sábado, 26 de janeiro de 2013

Israel, finalmente, revelou suas reais intenções

  O conciso, honesto e inteligente editorial “Nada muda para a Palestina”, no jornal “O Estado de S. Paulo”, de 24-01-2013, merece o aplauso irrestrito de todos aqueles — inclusive de milhares de judeus com espírito de justiça — que desejam um futuro sem conflitos internacionais. Conflitos perigosíssimos que podem até mesmo redundar em uma Terceira Guerra Mundial. A difusão do conhecimento para construir armas atômicas é inevitável — como ocorre com toda tecnologia. No caso, a difusão será lenta, em razão da complexidade técnica, mas sem dúvida impossível de ser paralisada.

Falarei, genericamente, sobre a natureza do poder atômico — de que Israel dispõe — e depois abordarei o tema principal do editorial: as eleições de 22 de janeiro último, em Israel.
Quando lançadas as duas primeiras armas atômicas, em 1945, na guerra contra o Japão, apenas os EUA conheciam todos os passos técnicos, de A a Z, na construção de tais armas que, paradoxalmente, têm a virtude (incompreendida) de impedir guerras que matariam milhões na forma tradicional de matar. Hoje, dominam essa complexa tecnologia os seguintes países: EUA, Reino Unido, França, Rússia, China (por “mera coincidência” os cinco únicos países com assento permanente no Conselho de Segurança da ONU), Israel, Coreia do Norte, Índia e Paquistão. Israel não diz expressamente, que dispõe, ou não dispõe, de ogivas nucleares mas todo mundo sabe que dispõe. E essa tecnologia infla seu poder na região, estimulando-o a fazer o que bem entenda. Inclusive “exigir”, pela intimidação, que só ele, na região — nunca o Irã, por exemplo — possa dispor dessa tecnologia de tremendo poder.
Outros países, que não concordam com os privilégios dos “cinco grandes” com poder de veto no CS, perseguirão, abertamente ou em segredo, esse conhecimento que os tornarão mais respeitados. Respeitados em tudo, porque o poder militar gera poderes colaterais. E o perigo se agrava com a difusão do conhecimento pela internet, espionagem governamental e não-governamental. Nada impedirá que grupos particulares bem organizados e financiados, revoltados com abusos de certos países dominadores, tentem  — e talvez consigam — fabricar artefatos nucleares, embora rudimentares, mas que, mesmo sendo rudimentares, possam explodir em metrôs, represas, aeroportos e centros financeiros de grandes cidades em qualquer país.
Assim como governos contratam grandes físicos para a fabricação de tais armas, grupos particulares podem também, pagando mais do que o triplo, contratar físicos necessitados de dinheiro e com conhecimento suficiente para montar artefatos capazes de eliminar milhares em única explosão.

