas incansáveis “inconformados”, só levam vantagem porque o fisco, desesperado com a baixa arrecadação, acaba concedendo aos devedores os benefícios de um Refis qualquer, com seu débito em grande parte perdoado e dividido em centenas de meses. Na maioria, tais acordos logo param de ser cumpridos.
Essa vergonha precisa acabar. V. Exa. pode fazer mais esse trabalho para reabilitar a justiça brasileira. Como já disse antes, detalhes jurídicos processuais serão discutidos quando o projeto de lei for apresentado. V. Exa. saberá escolher uma comissão plenamente qualificada e sem interesse pessoal, profissional, de seus componentes.
Está em suas mãos transformar a justiça cível em orgulho dos brasileiros. Outras sugestões, relacionadas com a celeridade da nossa justiça podem contribuir para o mesmo fim, mas aqui, neste curto espaço, só atrapalhariam abordá-las.
Cordial abraço e parabéns pela sua nomeação.
S. Paulo, 06 de fevereiro de 2019.
Des. Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues.
Desembargador aposentado do TJESP.
E-mail: oripec@terra.com.br.
Site: www.500toques.com.br.
Blog:franciscopinheirorodrigues.com
Prezado Ministro Sérgio Moro,
Aproveitando sua presença na reunião-almoço do IASP, no dia 07/02/2019, tomo a liberdade de lhe encaminhar, via assessoria, uma sugestão que — se transformada em lei —, livrará a justiça cível da intolerável morosidade que tanto desanima aqueles que dela precisam, já que não é possível fazer justiça pelas próprias mãos. Não é sem motivo que a opinião pública — mal informada sobre as verdadeiras causas da demora no término dos processos cíveis — reclama contra os vencimentos da magistratura: — “Com tanta ‘moleza’ qualquer salário de juiz é imerecido...” . Mole não é o juiz, mas o atual sistema, imensamente ingênuo.
Em resumo, evitando minúcias técnicas, minha sugestão é que V.Exa. consiga no Congresso uma curta — embora difícil — alteração na legislação processual civil que diminuirá a demora de tramitação dos processos cíveis. Essa alteração será, no cível, o equivalente, parcialmente já alcançado — falta apenas a lei —, na área penal: dar efetividade às condenações da segunda instância.
A proposta é no sentido de que decidido, na segunda instância cível, que o litigante — geralmente é o réu, mas nem sempre — deve pagar ao adversário a quantia “x” — ou aquela estimada pelo órgão de apelação —, o devedor só poderá recorrer aos tribunais superiores, se depositar em juízo o valor fixado no acórdão — ou pelo menos 50% dele, caso haja resistência insuperável do Congresso. Isso porque sem um “desembolso” efetivo, “doloroso”, não haverá qualquer desestímulo contra a intenção do devedor de jogar para um distante e incerto futuro o pagamento de sua dívida.
Há, nos recursos com essa intenção de demora uma espécie de “chantagem recursal” contra a parte credora: — “Caro credor: ou você concorda em receber, agora, só um terço do que lhe devo – e o caso está encerrado –, ou só receberá tudo em remoto futuro”.
Nossa legislação, no cível, já prevê a “sucumbência recursal” — nova condenação em honorários no julgamento de cada recurso — mas sem qualquer efeito desestimulador da protelação. Primeiro, porque todas as sucumbências somadas — nas quatro instâncias — não podem exceder a 20% do valor da causa, ou da condenação. Se, por exemplo, na sentença, o devedor for condenado a pagar 15%, nos três recursos posteriores a soma das novas sucumbências não poderá ir além de 5%, mesmo perdendo seus recursos de apelação, recurso ordinário (STJ) e extraordinário (STF) todos visando a demora.
Segundo, porque todas as quantias relacionadas com a sucumbência só serão “desembolsadas” — sentidas “na alma”, o bolso — no final do processo, anos e anos depois, na fase de execução. O devedor pensa, tranquilizado: — “Daqui a cinco, dez ou mais anos, muita coisa pode acontecer. Talvez todos nós estaremos mortos”. E seu advogado, embora honrado, não pode se dar ao luxo de rejeitar ótimos clientes, “esticando o processo”, porque se o fizer, o cliente procura outro advogado que dirá: —“Minha obrigação é defender os direitos de meus clientes, usando a legislação em vigor. Eu tenho família para sustentar”.
Essa brecha legal — a protelação como estímulo legal para não pagar o que é devido — explica o débito de tributos federais, não pagos, de bilhão de reais, que dormem nas pilhas de processos, beneficiando o devedor mas desmoralizando a justiça cível e seus operadores, chamados de “morosos”, quando a morosidade não é deles, mas do sistema defeituoso pela sua ingenuidade.
Alguém poderá argumentar que o devedor fiscal pode continuar insistindo em chegar ao distante STF, mesmo perdendo nas duas instâncias iniciais, porque está sinceramente convicto de suas razões, sendo injusto que o Estado lhe negue o direito de esgotar todas as instâncias só porque não tem o dinheiro para depositar em juízo a quantia fixada no julgamento da apelação.
Se esse for o caso o devedor, teimoso e incansável recorrente, poderá pedir um empréstimo bancário para fazer o depósito que lhe permitirá prosseguir recorrendo seguidamente. É previsível que os “teimosos”, conhecendo os juros cobrados pelos bancos para o depósito condicionador dos recursos após a apelação prefira fazer um acordo com o credor. Esclareça-se que o depósito (quantia) aqui sugerido para recorrer após a segunda instância, não será levantado pelo credor. Ficará, congelado, rendendo juros e correção monetária, até que o processo termine, decidindo quem, a final, tem razão; ou por acordo entre as partes. Quem ganhar a causa, não havendo antes um acordo, levantará o dinheiro. Detalhes sobre esse item descabe neste momento. Basta a ideia.
A exigência do depósito, referido neste texto, funcionará como um teste bem objetivo da sinceridade de quem recorre. Impossível concordar com a alternativa de o devedor apenas apresentar um papel onde está escrita a palavra “caução” de um imóvel ou uma garantia que não signifique um desembolso do devedor que perdeu na segunda instância, após examinar as provas. É essencial que o depósito referido seja feito em quantia. Se não for assim, perderá toda a eficácia.
Os devedores, aos milhões, e de milhões, sabem perfeitamente que quanto maior a demora melhor para o próprio bolso. Na área tributária, os contribuintes honestos, que pagam seus impostos regularmente, sentem-se uns tolos porque seus concorrentes, hábeis sonegadores mas incansáveis “inconformados”, só levam vantagem porque o fisco, desesperado com a baixa arrecadação, acaba concedendo aos devedores os benefícios de um Refis qualquer, com seu débito em grande parte perdoado e dividido em centenas de meses. Na maioria, tais acordos logo param de ser cumpridos.
Essa vergonha precisa acabar. V. Exa. pode fazer mais esse trabalho para reabilitar a justiça brasileira. Como já disse antes, detalhes jurídicos processuais serão discutidos quando o projeto de lei for apresentado. V. Exa. saberá escolher uma comissão plenamente qualificada e sem interesse pessoal, profissional, de seus componentes.
Está em suas mãos transformar a justiça cível em orgulho dos brasileiros. Outras sugestões, relacionadas com a celeridade da nossa justiça podem contribuir para o mesmo fim, mas aqui, neste curto espaço, só atrapalhariam abordá-las.
Cordial abraço e parabéns pela sua nomeação.
S. Paulo, 06 de fevereiro de 2019.
Des. Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues.
Desembargador aposentado do TJESP.
E-mail: oripec@terra.com.br.
Site: www.500toques.com.br.
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