sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

Terra, Marte e conjeturas. Atualização

 

Foto divulgação 

Observação inicial. 

(Em dezembro de 2020 publiquei em meu blog — francepiro.blospot.com — um artigo, francamente especulativo: “Terra, Marte e conjeturas”, estas envolvendo o coronavírus e a eventual de existência de discos voadores e interesses extraterrestres — marcianos? — em busca de um habitat menos hostil. Tomei essa liberdade porque em 2020 não havia muita certeza sobre a origem do vírus e o planeta Marte era um pouco menos conhecido que hoje, dois anos depois. Pensei em Marte porque nenhum outro planeta do sistema solar possui condições ambientais de gerar vida assemelhada à terrestre.) 

(O planeta vermelho, pelo visto, continua ainda misterioso e inabitável em sua superfície, mas, a meu ver é bem razoável a probabilidade de ter gerado vida inteligente milhões de anos atrás — quando a Terra era quente demais e Marte possuía uma temperatura amena, assemelhada à de nosso planeta hoje, podendo alcançar um estágio tecnológico talvez mais alto que o da Terra hoje. Tenho absoluta convicção, com base na analogia, que quando pesquisarem profundamente o subsolo marciano, encontrarão restos de uma antiga civilização soterrada em toneladas de poeira endurecida pelo tempo. Especulação, claro, mas de alguma probabilidade porque toda vida inteligente é também ambiciosa e pretende crescer ao máximo no conforto, riqueza e conhecimento. E quanto mais sabe, com mais rapidez inova e cresce). 

 (Pergunto: como estará nosso planeta daqui a dois mil anos, por exemplo, se não autodestruído por guerras nucleares ou atingido por gigantesco meteoro, ou algumas pandemias indomáveis? Se na Terra a vida brotou do zero, do nada — mero resultado do calor e luz solar, presença de água, eletricidade de raios e abundância de todos os átomos necessários à vida —— por que somente no nosso planeta brotaria a vida?)  

(Lendo e escutando na internet, de uns poucos dias para cá, os climatologistas Ricardo Augusto Felício, Luz Carlos Molion, Bjorn Lamborg, e outros menos citados — dissertando sobre ambientalismo —, concluí que minhas suposições amadoras sobre Marte, escritas em 2020, tinham algum fundamento. A ignorância generalizada da humanidade sobre cosmogonia, astronomia e até mesmo o ambientalismo ainda é considerável, com “conclusões” científicas às vezes forçadas, exageradas, contaminadas com cálculos geopolíticos de dominação de países mais fracos e desorganizados. Grandes florestas e terras com muita riqueza no subsolo despertam cobiça em países que, após destruírem suas próprias florestas, pretendem tirar proveito de áreas alheias com difíceis problemas de administração de suas enormes florestas.) 

(Esse involuntário “reforço” de minha desconfiança, sobre a questão ambiental, vindo de Felício e Molion, duas grandes inteligências, conhecimento e coragem —, me aconselharam a republicar meu artigo de 2020, com o presente acréscimo.) 

(Longe de mim resumir aqui os textos de Felício e Molion, ambos professores universitários de São Paulo e Alagoas, respectivamente.  Isso tomaria dezenas de páginas. Mas o leitor minucioso poderá se informar exatamente sobre as razões e conclusões desses dois inteligentes e corajosos cientistas do clima acessando no Google, ou outros mecanismos de procura, mas sempre — atenção! — clicando seus nomes completos nas buscas. Esse cuidado é absolutamente necessário, porque ambos foram e ainda são perseguidos e boicotados por aqueles que pretendem uma unanimidade opinativa que não parece coincidir com a verdade). 

(Encerrando este acréscimo ao meu artigo de 2020, logo abaixo, aconselho o leitor a, antes de formar sua opinião sobre o clima global, olhar com atenção um globo terrestre. De preferência um globo de três dimensões, mais convincente. Notará logo que o Planeta Terra deveria chamar-se “Planeta Oceano”, tal a quantidade de água, líquido que não polui a atmosfera. Felizmente, para todos nós, os mares representam cerca de 70% da superfície terrestre.) 

(Localizados, no globo, a Europa e o Oriente Médio, o leitor verá quão ínfimas, proporcionalmente, são essas áreas, em comparação com o tamanho do planeta. Além dessa insignificância territorial dos países é preciso lembrar que suas cidades representam pequeníssimo percentual da área total dos estados. Todos os países possuem área rural, campos, plantações, bosques, fazendas, em que a poluição aérea é mínima ou nenhuma. O gás metano, intestinal, emitido por vacas e ovelhas parece um exagero, argumento forçado para justificar os fanáticos do ambientalismo. E existem também, em alguns países, desertos, pequenos ou enormes, onde é impossível a poluição provocada pelo homem). 

(O mesmo argumento pode ser usado com a poluição ambiental causada pelos Estados Unidos, China, Índia e Rússia, que ocupam imensas áreas, mas com poluição limitada a cidades, fábricas e veículos movidos a gasolina, álcool e diesel.  Esses pontos de poluição devem, claro, ser combatidos por causa do prejuízo local à saúde da população, ao pulmão e vias respiratórias. Mas esse efeito local, não explica o aquecimento do planeta inteiro, dos oceanos e áreas não densamente habitadas, que dependem de causas pouco conhecidas, como ocorre com as eras glaciais. Nossa estrela não é um “forno” estático, sofre alterações. O clima terrestre, está provado, tem fases de aquecimento e resfriamento. Segundo Felício e Molion, a Terra inicia uma fase de resfriamento.) 

Agora, o artigo de 2020: “Terra, Marte e conjeturas” 

Será que os alienígenas pensam em nos colonizar com vírus?

 Seria isso possível? Apenas em teoria, sim, por mais indesejável e “paranoico”, que isto possa parecer, neste triste momento de recrudescimento de uma epidemia diferenciada, teimosa e seletiva, eliminando os “fracos” — velhos e doentes — mas poupando os jovens e fortes que possam manter “a máquina planetária” em funcionamento.   Leiam os argumentos, as deduções lógicas e pensem, mas com a própria cabeça. Friso que desejo estar completamente errado na minha dúvida teórica. 

Como no mal pode haver alguma semente do bem, o imaginário “perigo marciano” teria um lado bom: a união política da humanidade, coisa que nunca ocorreu antes. 

Consciente do risco do ridículo, advirto que não se trata, aqui, de ficção-científica — fantasia, literatura —, porque ela não faz meu gênero. Apenas alerto para uma remota e indesejada possibilidade, baseado em leituras, raciocínios, e conclusões — que me parecem logicamente aceitáveis — se pelo menos alguns dos milhares de depoimentos, fotos e filmagens de “objetos voadores não identificados” forem verdadeiros, como me parecem. Digo assim, aos poucos, cauteloso, porque a expressão “discos voadores” já afasta, de cara, metade dos leitores. 

Se não sou totalmente assertivo quanto a realidade do perigo mencionado no título, por que perco tempo — meu e do leitor —, abordando apenas possibilidades, ainda mais sendo elas desanimadoras? Justifico-me logo abaixo. 

Os campos da cosmogonia, astronomia e astrobiologia estão recheados de conclusões sensatas mescladas com tremendos “chutes” científicos que — para nós, leigos — são mil vezes mais inacreditáveis que minha modesta suspeita mencionada no título.

Vejamos.
 

Big Bang (o universo brotando de uma “bolinha mágica”); Idade do Universo (tolice, ele não “nasceu”, como um bebê, vindo do nada, sempre existiu, como poeira cósmica e corpos celestes); Buracos de Minhoca; Universos Paralelos (vários, como fantasmas); novas Dimensões (além das 3, ou 4? tradicionais); Viagens no Tempo; Buracos Negros (com saída dos fundos para “outra dimensão”, impossível se o Buraco for apenas uma estrela que se apagou); Teoria das Cordas, etc., são discutidos sem rir. Isso porque, afirmam os cientistas, estão baseados em “cálculos matemáticos”, inacessíveis à verificação de 99,9 %, dos seres humanos. Quanto aos 0,1% que “verificaram”, não são raras as discordâncias entre eles. 

Cabe aqui um imediato reparo — apenas na grosseria, não na opinião — ao que acabei de escrever num impulso —, usando a palavra “chute”, referindo-me àqueles astrônomos que acreditam no Big Bang — só porque as galáxias estão, no largo “momento cósmico”, se afastando umas das outras e eles não sabem como explicar. Bastaria dizerem não saber, por enquanto.  Afirmar, porém, que toda a matéria cósmica, com bilhões de galáxias brotaram do nada, em um segundo, sugere que a abstração excessiva da Astronomia cansa demais o cérebro, recomendando duas férias anuais para descanso dos neurônios. 

Segundo essa absurda teoria, antes do Big Bang havia um “nada” absoluto. Um “vazio” não só de “coisas” como da própria “ideia” de vazio. Sem matéria, sem energia e sem o já imaterial “tempo”. Se essa teoria foi apenas um pedido dos líderes religiosos aos cientistas, para reforçar a ideia de Deus — um milagre unindo ciência e religião visando diminuir a descrença, maldade e materialismo animal — é preciso lembrar que qualquer teoria explicativa ridícula ajuda a opinião pública mais esclarecida a não confiar nos cientistas, considerando-os “um bando de malucos”. Inclusive quando eles acertam em questões importantes, como a preservação do meio-ambiente. 

A bondade, no lugar errado, torna-se maldade involuntária.   