Quando falei atrás em “virtude (incompreendida)” das armas nucleares, o leitor pode ter reagido, indignado, discordado do emprego do termo “virtude”, porque, para ele — que não meditou muito no assunto —, não pode haver virtude alguma no uso ou mero perigo do poder nuclear.
 Há, sim, desculpe o leitor, virtude não aparente no “medo atômico”. Não no uso, claro, mas no medo do uso.
Desde 1945, com as bombas lançadas em Hiroshima e Nagasaki, nem um único soldado, ou civil, foi morto em explosão nuclear. Nenhum. Se o “átomo” matou, foi em acidentes, tais como vazamento de material radioativo em usinas de eletricidade. Em compensação, milhões — militares e civis — morreram em guerras travadas com armas tradicionais, explodidas com uso de pólvora e substâncias equivalentes.
Quantos morreram na Guerra da Coreia, no Vietnam, no Laos, Camboja,  Iraque, Afeganistão e Oriente Médio? Foram carnificinas sem auxílio do átomo.
Durante a Guerra Fria, quando a União Soviética poderia — e pretendia — pelo tamanho de seu exército, ocupar países de uma Europa Ocidental esgotada pela 2ª Guerra Mundial, o que foi que impediu um conflito fatal entre os EUA e a União Soviética? O que evitou essa provável guerra foi o fato de ambas — ambas — as potências possuírem armamentos atômicos. Não há dúvida quanto a isso. Apertado o “botão vermelho” americano, ou russo, o revide seria imediato, com a mais pavorosa e “venenosa” — leia-se radioativa — guerra já presenciada pelo homem. Nem aos EUA, nem à Rússia, interessava também uma nova longa e demorada guerra tradicional, logo depois do grande massacre que durou cinco ano e matou entre quarenta e cinquenta milhões de pessoas na Europa. Se, porém, apenas uma dessas grandes potências tivesse poder nuclear, a outra teria que ceder e obedecer. Enfim, o medo, quando recíproco, tem o efeito valioso de manter a paz, mesmo com inconformado ranger de dentes.
Foi também o recíproco “risco atômico” que impediu, em 1962 — na “crise dos foguetes”, encaminhados à Cuba —, a eclosão de uma Terceira Guerra Mundial. Se Nikita Krushchev não tivesse cedido à proibição americana dos foguetes chegarem ao regime de Fidel Castro, teríamos, é quase certo, uma conflito mundial, “enriquecido” com a radioatividade. Por sinal, o gênero humano é tão idiota e orgulhoso que Krushchev, voltando atrás, ficou desmoralizado entre os militares soviéticos e perdeu o poder. Os “falcões” russos disseram que ele foi “fraco”. Evidentemente, queriam o lugar dele na política, transformando uma decisão sensata em “covardia”.
Em suma, o poder nuclear é especialmente temido e dita, em grande parte, as políticas regionais e internacionais. E esse poder está pesando fortemente na política de Israel em relação aos palestinos e a todos os vizinhos árabes. A consciência da própria força leva ao orgulho e à desconsideração pelos interesses alheios, por mais justos que estes sejam.
Netanyahu — isso sempre foi evidente para quem acompanha a política internacional — nunca pretendeu dividir a Palestina com os palestinos. Disfarçava seu secreto desejo de ser lembrado, futuramente, como o fundador de um poderoso império regional que poderia, quem sabe, em futuro mais remoto ser equivalente aos EUA de quinze anos atrás. Temia, porém, a reação americana. Agora, não mais teme o poder limitador dos EUA, pelo menos enquanto nas mãos de Barack Obama. Considera-o, provavelmente, um homem tímido que fala bonito. Antes da última eleição presidencial americana pensava-se que a passividade de Obama em relação às decisões abusivas de Netanyahu — ampliando a ocupação da Cisjordânia —, explicava-se apenas pelo medo do candidato democrata de perder o voto dos judeus, além do apoio financeiro. Mas, depois das eleições, o tom de concordância e paciência americana perdurou. E isso influiu nas eleições israelenses do dia 12-01-13. “Já dispensamos, quase, o apoio americano” é o sentimento dos políticos no poder.
Conforme bem informou o mencionado editorial do “Estado de S. Paulo”, o empresário Naftali Bennett, ex-chefe de gabinete de Netanyahu e criador do partido “Lar Judaico” não apenas se opõe a um estado palestino como também prega “a anexação ao ‘lar judaico’ de 60% do território da Cisjordânia”. Ele representa os colonos “que se multiplicam nas áreas sob ocupação, desde a guerra de 1967”, conforme informa o corajoso editorial. Esse mesmo Bennett foi bem franco, dizendo que “Basta de negociações. Basta de ilusões. Jamais haverá uma Palestina”.
Outro político israelense — ainda segundo o jornal —, que se destacou nas eleições, Yair Lapid, fundador de legenda centrista “Há futuro”, não tocou na questão palestina. O único partido de esquerda, pró-Palestina, ficou com apenas 6 parlamentares. E foi só. O editorial conclui que o projeto, não externado mas verdadeiro de Israel é criar o Grande Israel, “com a transferência dos palestinos para o que seria seu verdadeiro país, a Jordânia”. Enfim, Israel quer tudo em troca de nada. E ameaça bombardear preventivamente o Irã pelo fato de existir a possibilidade de um dia esse país construir arma nuclear. Bomba que nem poderá lançar em Israel porque, fazendo isso, mataria tanto judeus como palestinos, que vivem próximos e contam com a solidariedade iraniana. Isso sem falar que um ataque iraniano, iniciando uma guerra, significaria a imediata destruição do próprio Irã, tendo em visa o inevitável revide israelense e seu fiel amigo, ou servo, os EUA. Nem mesmo um Ahmadinejad faria uma coisa dessas. Ele não manda sozinho no seu país.,
E nada de útil faz a comunidade internacional para impedir a expulsão de um povo, o palestino, que vivia há milênios na Palestina e não foi responsável pela Diáspora judaica quase dois milênios atrás. Quem expulsou os judeus foram os romanos, não os palestinos.
É também um mistério insondável o fato de o Irã não ter utilizado seu direito de se retirar do TNP — Tratado de Não Proliferação Nuclear, assinado em1968 no governo do Xá da Pérsia, e em vigor a partir de 1970. Pelo art. 10 do Tratado qualquer país que o assinou poderia dele se retirar — a Coréia do Norte fez isso em 2003 — desde que alegue que eventos extraordinários estão colocado em risco os interesses do país. E as constantes ameaças de bombardeio das instalações nucleares, por parte de Israel — com base na desconfiança de que pode haver intenções agressivas por parte do Irã — põem claramente em risco a segurança dos persas. Comunicada a intenção de se retirar do TNP, 90 dias depois da comunicação o Irã ficaria legalmente livre da obrigação de permitir as inspeções dos fiscais da Agência Internacional de Energia Atômica. O Irã ficaria, juridicamente, na mesma situação de Israel, que está livre de inspeções nucleares porque, astutamente, nem assinou o Tratado.
Leiam, abaixo, o que diz o art. 10 do TNP:

Artigo X 

“1. Cada Parte tem, no exercício de sua soberania nacional, o direito de denunciar o Tratado se decidir que acontecimentos extraordinários,     relacionados com o assunto deste Tratado, põem em risco os interesses supremos do país.

Deverá notificar essa denúncia a todas as demais Partes do Tratado e ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, com 3 (três) meses de antecedência. Essa notificação deverá incluir uma declaração sobre os acontecimentos extraordinários que a seu juízo ameaçaram seus interesses supremos.

2. Vinte e cinco anos após a entrada em vigor do Tratado, reunir-se-á uma Conferência para decidir se o Tratado continuará em vigor indefinidamente, ou se será estendido por um ou mais períodos adicionais fixos. Essa decisão será tomada pela maioria das Partes no Tratado”. 

Por que o Irã não utiliza esse artigo e livra-se das inspeções constantes da Agência de Energia Atômica? Seria o receio de que Israel criaria infindáveis obstáculos jurídicos alegando que o Irã quer se afastar da Agência para não mais ser investigado e assim poder fabricar, sem empecilhos, armas atômicas que pretende jogar em Israel? 

Seria o caso de a ONU indagar do Irã, publicamente,  por que não se retira, com isso ficando isento da acusação de afrontar o Direito Internacional? A Coreia do Norte, tendo se afastado do TNP em 2003, não afronta, hoje, juridicamente, a ordem internacional. Assume posição antipática, mas não ilegal. Por que o Irã não segue caminho igual?

Há algum mistério nessa omissão. Omissão que possibilita grande proveito ao seu arqui-inimigo, Israel, que está sempre lembrando aos repórteres que o Irã “ofende” a ordem internacional, e que ele, Israel, não ofende porque não se comprometeu com nada, não assinou o Tratado.

Esse é o medíocre, misterioso e injusto mundo em que vivemos. Sem reação, lamentavelmente, daqueles que deveriam e poderiam reagir, por serem especialistas com autoridade. Escrevendo com frequência, mostrando o que está errado, construindo uma opinião pública mais lúcida e vigorosa, o legislador também se interessaria pelo assunto, nem que fosse por motivo eleitoral.
Encerro renovando meus parabéns ao jornal O Estado de S. Paulo que, com seu editorial, comprovou sua preocupação com todos os povos do planeta, fortes ou fracos. Sabedor de que nenhum grande injustiça coletiva permanece impune.
 A 3ª. Guerra Mundial, se eclodir, começará no Oriente Médio. Se a ONU realmente funcionasse não teria ocorrido o 11 de setembro de 2001 (a principal motivação de Bin Laden, atacando as Torres Gêmeas, era o mau tratamento dado aos palestinos); não teria existido a invasão do Afeganistão, nem do Iraque; os EUA seriam ainda hoje a grande potência que foi no passado. E judeus, palestinos e iranianos não viveriam sob constante sobressalto. Se a ONU bem funcionasse teria delimitado — ela mesma —, no solo, décadas atrás, qual seria a área a ser habitada por judeus e palestinos. E nenhum país poderia mais se subtrair da obrigação de aceitar as decisões da Corte Internacional de Justiça.
Para quem ainda não sabe, os países não estão obrigados a aceitar julgamento de seus atos por essa Corte Internacional de Justiça. E se aceitam e perdem a demanda, a Corte Internacional de Justiça “lava as mãos” quando o perdedor não cumpre a decisão. Nessa hipótese ela envia o caso para o Conselho de Segurança, que julga o que fazer não pelo enfoque do justo, mas com base no interesse e “conveniências” de toda ordem.
É possível respeitar moralmente um planeta tão mambembe na sua estrutura jurídica internacional?

