1ª Ofensa: a PEC 37.
Poucos dias atrás li
uma notícia curta, em jornal paulista, dizendo que a Comissão Especial da
Câmara dos Deputados votaria, em 31-10-12, a PEC 37, que proíbe promotores e
procuradores da justiça realizarem
investigações na esfera criminal.
A aprovação desta PEC é
um tremendo retrocesso na luta do Brasil para diminuir a impunidade.
Compreende-se que interesses corporativos existam em todas as profissões — sem
exceção — mas cabe complementar essa compreensão com a grande e essencial
pergunta: o que importa mais? A preservação do natural orgulho profissional, o “esprit de corps”, ou a melhoria do serviço prestado pelos
profissionais? Qual o medo embutido naqueles que não querem que “ninguém de
fora” — no caso, promotores e procuradores, pessoas especializadas na luta
contra a criminalidade — investiguem condutas suspeitas, principalmente ligadas
ao crime organizado?
É óbvio que o
Ministério Público, já bastante ocupado na sua função acusatória em juízo, não
vai tomar iniciativas investigando crimes banais, nem crimes graves em que não
haja influências externas atrapalhando a busca da verdade. O MP está interessado
apenas em impedir que criminosos poderosos — política e economicamente —,
exerçam quase irresistível pressão sobre investigadores, escrivães de polícia,
delegados e mesmo secretários de segurança pública.
O policial cumpridor de
seus deveres sabe que se quiser investigar, “pra valer”, algumas atividades
suspeitas — talvez todo mundo já saiba
que não é mera suspeita... — de um figurão do Estado, da República, das altas
finanças — ou mesmo, eventualmente de um membro da cúpula policial —, põe sua
carreira em risco. Ele não tem a garantia constitucional — deveria ter... — de
se manter naquele cargo, caso atue com lisura, embora de forma corajosa. Poderá
ser removido ou caído em desgraça, ou atropelado. É para esses casos,
essencialmente, que serve a permissibilidade de um promotor ou procurador
iniciar uma investigação.
A tendência atual é que
todos os Poderes sejam investigados, interna e externamente. Considere-se que
juízes estão sujeitos ao controle externo, exercido pelo Conselho Nacional de
Justiça. E órgão equivalente também exerce controle sobre o Ministério Público.
Por que, pergunta-se, apenas a polícia não pode ser, de certa forma,
“controlada” quando se omite, ou eventualmente investiga mal, de propósito,
temerosa de represálias vindas “de cima”?
Essas raras
investigações — e certamente serão relativamente poucas —, de iniciativa do M.
Público deveriam ser encaradas até com alívio pelos profissionais na polícia
porque com eles ver-se-iam livres de pressões difíceis de resistir — às vezes
até por coleguismo — quando não há garantias no cargo ou função que ocupam. Espera-se
que a Câmara pense um pouco antes de cometer uma barbaridade.
2ª Ofensa: Correntistas
com fundos em bancos quebrados que “ficam a ver navios” (naufragados).
Com a quebra do Banco
Cruzeiro do Sul, deixando inúmeras vítimas quase sem tostão, é bem pertinente a
pergunta: Para que serve o Banco Central?
Reportagem recente do
jornal “O Estado de S. Paulo”, de 4-11-12, pág.B3, traz depoimentos de pessoas
que colocaram suas reservas financeiras em fundos do Banco Cruzeiro do Sul.
Certamente perderão tudo ou boa parte do que amealharam no decorrer dos anos.
Tem cabimento se conformar com isso? O Banco Central seria apenas um ”enfeite
posudo”?
Se quebras semelhantes
ocorrerem com mais frequência, sem reação do próprio sistema bancário, as
pessoas que se preocupam com o futuro só terão coragem de colocar suas reservas
em fundos do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, com garantia
governamental. Como o governo pode até emitir dinheiro, é se se esperar que o
que é do cliente será devolvido, numa emergência.