Quando um astrônomo, em cruzeiro marítimo, contempla o céu noturno e está, casualmente, rodeado de leigos que o olham com respeito, fazendo perguntas, o indagado sente-se meio que obrigado a dizer alguma coisa. Afinal, é um astrônomo, interessado em diminuir a ignorância geral, pelo menos na sua área. 

Percebendo que a curiosidade do grupo é sincera, não mera gozação, o estudioso dos astros provavelmente tentará ser gentil com os circunstantes que, sobre as estrelas, sabem apenas o que leram em livros de poesia. No máximo lembram-se dos versos de grandes poetas sentimentais, associando luas, estrelas e amores imortais, como Olavo Bilac e outros inspirados. Esquecem, ou desconhecem, que aquelas luzinhas, piscando, são gigantescas fornalhas, impiedosas e indiferentes, que impedem, “torrando”, ou estimulam, “aquecendo adequadamente”, o surgimento e crescimento da vida em milhares de planetas cujos habitantes talvez, nesse mesmo momento, estejam também nos espiando através de seus binóculos ou telescópios, conjeturando se há ou não vida inteligente no nosso sistema solar.

É natural, humano, profissional — e até caridoso —, que os astrônomos mais imaginativos — a imaginação era muito valorizada por Einstein — expliquem o que sabem, ou presumem, porque tudo é muito distante e complexo. Quanto ao que não sabem — porque é impossível saber, por enquanto... —, e apenas pensando em não decepcionar os leigos com o silêncio, o astrônomo aqui imaginado prefere dar uma explicação breve, que pareça razoável. Melhor assim do que o mutismo, que pode ser interpretado como arrogância ou incapacidade de comunicação. 

Essa atitude é semelhante à adotada por delegados de polícia quando, chamados para atender uma ocorrência policial de grande repercussão — por exemplo, uma famosa “estrela”, sem alusão, de cinema é encontrada morta depois de vários dias desaparecida. Indagado por insistentes repórteres, filmando o local, o delegado dá sua provisória explicação do que pode ter acontecido. Esse mero “palpite” profissional é natural e útil, porque demonstra interesse e inteligência do poder público em combater o crime com racionalidade e planejamento. A mesma coisa acontece com o uso da intuição na Astronomia, mostrando a intenção, não de combater o crime, mas a ignorância. Melhor isso do que o astrônomo ficar mudo, como que aturdido, desprovido de ideias.   

Não podemos esquecer que o universo, como objeto de estudo, é mais ingrato que qualquer outra ciência porque o astrônomo não pode ver, de perto, o que lhe compete investigar, para depois explicar. Tudo está envolto em mistério, distantes anos-luz, ou Parsecs, ou outras unidades de medições de gigantescas distâncias interestrelares, por melhores que sejam os telescópios. Sem estes aparelhos, o que saberíamos dos astros? Praticamente nada. Galileu Galilei descobriu mais que astrônomos anteriores. Kepler, por exemplo, porque usou telescópios inventados, pouco antes, por um fabricante holandês. Enxergando mais, pôde explicar melhor a realidade do heliocentrismo. 

Imagino a constante frustração de todo astrônomo profissional: — “Como é possível trabalhar assim, quase no “escuro”, propriamente dito? E no claro, de dia, não dá pra ver nada porque não enxergamos as estrelas. Um biólogo pelo menos vê o que pretende conhecer. Nós não, temos que adivinhar, até “chutar”, inicialmente, porque com o “chute”, o próprio “chute” pode ser investigado e dele surgir um “gol”, uma importante descoberta científica”. Acho até que a intuição dos cientistas mais imaginativos foi mais profícua, em descobertas, que o severo e cauteloso ceticismo daqueles colegas que esperam que a verdade surja já inteirinha, perfeita, certinha nos cálculos e na forma observável. 

 Albert Einstein — que respeito profundamente, por seu caráter e ideias em seus livros, quando escritos com palavras, não com fórmulas — afirmou, em 1915, quando publicou sua Teoria da Relatividade, que um corpo de enorme massa poderia desviar um feixe de luz que passasse perto dele. 

Até então, pensava-se que a luz só poderia viajar em linha reta. Quando, porém, ocorreu um eclipse total do Sol, pela Lua, cinco anos depois, em 1919, a luz solar realmente “entortou”, atraída pela gravidade do nosso satélite, como foi constatado com telescópios. Foi a confirmação visual do que afirmava Einstein, usando apenas cálculos, de que muitos físicos não tinham condições de entender, apenas matematicamente, a Teoria da Relatividade. 

 Com perdão pelo atrevimento — próprio dos ignorantes —, não acho que esse desvio no raio de luz seja tão surpreendente assim, porque a luz, afinal, é também “matéria”. Não é uma “coisa” espiritual, imaterial, como um pensamento. Uma ideia, imaterial, pode ser o produto de algo material, químico — sinapses entre neurônios —, mas uma coisa é a sinapse, a “causa”, e outra, o “efeito”, a ideia em si. Em um feixe de luz há fótons, ou elétrons, e outras partículas subatômicas em movimento. “Coisas”, enfim, ligadas ao mundo da matéria, sujeitas à atração da gravidade. 

Há algo de “material” na eletricidade que chega a nossa casa, tanto assim que é medida mensalmente e temos que pagar a conta de luz. Se é mensurável, palpável — um choque dói... —, nela há algo de “massa” sujeita a ser atraída pela gravidade da Lua, no caso da mencionada eclipse. 

Segundo li em livro sobre Einstein, ele também considerou um exagero esse “oba-oba”, a repercussão científica do eclipse, com pessoas viajando para outros países só para observar o fenômeno. Desnecessário, porque o desvio já fora previsto por ele, com sua matemática que provavelmente continha algum componente intuitivo ou imaginativo. Se os fatos contrariam a matemática, azar dos fatos. 

Voltando ao título, se minha suspeita sobre marcianos, discos voadores e vacinas — eventualmente decepcionantes —, for apenas uma especulação fantasiosa, autorizo qualquer escritor ou roteirista de science fiction a utilizar as considerações, aqui presentes, para a redação de um livro ou filme desse gênero, que — salvo brilhantes exceções — pouco me agrada por causa dos exageros e ilogicidade. 

 Se um escritor de invulgar imaginação quiser que respeitem suas fantasias, que se esmere na argumentação, mostrando, por a + b, que o que ele diz, apesar de inusitado, é logicamente possível, mesmo que seja pouco provável. Não ofendendo a inteligência, O.K., porque até o simpático bom senso pode estar, e já esteve, durante milênios, totalmente errado. 

Sintetizando o conteúdo da minha suspeita, referida no título, acho logicamente possível, embora indesejável — só faltava mais essa em plena pandemia! — que seres extraterrestres, extremamente inteligentes, portadores de uma tecnologia muito mais avançada que a nossa, habitando nosso sistema solar — as estrelas e seus planetas estão distantes demais — talvez estejam ambicionando, ou realmente necessitando de um novo “lar”, no caso, a Terra. 

 Para isso, ficariam nos “espionando” furtivamente, usando objetos voadores não identificados, os genéricos “discos voadores”, nem sempre no formato de pratos ou discos. Eles talvez não só nos observam do alto como também — muitos juram —, nos sequestram, abduzem, para estudar nossos organismos e depois nos devolvem ao solo com a memória recente afetada ou bloqueada. Uma forma de camuflagem psicológica, estimulando a ideia de que tudo isso, “discos voadores”, é mentira. 

Não penso que todos os casos relatados de abdução — são dezenas ou centenas —, seguidos de esquecimento parcial, sejam mentirosos. Com o progresso das nossas pesquisas sobre substâncias que afetam os neurônios talvez esse bloqueio temporário da memória esteja ao nosso alcance rotineiro daqui a pouco tempo. A “ignorante” doença do Alzheimer já faz isso “de graça”, sem alarde científico, prejudicando seletivamente a lembrança de fatos recentes. 

O leitor pode garantir com exatidão como estará nosso conhecimento do cérebro daqui a quinhentos ou mil anos? Mil anos é uma gotinha de tempo na Cosmologia, Astronomia, Biologia, Física, Evolução, etc. Um prodigioso volume de descobertas nos aguardam. 

Em assuntos planetários, não podemos nos basear apenas no que hoje conhecemos. Nosso “hoje” poderá se tornar um envergonhado “antigamente pensávamos que...”. Quando cientistas garantem, por exemplo, que o coronavírus é de origem natural — não inventado em laboratório —, eles fazem essa afirmação com base nos atuais conhecimentos deles, cientistas. Não estão mentindo, apenas não sabem, hoje, o que saberão amanhã. Talvez desconheçam que laboratórios secretos de governos do primeiro mundo — ou de grupos privados, bilionários, com projetos de domínio planetário, megalomaníaco, tipo Illuminati — talvez consigam, em total segredo, fabricar vírus que apenas “pareçam” naturais. 

Países politicamente inimigos, com alta tecnologia, temendo que o inimigo fabrique ataques virais, pesquisam também armas biológicas, para defesa e/ou ataque. Tais “armas” são segredos de estado. Isso todo mundo sabe. Se já competem, em segredo, sobre armas atômicas e foguetes, por que — pergunto —, não fariam o mesmo com “armas” biológicas que permitiriam controlar a mente dos inimigos sem precisar matá-los nem destruir seus bens que intactos, passariam ao poder dos invasores? 

O que se pode dizer sobre conflitos entre países seria aplicável, com mais razão, em eventuais conflitos interplanetários que venham a ocorrer. Conflitos esses que nunca chegaram ao nosso conhecimento por impossibilidade física, ou visual, porque a distância entre as estrelas, com seus planetas, é tão imensa que não estariam ao alcance de nossos telescópios. 

