quarta-feira, 9 de outubro de 2019

Teste da força do hacker na próxima decisão do STF


No coração da maioria dos brasileiros geme o pressentimento de que o STF, em data bem próxima, decidirá — entre outras coisas, por maioria de votos —, se Sérgio Moro era “suspeito” para julgar o ex-presidente Lula da Silva e, “consequentemente”, por “mera prudência”, todas as sentenças por ele proferidas nas ações oriundas da Lava Jato devem ser anuladas. Daí, “arredondar” a tragédia para “anular tudo” será um pulo, considerando que a atual composição do STF não pode ser aperfeiçoada de modo significativo em curto prazo. Gilmar, por exemplo, está longe da aposentadoria compulsória. A Lava Jato foi a única operação, de larga envergadura, que enfrentou, com risco e eficácia, o crime do colarinho branco, mas tudo indica que seus dias estão contados, haja ou não uma forte reação popular. 

A quem os réus da Lava Jato — já sentenciados ou em perigo de o ser — devem agradecer essa fraude interpretativa que foi capaz de rebaixar nossa jurisprudência, apesar de ser fruto do crime de escuta ilegal? Devem agradecer, principalmente, a um jornalista americano, aqui residente, Glenn Greenwald, que, aproveitou a criminalidade alheia — ou quem sabe também própria — as investigações continuam... —, de hackers que gravaram milhares de diálogos e mensagens de celulares de magistrados, promotores, empresários e políticos com problemas na justiça.

Acontece que nessas escutas ficaram gravados, “sem querer”, diálogos particulares entre os alvos das escutas e as pessoas que apenas conversavam com os alvos, dizendo o que lhes dava na cabeça, sem reserva. Fofocas, ameaças, calúnias, indiscrições e até confissões de crimes e pecados que são ouvidos apenas por padres, psicanalistas e advogados, obrigados a guardar segredos profissionais.

 Essas particularidades da vida privada, de todo tipo e grau, transformaram-se em preocupações. Possibilitam chantagens. Inquietam-se, tais pessoas, ao saber que suas palavras estão em poder de meliantes capazes de tudo. Para apagá-las seria preciso a boa-vontade de Greenwald, mas os cortes não interessam ao americano porque eles poderiam comprovar, em eventual perícia, que Greenwald andou editando as acusações contra Moro e Dallagnol, caso o vasto material criminoso seja um dia periciado. Por isso, certamente, Greenwald não apresenta seu “material”, sempre alegando o não mais existente sigilo da fonte porque todo mundo já sabe os nomes das quatro “fontes”: três homens e uma mulher, presos, sem prejuízo de outras prisões, conforme o aprofundamento da investigação.

Agora vem a parte mais imprevisível do “hackeamento” em tela: o imenso poder inerente ao conhecimento de segredos ou intimidades gravados em larga escala. Esse conhecimento de conversas francas transformou Greenwald em um informal êmulo de John Edgar Hoover, que permaneceu como diretor do FBI durante 48 anos. Hoover “sobreviveu” a 8 presidentes dos EUA, porque mantinha o fichário de todos os segredos dos chefes da nação, inclusive da vida conjugal. Tinha as fichas amorosas dos irmãos Kennedy e sabia tudo sobre Marilyn Monroe, por exemplo.

Na política — como em tudo o mais, e ainda mais nela — quem não tem segredos? Todos os governos, pessoas jurídicas, têm segredos, e o mesmo acontece com as pessoas físicas dos governantes. Juízes, promotores, advogados, taxistas, catedráticos, jornalistas, etc., têm segredos. Todos os habitantes da Terra os têm. Greenwald também tem os seus, mas, sendo mais esperto, tecnicamente, que os demais, sabe como não se deixar grampear. E se eventualmente não grampeia os demais — porque é arriscado —, aproveita, sem risco pessoal e com glória jornalística —, o “trabalho” criminoso de outros. Em síntese: “lucra”, ganha prêmios e influência política com a criminalidade alheia. E a jurisprudência brasileira vai se ferrar com esse lucro contra ela.

Greenwald é hoje um homem poderoso. Um eventual ministro da área jurídica, na dúvida cruel se foi ou não grampeado em seu celular, não se atreve a contrariar o jornalista. O ministro vai dançar conforme a música tocada por ele, inclusive na questão, muito subjetiva, da “suspeição” de Sérgio Moro. Greenwald sabe que a imaginação faz o medo crescer nas situações perigosas. 

Glenn Greenwald, é festejado por muitos políticos, advogados e empresários já condenados ou em vias de o ser. A técnica de ilegalmente grampear centenas ou milhares de celulares de magistrados, políticos e pessoas influentes provou ser muito mais eficaz que comprovar, nos autos do processo, juridicamente, a culpa de alguém, no caso, Moro.

Eu já disse antes, no Twitter, e repito aqui, que vivemos, no Brasil, uma triste realidade: para vencer uma demanda difícil, complicada, é mais prático, vantajoso, contratar um bom hacker que um bom advogado. Este último argumentará com longos e complicados raciocínios, de difícil compreensão popular, enquanto o hacker profissional pinçará algumas curtas frases do “inimigo” que, só por serem muito curtas, são compreendidas e aceitas como verdade absoluta. Dessa forma fica fácil convencer os seguidores de Lula que o juiz era “suspeito: — “O Lula disse que não há prova do crime e eu acredito nele”. No caso em exame, dos julgamentos de Lula, a anulação tem um efeito imediato e amplo.

No vasto material em poder de Greenwald deve constar muita coisa em favor de Sérgio Moro e contra o ex-presidente Lula. É impossível presumir que entre centenas de frases, vindas de variadas bocas, nenhuma beneficie Sérgio Moro. Alguém já perguntou ao jornalista americano — não me lembro onde — porque ele não denunciava também outras pessoas que aparecem nas gravações cometendo ilegalidades. Ele, sempre esperto, respondeu que não fazia isso porque seu interesse era apenas de mostrar que Moro não era imparcial, não podendo ele, Greenwald, assumir o papel de polícia. Ele esquece que publicando apenas as frases “contra Moro”, ele desequilibrou a balança doida da “justiça da internet” que repercute na justiça legal. Talvez nas gravações existam frases de ministros pró-Lula, de testemunhas e de advogados de defesa muito mais comprometedoras que aquelas escolhidas por Greenwald querendo prejudicar o juiz.

Paro por aqui, preocupado com o espaço. A manutenção do interesse pela leitura de artigos é inversamente proporcional à quantidade de parágrafos que ainda precisam ser lidos.


Se o leitor, ou leitora, quiser se informar mais sobre os temas conexos pode acessar meu blog — francepiro.blogspot.com.br — ou meu site www.500toques.com.br

Outros textos, conexos, têm os seguintes títulos:

“A 2ª. Turma do STF errou feio no processo contra Bendine”

“Um ‘bom’ hacker conseguirá anular a Lava Jato”?


“Cautela, STF: Lula, livre, poderá exigir indenização

“Sérgio Moro saiu-se bem no Senado”

“Sérgio Moro priorizou a verdade e não violou a lei”

Se a Lava Jato for desmoralizada, a corrupção voltará muito mais forte que antes. Segurem as carteiras e cuidado ao falar no telefone.

(09/10/2019).

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