Praticamente nada li
sobre a quebra do Banco Cruzeiro do Sul mas as manchetes usam adjetivos
relacionados com “fraude”, ou desonestidades.
Se o Banco Central é incapaz, tecnicamente, de saber o que se passa no interior
dos bancos — relacionado com o dinheiro dos clientes —, é melhor confessar sua
própria falência. Ou providenciar uma revolução interna que tranquilize a
população. Ou será o velho colchão o melhor “banco” para se guardar o próprio
dinheiro?
É, por acaso,
necessário alterar a legislação para tornar mais eficaz a missão de zelar pelo
dinheiro dos depositantes? Que se modifiquem algumas leis, ou regulamentos. O
que não tem cabimento é o BC ser o último a saber do que se passa nas finanças
das instituições que lhe cabe vigiar.
Não parece pertinente a
alegação de que “Fundo é fundo! Há sempre um risco!” Pessoas comuns sabem
apenas, teoricamente, que alguns fundos são mais lucrativos que outros, mas,
pelo que se lê nas entrevistas, eles
ficaram é sem nada disponível de imediato. O bom senso aconselharia que a
pequenos investidores deveria ser assegurado um percentual mínimo de retorno
porque a prática usual — que não pode ser ignorada —é que os correntistas
acreditam no que lhes dizem os gerentes de banco que os atendem e convencem,
certamente de boa-fé. Ou que os bancos sejam proibidos de transferir para
fundos — apesar do pedido (enganado) do correntista — mais de 50% do dinheiro
que ele tem na instituição bancária.
Algo, enfim, precisa ser feito para que os fundos não se transformem em
armadilhas para pessoas não especializadas em finanças, como é o caso da vasta
maioria dos correntistas.
Talvez a frouxidão na
vigilância do BC decorra de um relacionamento íntimo e amistoso demais entre
funcionários do BC e os das instituições bancárias. Os contatos frequentes, se
eventualmente existem, até mesmo socialmente, tendem a afrouxar certas
vigilâncias que não podem ser facilitadas, ou esquecidas para não parecerem
sinais de “desconfiança do amigão”. É por isso, que muitos magistrados mostram-se
arredios com relação a políticos e advogados.
Amizade não casa bem
com desconfiança, mas uma certa reserva ou “desconfiança implícita” é inerente
à função de julgador, ou fiscal — caso do BC .
Se um magistrado vai a todas as festas de um advogado, seu amigo, e é
fotografado junto com o anfitrião, essas fotos podem lhe dar muito
aborrecimento futuro, porque um inimigo do hospedeiro pode alegar que tal ou
qual decisão foi fruto da parcialidade. Uma parcialidade que pode existir até
mesmo inconscientemente. É por isso que sempre fui contrário à pretensão da
OAB, no seu direito, estatutário, de um advogado exigir ser atendido por
desembargador antes de um julgamento.
O advogado nunca
procura esse contato para falar bem da parte contrária que, estando ausente,
ficará em alguma desvantagem na formação do convencimento do julgador. Se
quiser falar com o desembargador, que traga consigo o patrono da parte adversa.
Enfim, convém que o
Banco Central reveja seu sistema de vigilância. Muito já foi conseguido com a
indisponibilidade dos bens dos administradores da instituição financeira, mas
isso não basta, como se constatou. É imprescindível um aperfeiçoamento
contínuo. Punir é menos importante que
prevenir, todos sabem disso. O que não dá para tolerar é a inércia e a
indiferença com o prejuízo de centenas ou milhares de pessoas que apenas
confiaram no sistema bancário. Se o sistema não merece fé, que se admita isso
às claras, com tabuletas dizendo: “Este banco não se responsabiliza pelos
valores depositados”.
E fiquemos por aqui, evitando
artigos longos demais. Se o tamanho é exagerado, o possível leitor não lê nem
duas linhas, cansado por antecipação.
(05-11-2012)
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