Calma, leitor... Sei que a mera ideia de “conflito interplanetário” já provoca risada. Com razão, porque lembra “Guerra nas Estrelas” e todo o besteirol que aparece em filmes para adolescentes. Como o leitor nunca ouviu falar em guerra de verdade entre planetas parece-lhe “impensável” imaginar que a Terra possa estar sendo objeto de desejo, de conquista, de habitantes de outro planeta, pretendendo aqui morar, movidos ou por ambição, ou conveniência ou necessidade. Não obstante, incoerentemente, aos terráqueos parece “normal”, até desejável, “científico”, que enviemos naves espaciais, tripuladas, ao planeta Marte para lá permanecerem em definitivo, iniciando uma colonização. A Terra colonizando Marte não é absurdo, mas o contrário, Marte nos colonizando, é “aberrante”. 

 Esta ideia de ocuparmos o Planeta Vermelho não nos choca, talvez porque presumimos que nele não há vida. Ou, se houver, será ela muito rudimentar. Bactérias, ou coisas assim. Atrevo-me a dizer, porém, que se soubéssemos que em Marte vivem animais semelhantes aos nossos chimpanzés — ponto máximo da evolução marciana —, isso não nos impediria, moralmente, de conquistar aquele planeta — porque pensaríamos estar até “lhes fazendo um favor”, levando nosso progresso, nossa civilização, aos primitivos “ marcianos”, como aconteceu quando Cristóvão Colombo e Pedro Álvares Cabral desembarcaram nas duas Américas, tomaram suas terras e riquezas e escravizaram os nativos. 

 Tenho total convicção de que surge vida microscópica, rudimentar — mas evoluindo constantemente — em todo planeta que, por mero acaso, reúna condições propícias à vida: pelo tamanho, temperatura — distância média “razoável” de sua estrela —, água em estado líquido e beneficiado pela sorte de não sofrerem alguns impacto catastrófico como aquele que matou nossos dinossauros, milhões de anos atrás.

 Todo ser vivo, de qualquer tamanho, nasce, em todos os planetas, com instintos iguais: perpetuação da própria vida e da sua prole. Para isso precisa de alimento, abrigo, sexo, total liberdade —, mas vigilância severa contra a liberdade alheia que possa nos afetar. Nenhum ser vivo nasce se odiando, a menos que isso seja causado por alguma doença, ou total desespero, em que a morte significará alívio. Precisando conquistar um outro país, ou planeta — para não se extinguir —, fará isso, mas na forma compatível com seu grau de cultura científica, técnica e moral. 

Daí minha convicção de que se Marte, ou outro corpo celeste, se habitado por seres inteligentes, considerar a Terra como sua única salvação, esse corpo celeste resolverá “seu problema”, por bem ou por mal. Como nós faríamos, em igual situação. Se imensamente civilizado, o planeta invasor procurará fazer isso com o mínimo possível de dor e destruição, própria e alheia. Daí que, pelo menos em teoria, o planeta invadido, tendo espaço disponível, constatando que não dispõe de tecnologia capaz de enfrentar os invasores, deve pensar bem antes sobre como reagir. 

Repito que desejo que todas as vacinas contra a codiv-19 sejam eficazes no prazo usual das vacinas. Se não o for, é o caso de se pensar: aí tem coisa! E é melhor que essa “coisa” tenha origem terráquea, mais fácil de lidar porque conhecemos a natureza do inimigo. 


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Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues
oripec@terra.com.br

sábado, 26 de novembro de 2022

“Casaca de Urubu”

 


Não sei onde os contistas, no geral, procuram inspiração para suas estórias. De minha parte, o jornal, lido pela manhã, me abastece com muito mais material do que posso aproveitar.

Isso porque a vida continuamente forja incidentes que nenhum escritor, por mais imaginativo que seja, teria a audácia de lançar no papel.

Não que falte aos ficcionistas suficiente imaginação. Usualmente têm-na até em excesso. Junte-se todo o delírio imaginativo de um asilo de loucos furiosos e a soma ficará muito aquém do imaginário de um único escrevinhador. O problema está na preocupação com a verossimilhança.

Precavido com a possibilidade de afrontar a inteligência do leitor, possivelmente mais inteligente do que o escritor, apenas não tendo paciência para cansar o traseiro escrevendo, por exemplo, um romance, o ficcionista não se arrisca a lançar no papel situações aberrantes, criadas pela sua imaginação.

Já a vida real não está nem aí. Desenrola-se com a mais altiva indiferença, nem um pouco preocupada se vão, ou não, acreditar nos seus caprichosos movimentos. Bocejando, a vida simplesmente acontece.

De minha parte e outros, igualmente comodistas, o grande truque da chamada “inspiração” — artigo hoje quase dispensável, tal o acúmulo de estímulos que chegam de toda parte — está em agarrar o fato real, dramático ou pitoresco, relatado pelo obscuro repórter — que, por justiça, mereceria parte dos direitos autorais — e dar ao relato dele uma “ajeitada” embelezadora. Ou “banho de loja”, no linguajar dos vendedores de carros usados — outra categoria profissional com a qual toda cautela é pouca. Sem preocupação quanto à possível rejeição dos leitores mais críticos e sabidinhos. Afinal, se o fato básico realmente ocorreu, embora inacreditável, pode o autor permanecer tranquilo, não obstante a previsível chuva de impropérios e perdigotos, felizmente cuspidos em sua ausência.  Em resposta dirá apenas um “É inacreditável, claro, mas é a própria vida. Apenas carreguei nas cores”.

Um ficcionista pode, por exemplo, necessitando reduzir o elenco de personagens, descrever a cena em que uma cobra pica o pé de uma moça. Convém que ela seja linda porque escritores e leitores jovens não gostam de gastar tinta e tempo com gente feia sofrendo os efeitos do veneno. A jovem morrerá com maior ou menor estilo, talvez nas exageradas “vascas da agonia” — que já foi uma imagem forte, muito requisitada, embora por demais produtoras de saliva. Ou até mesmo não morrer, apenas passando perto, se o autor subitamente se lembrar de que ainda pode precisar da personagem alguns capítulos mais à frente. “Depois eu mato ela”. Mas nenhum escritor teria a coragem de ir tão longe dizendo, por exemplo, no caso da cobra, que quem morreu, após a picada, foi a cobra, não a linda moça. Pois foi o que ocorreu, na vida real segundo um jornal —, quando uma serpente caiu na besteira de, na zona rural, morder o calcanhar de uma baiana vigorosa que saiu ilesa, aos pinotes, enquanto a cobra desencarnava. Talvez morta de susto ofídico e arrependimento; não pela maldade da picada, mas pela burrice na seleção do alvo.

É claro que notícias assim — “Cobra morre após picar o pé de uma mulher, que sobrevive” —, geralmente muito sumárias, merecem ser lidas com alguma reserva. O repórter se interessa apenas pela síntese intrigante. Não esmiuça os fatos. No caso da cobra, pode ser que o pavor da mulher ao sentir-se picada tenha feito a mulher saltar e sapatear, numa espécie de dança guerreira. Sendo, talvez, muito pesada — o jornal não esclarecia — aquele bate-estaca humano, com mais de noventa quilos, mais a velocidade da descida do pinote —, desabando em cima da frágil espinha da tentadora de Eva, possivelmente explicasse melhor a “causa mortis” do ofídio. Mas não, o repórter apenas conta o produto final: foi só a cobra que morreu após a picada. Induzindo o leitor a pensar que o veneno da mulher era muito mais forte. Claro que isso acontece, às vezes, com algumas beldades perigosas, mas não se pode generalizar.

Outra fonte excelente de ficção, também emergente da vida real, está na memória dos velhos. E não se impressionem, os moços, com a maior lentidão das anosas mentes porque, como dizia o também idoso – por isso suspeito – Marquês de Maricá: “ A memória dos velhos é menos pronta porque seu arquivo é mais extenso”. Admitamos que uma parte da marcha lenta cerebral seja devida às condições das artérias, entupidas com excesso de pizzas, torresmos e feijoadas. Mas não se pode minimizar que, tendo o idoso visto muito, é natural que demore, mais que o jovem, a localizar aquela determinada ficha mental, entre tantas amontoadas na gaveta cerebral.

Nesses velhinhos aposentados, tão tranquilos — refiro-me aos mais abonados, ou amparados pelos filhos, porque os que dependem só do INSS contorcem-se na corda bamba — existem verdadeiros tesouros de recordações, com registros de fatos que nenhum escritor, mesmo beirando a loucura, seria capaz de conceber.

Para dar um pequeno exemplo, transcreverei aqui o que me foi contado por um velho cearense, com quase noventa anos mas perfeitamente lúcido.

Dizia-me ele que, quando menino, no Ceará, havia um cidadão que ganhava seu pão cobrando, presencialmente, velhas dívidas. Credores, cansados de cobrar, sem êxito, seus devedores, contratavam esse cidadão, um especialista, que ficava com um combinado percentual do que conseguia recuperar do devedor. Era, enfim, um “cobrador” e tinha um apelido, “Casaca de Urubu”, isso porque trajava, nas suas cobranças, uma espécie de fraque velho de cor preta, fosse qual fosse o calor nordestino.

 Não existindo, então, um sistema de protesto de títulos, o Casaca de Urubu quando parava na casa de alguém isto significava que esse alguém era um devedor que não pagava suas dívidas. Por isso, era temido, não por ser violento, mas porque ninguém quer ficar com fama de caloteiro. Sua casaca funcionava como uma espécie de farda, ou uniforme de cobrança, porque as pessoas das casas vizinhas, vendo o Casaca passando na rua, logo se interessavam, maldosamente, para ver se ele ia se deter em algum portão ali perto, porque a fofoca faz parte da natureza humana.

O velho cearense que me contou esse eficiente sistema prático de cobrança de dívidas não me descreveu —, porque não me ocorreu a lembrança de lhe perguntar — como era, fisicamente, o “Casaca de Urubu”. Se alto ou baixo, fisicamente forte ou fraco. Presumo que era um homem fisicamente forte, grande, porque a pessoa cobrada nem sempre era calma, pacífica, sabendo que a vizinhança a observava disfarçadamente. Alguns reagiam de forma agressiva.

O Casaca não chegava ameaçando nem gritando, mas era firme, de uma tenacidade doentia. Ele simplesmente chegava e cobrava a dívida. Se o devedor não estava, ou mandava alguém da casa dizer que não estava, o “Casaca de Urubu” simplesmente se encostava no portão ou muro, com expressão fechada, e aguardava a sua volta. Não se incomodava de ficar ali horas e horas, sob chuva ou calor. Se o devedor estava escondido dentro da casa, ficava “ilhado”, não se atrevendo a sair, nem mesmo para trabalhar. Se estava fora, não tinha coragem de voltar à própria moradia. Com tática tão eficiente, caso o devedor ainda tivesse algum dinheirinho ele priorizava o pagamento dessa dívida, só para se livrar da sorumbática craca humana.

O grande problema para os devedores, como já disse, é que toda a vizinhança sabia porque o “cobrador” estava plantado ali, qual uma sentinela do crédito. Ninguém queria ser seu amigo, porque amizade implica em alguma proximidade física. E uma simples visita de cortesia do nosso homem equivaleria, hoje, a uma citação judicial, com alto falante, num pedido de falência. O amigo visitado, tão logo a visita ia embora, teria que correr quase de casa em casa explicando aos vizinhos que se tratava de uma visita social.

Para agravar o vexame dos devedores, a garotada da vizinhança costumava seguir, de uma certa distância, expectante, o “cobrador”. Uma espécie de alegre procissão, ou chegada do circo na cidade, porque não era raro que o devedor, sentindo-se desmoralizado, se exasperasse, ameaçando partir para a ignorância. A cobrança tinha, realmente, um grande potencial de violência, numa época em que a necessidade humana de ver sangue — o alheio, claro —, tinha muita chance de ser satisfeita. Naquela época não havia cinema nem televisão, em que sexo e sangue, juntos ou separados, escorrem pela tela e pingam no tapete.

A garotada, claro, torcia para que o devedor não pagasse, porque assim aumentava a tensão e a possível violência. Já o cobrador, evidente, torcia em sentido contrário. Ele só ganhava na medida do que conseguia receber.

Até aqui tudo está normal, podendo o relato ser fruto da minha imaginação. Ocorre que — aqui começa a escalada do impensável, a originalidade da vida real:  quando o devedor, na primeira visita do Casaca, prometia pagar a dívida no dia xis — mas não cumpria a sua palavra —, o “cobrador” tinha um “chilique”, desmoronava, desfalecia, caindo realmente no chão, ali ficando desacordado. O velho cearense não soube me informar se nesses momentos o “Casaca” tinha convulsões, ou se babava – o que caracterizaria a epilepsia. O fato é que caía de verdade, sem escolher jeito menos doloroso de se estatelar. Às vezes desmoronava na vertical, como que implodido, dobrando os joelhos, sem se machucar . Outras vezes caia de chapa, para frente ou para trás, machucando o rosto ou a parte de traz da cabeça. De qualquer forma, seus magistrais desmaios atraiam ainda mais a atenção dos passantes e vizinhos, que se aglomeravam na porta do devedor, tentando erguer o cobrador.

O desmaiar, ou sair andando do “Casaca”, era um outro sinalizador da situação financeira da pessoa cobrada. A vizinhança inteira espreitava, de perto ou de longe: se o “Casaca” desmoronava é porque o devedor estava mesmo numa situação tão preta quanto a casaca do cobrador, inadimplência que representava uma utilidade geral para o comércio local. Equivalia ao atual Serviço de Proteção ao Crédito, ou cartório de protesto de títulos. Se não havia desmaio, a situação do devedor não era tão grave. Ele costumava desmaiar só no retorno para cobrança, sem conseguir receber.

Até aqui não há nada de especial neste relato. O desmaio seria, talvez, mero fingimento, “teatro” do Casaca? Algo diferente, grotesco, mas eficiente? Alguns “galos” na cabeça seriam apenas os ossos do ofício, ou, modernamente, “despesas do protesto do título”?

Ocorre, leitor — e é aí que entra a genialidade da vida real — que os desmaios não eram simulados. O velho cearense, homem sério, me garantiu isso. O “cobrador” sofria realmente os ataques, quando não conseguia receber o que lhe fora prometido. Ao que tudo indica, a contrariedade, a decepção, após tanta espera, fazendo planos sobre como gastaria a comissão —, causava um tal choque no seu peculiar sistema nervoso, que seu organismo reagia desabando. Não constava que ele fosse epilético. Se o fosse, os ataques não escolheriam hora nem local, salvo melhor juízo da crítica médica especializada. Nunca soube que decepção financeira, provocasse ataques epiléticos.

Dirá o leitor mais exigente que, ou o velho cearense mentia, ao relatar os fatos, ou era muito ingênuo, supondo que os desmaios do “Casaca” eram autênticos. De minha parte excluo a hipótese de ser mentira ou ingenuidade do velho que me contou. Ele nem sabia, nem eu, que um dia eu iria escrever sobre seu relato. Se eu soubesse, teria cavoucado bastante sua narrativa.

Cheguei a conhecer bem o caráter desse velho, meu parente, homem de total veracidade. Como ele estava convicto que os “ataques” não eram simulados? Porque, carregado para sua casa, o “Casaca de Urubu” demorava para recobrar a consciência. Ficava mesmo doente, meio zonzo, não trabalhando no dia seguinte. Insisti muito nesse ponto — na tese da simulação — mas a convicção do cearense era inabalável. Ao que constava, o Casaca se machucava de verdade nas quedas, no nariz, na testa. O velho sentiu-se até ofendido com minha insistente descrença. O detalhe da possível simulação fora muito debatido na vizinhança, à época, quando havia poucas distrações na cidade. Agora, se o “Casaca de Urubu” era tão astuto e indiferente às próprias machucaduras nas quedas, aí já não sei. Mas a versão do desmaio autêntico era assunto quase pacífico, mesmo em um ambiente de gente desconfiada. O cearense, pelo que ouço — vivi em São Paulo desde dois anos de idade — é desconfiado por natureza.

Qual o ficcionista que se atreveria a inventar coisa tão anômala?  Nem mesmo um neurologista, dublê de escritor — a menos que tivesse tido um cliente nessas condições — teria lembrança de inventar essa parte final. Talvez o “Casaca de Urubu” fosse um exemplar único no mundo. Pouco tempo atrás, porém, conversando com um experiente médico vizinho, em São Paulo, sobre a estranha reação do desmaio, ele me disse que soubera de um caso semelhante, não de cobrança de dívidas, mas de desmaios autênticos quando a pessoa sofria uma grande decepção. Mulheres, com frequência, até em filmes, costumam desmaiar quando recebem notícias chocantes, como a morte súbita de uma pessoa querida, mas homens desmaiando para mim é novidade.

Minha particular opinião inclina-se — mas não garanto —, para a conclusão de que “Casaca de Urubu” fingia desmaiar, por vários motivos lógicos: primeiro, porque se não fizesse essa cena poucos devedores pagariam seus débitos e essa “moleza” seria contagiosa, tirando seu meio de vida; segundo, porque se fosse agressivo, ameaçador, poderia levar um tiro, ou facada, ou ele matar algum devedor; terceiro, porque, sendo violento, seria fonte permanente de ocorrências policiais, e o delegado  poderia proibi-lo de trabalhar nessa função, visando a paz pública. Ninguém pode ser chamado de “desordeiro” só porque desmaia com frequência.

                           Não sei como terminou a vida do “Casaca”. Pena que não tenha tido a oportunidade de conhecê-lo. Era um homem inteligente, um psicólogo, porque conseguia fazer o que ninguém mais conseguia. Sem burocracia, protestos, justiça ou violência, a não ser contra ele mesmo, mas em diminuta escala. Quem sabe, tendo filhos, tais desmaios possibilitaram estudo em universidade. Haveria fingimento mental com sua técnica? Se havia, o Casaca se punia por isso, machucando-se na queda. 

OBSERVAÇÃO.
Esta narrativa foi escrita vários anos atrás e publicada em livro impresso que publiquei, por conta própria — mais para distribuir aos amigos —, fazendo parte do livro de contos “Tragédia na Ilha Grega”. Como não houve difusão desse livro, fiz algumas alterações. O presente conto — ou será narrativa? — fará parte da 2ª edição, agora online, que venderei pela Amazon.com, logo que terminar a atualização de todos os textos reunidos no livro “Tragédia na Ilha Grega”, agora na versão e-Book.
 

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Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues                             
o
ripec@terra.com.br

FIM

terça-feira, 22 de novembro de 2022

A CIGARRA E A FORMIGA

Foto divulgação


Todos conhecem a fábula de La Fontaine, louvando o trabalho honesto e anecessidade de economizar. Consequentemente, tudo o que se opõe ao comportamento acima só pode resultar em arrependimento e miséria. Precisando de dois insetos para ilustrar sua tese, o fabulista francês escolheu uma formiga — infatigável trabalhadora — e uma cigarra, que não trabalha e passa a vida cantando.

Na fábula (atualizada), a formiga aconselha a cigarra: —“Amiga cigarra, falo para o seu bem. Arranje um trabalho honesto, pense no futuro... “

— Pode parar! Conheço essa ladainha! Desculpe, mas estou atrasada para um show em que vou cantar e rebolar usando apenas um fio dental transparente. Já imaginou o “tchan’ dos ‘cigarrões’? Vão babar...”. Dizendo isso voou e a formiga, balançando tristemente a cabeça, continuou varrendo a calçada.

Longo tempo depois um Mercedes preto estaciona em frente. O chofer particular, solícito, abre a porta dela sai a mesma cigarra cheia de joias, saia curtíssima. Dirige-se à formiga sorrindo: — Querida, não me reconhece?

— Quanto luxo! — responde a formiga, atônita.

— Nem tanto. Saí às pressas porque estou atrasada no meu voo a Paris. Tenho uns contratos milionários a cumprir. Sinceramente, foi um prazer vê-la. A imagem comovente da modéstia, sempre manejando a honesta vassourinha. Tchau”.

— Espere... Já que você vai a Paris, procure lá um tal de La Fontaine e diga a ele que o mandei à p. que o pariu!”

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Modern art

 

    Foto divulgação


                  On concluding my article of the series “The age of mediocrity”, I classified Pablo Picasso more as a skillful psychologist and expert in marketing and advertising than a painter. I never envisaged him as a great painter because - in my sinful ignorance - I believed, and still believe that a necessary qualification of any painter is the ability to draw very well indeed. I repeat: very well. A talent that is not widespread and perhaps inaccessible solely through “muscular” obstinacy. Something like the “musical ear”, a gift. In reality, it is not easy to reproduce a true likeness of a face, a galloping horse, a human figure in a less than conventional position, the movement of waves on the sea, a waterfall, etc. 

However, of all the items of a generic “age of mediocrity”, that which gave me the most work in order to arrive at some kind of conclusion - on my own account - was the definition of what art is; how to interpret the reaction of the public when faced with a painting or sculpture; the difficult “explanation” of the sensation of beauty and the vast nomenclature that arose following classicism. Anyone who wants to understand the meaning of Impressionism, Post-impressionism, Fauvism, Cubism, Expressionism, Futurism, Dadaism, Surrealism, Concrete Art, Abstraction, Primitivism, Pop Art, Minimalism, etc., will face great difficulty in establishing boundaries between these various “schools”. And to further complicate such a slippery subject, the “post-” variations should also be taken into account, given that the artistic species is highly mercurial. 

There is, however, a common thread in all these movements: the more modern the work, the less the need for the physical and mental “sweat” of the artist. To put it another way: the more modern the painting, the greater the degree - dispensing with effort - of abstraction, subjectivism, valorization of quantity over quality, and absolute need of advertising for sale of the “product”. Without advertising, nobody is a “genius”. Actual genius is the brain behind the promotion of the painter. 

If, just for fun, someone who had never before wielded a paintbrush - and even despised the art of painting - made some quick marks on a canvas, with closed eyes, and asked Picasso to sign it, the painting in question would be worth millions of dollars, thus proving that it is not the picture that is important, but the “brand”. In this hypothetical experience, so-called and perhaps naive “connoisseurs” of the style of the famous painter - seeing the authenticity of the signature, by Picasso himself, a joker - would say that, with this canvas, the “genius” once again showed the versatility of his talent. 

Vincent Van Gogh only sold one painting in his lifetime. Those few people who purchased his paintings, for next to nothing soon after his death, had the maximum financial interest in exalting the genius of the painter. The more highly they praised his work, the greater the value paintings would have that were acquired after his passing. Without doubt, Van Gogh was an extraordinary person, but it is strange to think that his pictures only came to be so highly valued after his death. Further proof that “financial psychology”, so to speak, has an immense influence on the valorization of works of art. The question must be asked whether the genius of the Dutch painter, when he was alive, was so non-apparent to connoisseurs of the time, that it was necessary for his pictures to change hands in order to be worth a fortune? Do “art dealers”, who are only familiar with the business of “dealing in art”, have a better “eye for art” than real scholars of art?

I would feel more comforted if I knew that the genius of Van Gogh had been recognized when he was still alive. He was a tragic man who suffered greatly, which only inspires our sympathy. And with a detail: he knew how to draw. His good character, sensitivity and personality deserve the greatest respect, but his example is proof of the fact that money has contaminated and dominates the world of the arts. Paintings and sculptures have become more of a financial issue - just like the actions of corporations -, than an issue of actual art. Here lies the explanation of why I have included visual arts in my series of articles on mediocrity in general. Money has introduced mediocrity into the arts. 

Leonardo da Vinci took five years to paint the “Mona Lisa”. He painted for just a few hours in a single day, continuing little by little on others, striving to achieve perfection in details. In any case, a considerable amount of time to paint a single picture. In counterpart, Picasso even said, according to quotes on the internet, “Give me a museum and I'll fill it”. 

As any museum is always vast, only a fast-working and roguishly “abstract” painter could fill it alone. With some twenty or thirty paintings a day, Picasso would be able to deliver the goods in a few months. Proof of the fact that it was quantity that interested him, and the mere declaration, by the artist himself, of the existence of  a deeply emotional “meaning” in those few brush strokes. So profound that it was only felt by him. Believe it if you want to.  

Tom Stoppard, an observer of modern art, even said that the only criterion for distinguishing a painting from a modern sculpture would be the following: “if it hangs on a wall it's a painting, and if you can walk around it it's a sculpture”. 

Richard Schmid, probably a connoisseur of the subject - because he is mentioned on art sites - said that “I honestly believe students of painting in the next century will laugh at the abstract art movement. They will marvel at such a drawn-out regression in the plastic arts”. 

Al Capp, in his distinctive, more brutal and direct style, said that “abstract art is produced by the talentless, sold by the unscrupulous, and bought by the utterly bewildered”. 

Another harsh critic of modern art even said that “trying to understand modern art is like trying to follow the plot in a bowl of alphabet soup”. 

And, finally, what did the prince of painters, Leonardo da Vinci, say? He said that “where the spirit does not work with the hand, there is no art”. Elitism? No, simple recognition of the fact that the artist should add some emotion to the perfect technique of drawing and painting. 

In other words: without the “hand” of the true artist, the subjectivism of the painter is just not enough, however much he sincerely feels excited - the great excuse for the modern painter who only trusts in what he feels, not in that which may be sincerely felt by the public. 

The bottom line is that the essential function of art is to give rise to pleasure. Real pleasure, not the false pleasure required by fashion. At a piano concert of classical music, a pianist, even cold in feeling but endowed with an uncommon technique - so uncommon that it overwhelms the audience - will be a better piano artist than a key-hammerer, tremendously excited, sweating, groaning, eyes on target, but by playing everything wrong, almost punching the keyboard. 

If, in the case of modern art, that which matters is the emotion of the artist - and not the effect of the product of his hands on others - it is possible to imagine that science has invented a device capable of recording the degree of emotion and inspiration during performance of a musical piece. A device, of proven effectiveness, similar to that used today to measure blood pressure. Or similar to a current lie detector. The difference is that the latter indicates the existence of lies, whereas the other, more modern, would prove the real sensitivity of the artist. Let us continue, giving an example. 

The arrival in London of a new musical genius is announced with great fanfare; a foreign pianist - so brilliant that few listeners would have the ability to “understand” the profound nature of his art. His manager would say that the artist’s inspiration cannot be feigned, given that the aforementioned infallible device would be attached to his arm, showing evidence of the maximum degree of feeling that a human being can endure.  

In the advertising that would precede the inaugural concert of this newly discovered genius, there would be a warning that individuals lacking an exceptional degree of musical sensitivity should not even purchase tickets, as they would probably not be able to “capture” the depth of the art hidden in simple appearances. The presence of the great artist in the country would even be doing a favor to Brazilians. It would show our own people an artistic wealth that they had not noticed in their old folklore. Such a lack of interest in selling tickets to people without any artistic sensitivity would even stimulate demand for such tickets. Everyone buying tickets would be demonstrating how sensitive they are to artistic beauty.   

On the announced day, with a packed Royal Festival Hall, a “sincere emotions detector” would be attached to the pianist’s arm. After an impressive silence, the artist would begin to play, using only one finger: “Oh, can you wash a sailor's shirt, Oh, can you wash it fine? Oh, can you wash a sailor's shirt and hang it on the line?” 

The audience, dumbfounded, wanting to laugh but dreading being considered ignorant, would maintain a straight face but continue to observe the immense electronic panel - connected to the “sincerity detector” - in the hope of seeing an inadequate “sincerity” result that would authorize the booing imprisoned in everyone’s throat. The device, however, would confirm the maximum level of artistic emotion felt by a human being. The extraordinary inspiration of the pianist would thus be duly demonstrated. With this, those in the audience would only complaint silently to themselves: “I really am extremely ignorant, but I would not confess this to anyone. I will give a standing ovation”.

 And if the artist suffers a stroke, his heart unable to withstand so much emotion, and drops dead on completing the special concert? There would be a long theoretical discussion on the brilliance of pianist and the mysterious reasons that made the artist choose this style and not another. Among others, the questions raised would include “Why was it necessary to ask whether someone can wash a sailor’s shirt? What is the symbolism involved?”, and so on. 

Of course, I am exaggerating in this example; however, in substance, it is that which occurs with the excuse that artists only have to think about what they feels in order to express their art. Only think about themselves. They are not concerned whether or not the public felt authentic pleasure. If there is pleasure on the part of the public, it will be the pleasure of “being up-to-date, one of the crowd, a follower of fashion”. 

Going back to painting, everything was going very well in Classicism, until a technical novelty arose, outside the art world, which shook the pacific panorama that emphasized the art of drawing things as they are seen by the eyes: photography. With a simple “flash”, anything could be “drawn” with an accuracy of line and balance of proportions that only a Leonardo da Vinci could achieve. The spread and improvement of photography was the saving excuse of many artists who, despite their enthusiasm for painting, could not draw. 

The path - or shortcut - was open for the man who admired the arts, identified himself emotionally with them, and would like to be part of that mysterious world, full of temptations. The women of the time - the late 19th century and early 20th century - felt a special attraction for artists, generally impetuous and free of restrictions in matters related to other men’s wives. Today, they probably prefer the “artists of finance” and mass sports; far more profitable, or should I say attractive to them. Painters were, then, almost always men. 

The art world - when sincere and authentic - really has an interesting facet. Its insights are frequently right. Freud confessed that he rarely made some kind of discovery without  some poet having been there first. True art is good in this respect: it attains “without deliberately wanting to”, by intuition, areas not yet reached by science. It flies, although falling frequently, whereas the scientist goes on foot. 

With the advent of photography, there was also the emergence of “smart painters”, who only wanted a quick and easy path to fame and its by-product: money. It was artistic “democracy” that would allow any audacious artist, without any drawing talent, to bold facedly “appear” and draw attention. “The order now is to scandalize!”. The more shocking his work - in non-conformance with the normal appearance of objects - the greater the “scandal” capable of attracting attention, with good business consequences. 

With as view to confronting the most distrustful or skeptical observers, who said that there was only audacity in the work, not art, there were two clever excuses: 1) those who want the exact reproduction of a landscape or object should take a photo; and 2) in the arts, what really matters is the feeling of the artist, not the visible physical product of this emotion. 

It was Pablo Picasso who, with great frankness, raised the argument that, in painting and sculpture, what really matters is the emotion of the artist, not what we know as “mere reality”. In his opinion, the painter can even paint with his eyes closed, provided that he is “inspired”. The general public should not be concerned with appearances. It should only “feel” the same as that “felt by the artist”. He stated this nonsense with such conviction - extraordinary psychologist that he was - that some millionaires began to buying his paintings, thus giving rise to immense valorization of any picture with the signature “Picasso”. He afforded himself the luxury of saying that he was not sufficiently rich to have a “Picasso” in his home. 

There follow some of his quotes, taken from the internet: 

“I paint objects as I think them, not as I see them”. 

“Painting is a blind man's profession. He paints not what he sees, but what he feels, what he tells himself about what he has seen”. Remark: he was a joker. 

 “The people who make art their business are mostly imposters”. 

“The world today doesn't make sense, so why should I paint pictures that do?” 

“To draw you must close your eyes and sing”.  

“Who sees the human face correctly: the photographer, the mirror, or the painter?” 

What explains, then, the permanence of modern art and its high economic value, even though easy, brief, shocking and out of touch with visible reality? 

In my opinion, the explanation lies in the personality of the artist. In audacity, firmness, bold faced effrontery, “charisma” and “marked personality”, as was the case of Picasso, a great psychologist. Or in integrity and compassion, as in the cases of Vincent Van Gogh and his friend Paul Gauguin. It is impossible to read the biography of these two without being touched by such sensitive souls. Did they know how to draw? They knew enough; more than the average attained by people who are not artists. However, they were people of immense integrity.  

The character of artists “contaminates” their work positively or negatively. It has a great influence regarding their acceptance by the public. Including their political leanings. Picasso himself benefitted from this. He had interesting ideas and was frank in his opinions, as we can see in the above quotes. If he had been a man of right-wing sympathies or a Nazi, he would never have been considered a famous painter. “Guernica” gave him a boost. The same occurs in other arts: the personality of the artist “contaminates” his or her work, for better or worse. 

Abstraction is more appropriate ground for philosophy, not painting. I think that, at least for a long time, human beings will still require some degree of virtuosity, difficulty and hard work on the part of all painters. In sports competitions, the circus, cinematographic performances and the writing of tales, novels, chronicles and poems, it is expected that artists express themselves with an extraordinary degree of skill. I cannot accept that a writer just “feels” refined emotions in his mysterious head, only writing nonsense, or even things that are incomprehensible to the writer himself. Hence the general well-founded prejudice against modern art that is not pleasing to look at and can mean anything: - “It’s too easy. Based on this, even I deserve a prize...”, more sensible people think.   

Now a brief word about music. Of all the arts, I think that it is the less susceptible to deceit. Musical mediocrity cannot stay afloat for very long, as it can be assessed in a matter of minutes. It sinks because there is no financial advantage in keeping it afloat, when it pleases practically nobody. It is only necessary to listen to a new piece of music for one minute in order to decide whether it is worthwhile to continue listening. The scale of its production and the size of its public are such that it is not worth spending on advertising for music that nobody wants to hear, or even less buy in disc form. On the other hand, in the case of modern painting, there is a restricted market of rich buyers, the paintings functioning as a store of value, when the name of the painter is very well known. The painting is physical, palpable, concrete and exists, as if it were a negotiable instrument. On the other hand, music that nobody wants to hear is mere noise, of no interest to anyone; there is no way that it can be turned into a gemstone. 

There only lingers a doubt with respect to jazz. Most people do not like it, as there is no identifiable melody. In my opinion, jazz should only be used as a composing technique. The musicians would continue improvising without an end in sight, but when, by chance, the errant instrumentalists “stumble upon” a new melody, they would develop it, thus composing a “normal” piece of music. 

Summing up, modern art has its use in the manufacture of decorative items, toys, furniture, book covers, etc. Not as great painting or sculpture. 

This article was written in Portuguese and translated by John Upson      (upson@translations.pro.br) 

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Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues
retired judge

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sexta-feira, 21 de outubro de 2022

Poupança trágica

 


 Foto divulgação 

    João, metalúrgico, parece reunir coragem, olhando a marmita de alumínio que se encontra no colo, destampada. — “Hoje ou amanhã? — questiona-se. Está com medo — e não é para menos —, mas sabe que terá coragem de fazer o que considera necessário. Na verdade, necessário não é, mas quem consegue enfiar juízo na cabeça de um homem, na sua situação? Hesita apenas quanto ao momento de agir. Mas se deixar para amanhã, a tensão será a mesma ou maior. Quanto mais depressa resolver o problema, melhor.

  Neste exato momento, encontra-se sentado no chão da fábrica, pernas estendidas, costa apoiada na parede. É hora do almoço e, à sua volta, cerca de quinze colegas comem o almoço que trouxeram de casa. O operário mais próximo, o “Canhoto” — que ele considerar um mau caráter — está saboreando, com exibicionismo, uma sobrecoxa de frango grelhado. Dos presentes, é o que sempre come melhor. Frequentemente se dá ao luxo de almoçar na lanchonete da esquina, sem preocupação com o preço, às vezes até pagando a despesa de alguns colegas. Tem prestígio dentro do sindicato. — “O que está acontecendo com ele? Matou a tia rica solteira e recebeu a herança”?

   A visão do frango grelhado aguça involuntariamente o apetite do João que passa a olhar o ovo frito, montado no arroz, que trouxe de casa. A sobremesa será uma banana. Não compreende como possa sentir fome num momento tão difícil quanto este. Pelo jeito, corpo e alma, nele, vivem separados.

 Teme vomitar se logo após o almoço fizer o que pretende. Mas, se agir antes permanecerá com fome, pois não conseguirá comer em seguida.

Enquanto hesita, confere seu “extrato bancário”, que não está escrito em papel, mas em carne, ossos e unhas: sua mão esquerda, um membro grande, moreno, ossudo. Mão de homem alto. Difere anatomicamente da normalidade pela falta de duas falangetas. E também difere em seu significado econômico porque ela é sua “caderneta de poupança”.

Explico: nosso homem, quando em dificuldade financeira, esmaga “involuntariamente” na prensa rápida da fábrica um pedaço de dedo, recebendo a indenização acidentária.

A primeira “aplicação dedal”, lembra-se, foi uma falangeta que serviu para pagar aluguéis atrasados, evitando o despejo. A segunda — pasmem, mas com cautela, porque o consumismo inventa coisas do arco da velha — para comprar uma televisão a cores, pressão das duas filhas, já mocinhas, que alegavam passar muito tempo na rua porque não havia televisão “que prestasse” em casa. Elas nunca souberam do sacrifício.

A ideia de obter recursos “aplicando” pequenas frações de sua anatomia surgira por acaso, quando de um acidente — verdadeiro, involuntário — sofrido por um colega. Este, no fim do horário de trabalho, distraído, não afastara a tempo a mão. Apenas levara um susto quando a prensa baixara, com força e velocidade. Retirando o membro de imediato, esse colega chegara a pensar: “Quase pegou minha mão!”  Mal pensou viu dois dedos bem amassadinhos na placa de aço. Aí, quase desmaiara. Não de dor, mas de susto. A dor veio depois.

 Por se tratar de um típico acidente de trabalho, a indenização foi paga imediatamente, sem burocracia ou contestação na justiça. Houve ainda, no caso desse colega, um período de afastamento do trabalho, remunerado. Quando o acidentado retornou ao trabalho, não parecia infeliz, porque, com o dinheiro da indenização, comprara uma lambreta usada, o que lhe permitia passear e escapar dos ônibus superlotados. Vendo-o partir motorizado nosso João, ficara refletindo sobre a utilidade de certos “acidentes”. Um ano depois do acontecido com o colega, na iminência do despejo do imóvel por falta de pagamento, João sacrificara parte do dedo mínimo da mão esquerda. Foi um ato de desespero, certo, mas precedido de alguns cálculos. Um ano depois, “perdeu” parte de outro dedo, vizinho do primeiro. E de tanto calcular, tornara-se quase um especialista em matéria de indenização por perda de membros. Uma espécie de gerente de banco, que conhece, na palma da mão, digo, nos cotos dos dedos, o rendimento de seus “papéis”.

O homem que neste momento se domina para não almoçar — pretende perder algumas falanges, mas não a vida, com uma congestão, esmagando um dedo estando com o estômago cheio. Ganha mal, mas não tão mal assim. Recebe três salários-mínimos brasileiros, o que lhe permite uma subsistência cautelosa, difícil, mas não impossível. Razoável, portanto, que o leitor se pergunte qual a terrível necessidade que o empurra para tão absurdo e doloroso “investimento”.

A explicação é simples. Nosso homem sofre do “coração”. Se ele fosse mulher berbere, no Marrocos — segundo um livro de curiosidades antigas —, e estivesse apaixonada, diria que seu “fígado” tinha sido “roubado”.  Para esse povo marroquino, a sensação do amor nascia no fígado, assim como hoje falamos em “coração”, embora sabendo que a “coisa” age no cérebro. Enfim, ele está amando. Sabe-se apaixonado, escravizado por sensações de adolescente de cem anos atrás. Mas a consciência desse ridículo não o alivia nem um pouco. Está de tal modo caído por uma mocinha de nome Neusa, que quando não a pode ver sente uma espécie de garra apertando o coração. A todo momento, pensa nela, uma “durona”, porque até agora não se entregou a ele. Por duas vezes, distraído, com dolorosa saudade, João quase perdeu a mão em acidente verdadeiro na mesma “agência bancária”, a prensa. Está casado há quinze anos, tem sido um marido noventa por cento fiel, mas ao contrário de seus colegas de “fraqueza”, cada vez que “pula a cerca” se apaixona como um adolescente romântico.

Neusa é uma mocinha bonita e decidida, que gosta de pôr “os pingos nos is”. Aliás, ela usa e abusa dessa expressão. Desde que começou seu “flerte” com nosso “investidor” — na opinião dela, um “coroa” bonitão — vem sofrendo uma terrível guerra psicológica, auditiva e até mesmo braçal dentro de casa. Sua mãe mantém uma vigilância constante e desagradável contra esse flerte ou namoro com um homem casado. Aliás, com qualquer homem que não demonstre desejo de casar e fazer tudo direitinho, no cartório e na igreja, com bom emprego e sem vícios. Ameaçou-a de expulsão, caso não parasse com aquilo. Presume que sua filha ainda é virgem. E se ela for expulsa, para onde irá?

Neusa precisa urgentemente sair de casa. Mas morar onde? Na casa dele, juntamente com sua mulher? Não chegaria viva até a cozinha. A esposa do João é uma senhora vigorosa, até musculosa, trabalhadeira, moralista e corajosa. Certa vez, saíra no tapa com um cobrador de ônibus que pretendia iludi-la no troco. É muito mais enérgica do que o marido, um sonhador. Este sempre reconhecera o valor da sua mulher, sendo-lhe grato por muitas coisas. E tem-lhe medo até mesmo físico, devido à retidão e firmeza dela, não obstante seja um homem que não teme outros homens. Mas a força da nova paixão supera qualquer outro sentimento.

Com o sacrifício que fará daí a instantes, poderá “montar casa” para a Neusa. Ela deixara claro que gostava muito dele, não obstante a diferença de idades, mas que não aguentava mais o ambiente de perseguição dentro de casa. Ameaçava fugir para outra cidade, em outro Estado, sem deixar endereço. E bonitinha como ela só, ele pensou, logo arranjaria outro homem. Assim, onde arranjar dinheiro urgente, de modo a mantê-la na cidade?

Nosso angustiado, vez por outra, lia em jornais, nos fins de semana, que um homem matara a amante, ou esposa, e depois se suicidara. Nessas ocasiões, quando seus colegas ou familiares censuravam, até com gracejos, tão louco sacrifício pelo amor de uma mulher, nosso homem respondia apenas com o silêncio. Conhecia-se. Sabia que, um dia, poderia chegar a tanto. Se teria coragem até para colocar sua cabeça debaixo de uma prensa, por que não poderia deixar ali apenas alguns dedos? Ouvindo, dias atrás, a expressão “Vão-se os anéis, fiquem os dedos”, ele intimamente adaptara o conselho para “Vão-se os dedos, fique a Neusa!”.

Não! Não tinha mais dúvidas. Para reforçar a decisão, tomar coragem, era só lembrar o rosto dela, sempre presente na sua alma. Mesmo que levasse um fora após um ano, dar-se-ia por recompensado. Aquilo já não era um caso de amor, mas uma doença, da qual só se livraria “comendo” a causa.

O horário de descanso estava se esgotando. “Afinal, almoço agora ou não?” —, ele se perguntou. Se comesse, o acidente planejado pareceria mais natural, pois ninguém pode imaginar que uma pessoa vá almoçar prosaicamente, sabendo que logo em seguida perderá os dedos, esmagados. Comeu rapidamente, procurando não pensar e, quando se dispunha a ir até o bebedouro, a campainha da fábrica tocou, anunciando o término do intervalo para o almoço. Tinha que ser agora! Desistiu da água e aproximou-se da prensa onde trabalhava.

Olhou em volta e percebeu que “Canhoto” o observava. Desviou a vista, mas quando olhou outra vez na direção do colega, este continuava fixando-o. — “O que quer esse desgraçado?” — perguntou-se. Teria adivinhado sua intenção?

Lembrou-se, então, que tendo sofrido já duas lesões na mesma mão, a esquerda, sendo destro, não seria melhor sofrer o “acidente” na mão direita? — Não, não deformaria sua mão direita, seu único ganha-pão. Melhor seria caprichar na “cena”, com a mão esquerda, dando um “escorregão” bem convincente. Para isso, precisava de um pouco de lubrificante nas solas dos sapatos. Pequenas manchas de óleo eram comuns no chão, naquele local da empresa.

Com forçada naturalidade, deu alguns passos para pegar o recipiente de óleo, mas, lembrando-se que a presença do recipiente, perto do “acidente”, poderia causar estranheza, decidiu utilizar apenas um pouco da substância na palma da mão, o suficiente para passar nas solas. Retornou para perto da prensa e fingindo amarrar o sapato, agachou-se, saindo do campo de visão do “Canhoto”. Agachado, besuntou as solas dos sapatos. Em seguida, limpou a mão em um pano sujo e pegou uma peça que precisaria realmente ser amassada, colocando-a na posição adequada. Preservaria o polegar, o indicador, e o dedo médio da mão esquerda. O resto podia virar bife com osso.

Para que não houvesse dúvidas, depois, quanto ao “escorregão” que explicaria o acidente, o operário posicionou suas mãos e pés — tal qual um meticuloso diretor de filmes — para que a cena ficasse bem convincente. Para isso, fez um “ensaio” de movimento antes de acionar a prensa.

Algo errado, porém, aconteceu no ensaio. Com o movimento rápido e deslizante de um dos pés, ele perdeu o equilíbrio e, instintivamente, tentando não cair, sua mão direita foi inteiramente esmagada.

Não houve dor imediata. Apenas um choque, seguido da sensação de horror, porque de forma alguma João queria aquilo. Sentiu um calafrio quando viu o sangue saindo do coto sangrento. Tentou correr, para pedir auxílio e estancar a hemorragia, mas por causa do óleo na sola escorregou de novo e caiu, batendo a testa na quina de uma caixa de metal. Permaneceu meio minuto desacordado. Socorrido por dois funcionários que trabalham no escritório e raramente transitavam pela área de produção, foi levado ao pronto socorro e dali para um hospital.

Alguns dias depois, já fora de perigo, mas deprimido por perder a mão, sentindo ainda a “dor fantasma” na mão ausente, encontrava-se em casa, fazendo contas, com a mão esquerda, usando a maquininha de calcular — presente da esposa. Refazia os cálculos porque a indenização agora seria muito maior. Provavelmente seria aposentado por invalidez, porque era destro.

Sua esposa parecia-lhe um tanto indiferente, como se carregasse no íntimo algum rancor. Mas poderia ser simples tristeza ou consciência pesada dele mesmo. Afinal, fizera uma tremenda burrada. Sem a mão direita, precisaria se acostumar com a outra e arranjar nova profissão em que utilizasse mais a mente que as mãos.

A empresa onde trabalhava estava demorando para se pronunciar sobre a indenização. Alguma coisa não estaria bem?

 Alguns dias depois do acidente, alguém bateu palmas junto à sua porta. A mulher foi atender. Era um advogado da empresa, simpático, delicado, com pouco mais de cinquenta anos. O operário se animou, pensando: — “Oba! Ele veio trazer o cheque pessoalmente”. Estranhou, porém, o fato de ser procurado, em casa. Em vezes anteriores, não fora tão prestigiado.

 Após os cumprimentos de praxe, o advogado pigarreou e perguntou à mulher do acidentado se poderia falar a sós com seu marido.

              A mulher pareceu surpresa e ofendida com a solicitação:

 — Não há necessidade, doutor. Aqui em casa não temos segredos.

O advogado hesitou, constrangido, mas logo insistiu: — Minha senhora, não há o que temer. Nesses assuntos — mentiu —, é exigência da firma que a conversa seja apenas entre o empregado e o representante da firma. Evita discussões entre familiares, com versões diferentes sobre o fato. Não leve a mal.

— Por que não posso ouvir? — insistiu a mulher, com as mãos na cintura, erguendo as sobrancelhas. Era de sua natureza brigar, discutir, nada entregar de modo fácil. Seria uma grande líder em outro meio, se fosse interessada em política.

— Porque tem que ser assim! É a regra — mentiu o advogado, erguendo a voz, já aborrecido com a insistência. — Se a senhora não aceita as normas da empresa, muito bem! Eu volto agora mesmo para meu escritório e seu marido que vá tratar de seus interesses no departamento do pessoal.

 Vendo que a mulher ainda assim hesitava, fez menção de se levantar para sair.

— Está bem... — ela concordou, de má vontade. — Preciso mesmo ir à padaria... Podem conversar à vontade... — E saiu da sala de cara feia, fechando a porta.

O advogado voltou a sentar-se e encarou o operário como se o estudasse, em total silêncio.

— Então? — perguntou o maneta, inquieto.

O advogado pigarreou. Procurando deixar o interlocutor à vontade, observou de maneira simpática, com um meio sorriso nos olhos:

            — Está se sentindo melhor?

            — Ah, já... Mas ainda dói. A gente tem a impressão de que é a mão que está doendo. O médico me explicou que é a “dor fantasma”.

            De repente sério, o advogado, fitando o operário bem nos olhos perguntou:

            — Por que você fez isso?

            O coração do operário imediatamente se acelerou. Cauteloso, respondeu:

            — Isso o quê?

            O advogado sorriu, compreensivo. Sentia uma certa simpatia pelo homem a sua frente. — Vou ser franco com o senhor... Pessoalmente, se dependesse só de mim, até apressaria o pagamento da sua indenização. Mas lamento dizer que há uma coisa em jogo e que torna isso impossível.

            O operário retesou-se, inquieto, no velho sofá, sentindo a ameaça no ar. Mas precisava reagir:

            — Impossível?! O que é impossível?

            — O pagamento da indenização.

            — Diabo! E por que não? Isso não vale nada? — perguntou, erguendo o toco, quase encostando-o no nariz do advogado. — Que “maracutaia” é essa? Quem paga é o INSS, não o patrão!

            O advogado não se abalou:

            — Você sabe muito bem porque não pode ser indenizado...

            — Não sei! — não ia ser agora, aleijado, que se entregaria facilmente.

            — Olha... — o advogado procurava ser didático e sem tom de crítica. — Quando você fazia toda aquela encenação, estava sendo filmado. A câmera registrou tudo: você pegando o lubrificante, abaixando-se, escondendo-se para passá-la na sola do sapato, ensaiando o acidente. Na verdade, você acabou escorregando de verdade, não foi? Deu para perceber que você se feriu além do planejado. Quantos dedos você queria perder?

            O operário estava arrasado. Não era, no fundo, um homem de mau caráter. Sentia-se esvaziado de energia, frio como uma lagartixa, mas sabia que deveria continuar lutando, mesmo sem forças. Com voz apagada, perguntou:

            — Não sei do que o senhor está falando...

            — Sabe, sim... Tenho pena do senhor... Pessoalmente, vejo a coisa com certa simpatia, mas...

            — Por que estavam me filmando? Sou tão importante assim?

            — A filmagem nada tinha a ver com a sua pessoa... Há tempos que suspeitávamos do seu colega, aquele apelidado de “Canhoto”. Ele vinha furtando peças pequenas, as mais caras, há vários meses, mas não tínhamos uma prova segura. Furtava e ainda “fofocava”, a mando do sindicato, incentivando greves e falando mal da empresa. Tem ambições políticas. Aí, o chefe da segurança sugeriu que a firma instalasse, em segredo, uma filmadora escondida entre aquelas caixas da prateleira mais alta, onde ninguém mexe. Assim, pegamos o “Canhoto” com a mão na massa, e você por mero acaso. Quando você estava caído, desmaiado, o  malandro tratou de encher os bolsos extras que tinha mandado costurar dentro das calças. Agora, a pergunta mais importante: Por que você fez isso?

            Responder o quê, João pensou. Se me filmaram até passando o óleo na sola, não adianta continuar mentindo, mas quem sabe esse advogado talvez invente uma saída que me ajude:

            — O senhor não vai acreditar... Precisava de dinheiro...

            — Isso não precisa dizer... Ninguém joga fora os dedos por diversão. Minha pergunta é: para que você precisava do dinheiro?

            — Tenho dívidas. Estou para ser despejado...

            O advogado se ergueu, impaciente:

            — Por favor, diga a verdade... Você inventou isso agora... Antes de procurá-lo, examinamos a sua vida. Seu aluguel está em dia. E não consta que você é viciado em drogas. Vamos ser francos: não seria alguma complicação amorosa? Você tem sido visto com uma mocinha...

            — “Mais essa, a Neusa!” — pensou o acidentado. Não adiantaria mentir. Quem sabe, sendo sincero, comoveria aquele advogado tão compreensivo.

            — Desculpe, vou ser franco... Fiz isso por amor... Estou apaixonado... Não posso viver sem ela... Precisava alugar uma casa ou quarto e, sem dinheiro, o senhor sabe que não dá...

            O advogado já passara também por dois problemas assemelhados. Sentiu um impulso de solidariedade. Pretendia ser também escritor, além de advogado. Neste caso não agia apenas como advogado. Só mesmo uma paixão louca — e muita coragem —, pensava, levaria um homem a esmagar partes de seu corpo, para não perder uma mulher. 

            — Por mim, como já disse, o senhor receberia a indenização, mesmo porque quem paga é o INSS . Num país de tantas fraudes, seria uma coisinha de nada... Afinal, você acabou perdendo a mão inteira. Ocorre que, sem esse filme, nós não podemos “pegar” o “Canhoto”, que tem bons advogados no sindicato...

            — Não dá para cortar, no filme, a parte em que apareço?

            — Pensei nisso, mas não dá... Se eu cortasse, o advogado do “Canhoto” diria depois que se trata de um filme editado, cortado. Não serviria como prova.

            — O canalha! — exaltou-se o operário, pensando no colega de fábrica. — Sempre tive nojo daquele cara! Era por isso, então, que ele me olhava, disfarçando... Era o contrário! Que mal esse cara me fez... Mas o senhor não pode examinar de novo e descobrir uma saída? Olhe como estou — e ergueu o toco, dispondo-se a tirar as ataduras.

            — Não, não preciso ver! Não adianta! O problema é que, se nós escondermos a sua manobra, não informando o INSS — que estava sendo prejudicado com a tua fraude , inclusive dando mal exemplo aos outros empregados —, posso entrar numa fria, como advogado, porque quem se auto lesiona, comete crime de estelionato. Eu seria um cúmplice, no que se refere ao prejuízo do INSS... O Canhoto precisa ser demitido por cometer furtos contra a empresa, sem sair como herói e vítima do patrão.

            — Uma paixão desvairada, tenho que confessar... — explicou o operário, dramático, erguendo a voz, aproveitando o inesperado bafejo de simpatia que lhe poderia trazer alguma vantagem.

            Nem bem disse isso sua mulher abriu a porta com violência, entrando na sala como um furacão, aos gritos:

            — Desvairada! Paixão desvairada! Sem vergonha! Maneta burro! Só não meto a mão na tua cara porque não bato em aleijado!

            — Calma, você não entendeu!

            — Entendi tudo! Estava escutando atrás da porta, me dominando para não te meter a mão! O “Romeu” burro então ia perder os dedinhos por causa de uma biscate sem vergonha? Pois informo que perdeu a mão e a putinha! Nesses dias em que você esteve no hospital, tive uma “conversinha” com ela. Uma vizinha já vinha me buzinando no ouvido sobre esse “romance” escondido. Mas perca as esperanças, bobão, porque depois da nossa conversa ela não terá coragem nem de olhar pra tua cara. Está apavorada. Se eu mandar ela lamber meu sapato, ela lambe! Eu não tinha te contado nada, até agora, porque você tinha perdido a mão. Pensei que tinha sido um acidente. Fiquei até com pena, mas estou vendo que não devo ter pena de um fraco, que aceita perder os dedos por uma biscate. Eu já vi que não valho nada pra você... — E, dizendo isso, saiu da sala para não chorar.

            Silêncio sepulcral na sala.

            O advogado se ergueu, impressionado com aquela tragédia doméstica. Gostava de teatro, mas aquilo suplantava qualquer peça. Ao sair, disse que iria reexaminar o assunto e que esperasse alguns dias, não fazendo nenhuma “besteira”. Mas não lhe garantiu coisa alguma.

            Caminhando até o carro, o advogado estabeleceu um plano de ação. Iria trocar ideias com um dos diretores da firma, que já tinha tido alguns problemas domésticos assemelhados. Um pouco de “precedentes amorosos” operaria maravilhas. Tinha quase certeza que encontraria alguma saída para o maneta. Afinal, para que existem os advogados?

            Quando o causídico se retirou, o operário foi para o quarto, deitou-se de costas, cobriu os olhos úmidos com o antebraço dobrado e ficou quase tão imóvel quanto um morto. Não tinha ânimo nem para respirar.

            Na cozinha, a mulher, zonza, pressão arterial nas alturas, mexia mecanicamente nas panelas e enxugava as lágrimas. Precisava fazer o almoço.

 

       FIM

Este conto faz parte do livro “Tragédia na Ilha Grega” que será lançado em breve

 

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Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues
            Desembargador aposentado
            oripec@terra.com.br