(25-01-2013)

 

 

 

 

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quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Sem ousadas simplificações, como entender o mundo?


Sem ousadas simplificações, como entender o mundo?

Com o compreensível esforço dos redatores na sofisticação do próprio estilo —  exigência do “mercado”... —, acrescido da real complexidade dos assuntos e considerando, infelizmente, a deformação proposital da opinião pública em alguns temas que afetam poderosos interesses, não há como afastar a necessidade de simplificar e conectar — com proposital “candura esclarecedora” — os argumentos mais importantes sobre temas essenciais que moldarão nosso futuro, próximo e remoto. Os grandes jornais precisam pensar nisso, se realmente pretendem esclarecer a opinião pública.

Se a democracia é o sistema menos imperfeito de governo, se apenas o povo é, em última análise, a fonte originária do poder, para que serve — pergunta-se — conferir-lhe o direito de votar se o “povão” só entende 10%, digamos, dos temas mais importantes mencionados nos os jornais e revistas mais sérios?

Mesmo desconsiderando-se o chamado “analfabetismo funcional” , não é possível ignorar que os sofisticados artigos de fundo, os editoriais e as exaustivas reportagens só chegam em reduzida fração de compreensão ao cérebro da vasta maioria da população. O resultado disso é o esperável: frequentes más escolhas, por mera ignorância, no momento de votar. Não me lembro qual foi o grande político e filósofo inglês do século dezenove que, transportado em sua carruagem ao local de votação, perguntou ao cocheiro em qual dos dois candidatos, ou partidos, ele iria voltar. Só havia dois. Ouvindo a resposta, o grande pensador —  homem prático... — ordenou: “Vamos voltar, porque seu voto anula o meu”.

Alguém dirá que, “Tudo bem!, relativamente poucos leem jornais e revistas sérias, mas a “massa” assiste televisão, sendo por ela suficientemente informada”. Assiste, mas a televisão fornece informação parca e tendenciosa. E canais seriamente empenhados em bem informar em geral não parecem atraentes para a maioria dos telespectadores. As pessoas ligam o aparelho para descansar e se distrair, não para se instruírem ou se informarem de forma menos superficial.

O político astuto que pretende ser eleito, ou reeleito, oferece aos eleitores — pela televisão — aquilo que está ao alcance da compreensão deles, em termos genéricos: dinheiro no bolso, emprego, saúde, escolas, direitos (com omissão dos deveres), acréscimo na “vida mansa”, mais liberdade para tudo, mais feriados prolongados, e tudo o que é agradável de ouvir. Não será “besta” de dizer que é preciso sacrificar alguma vantagem atual — principalmente remuneratória (“Deus me livre!”) — para garantir um futuro melhor daqui a alguns anos ou para desfrute das gerações futuras. E não “perde tempo” explicando como conseguirá os milagres prometidos, caso eleito, porque, alega, o tempo é curto na televisão, como realmente é.

Mesmo aqueles que ainda são assinantes de jornais não passam horas diárias lendo jornais e revistas, pensando no que leem, salvo exceções. É preciso trabalhar, ganhar a vida e cuidar de variados interesses. E quando — raridade! — querem conhecer menos superficialmente os mais complexos problemas que nos rodeiam, esbarram com um muro difícil de transpor, inclusive por falta de tempo: a difícil compreensão dos textos, elaborados por pessoas que conhecem o assunto mas que precisam zelar pela própria reputação de intelectual, ou profundo conhecedor do tema.

Autores de artigos sérios costumam — há corajosas exceções — escrever preocupados com não parecerem suficientemente eruditos e originais. Acham que é preciso embelezar, com floreios de estilo — mesmo sóbrios, “ao ponto”— as suas exposições. Não querem parecer portadores de um estilo algo infantil, simplório. Temem a má impressão que causarão a seus colegas de profissão caso escrevam com uma clareza redutora que todos compreendam.

Esse temor não é infundado. E nem mesmo censurável quando o texto é para ser lido apenas por seus iguais, como ocorre com teses acadêmicas, jurídicas, econômicas e científicas de alto nível. O autor de tais trabalhos sabe, de antemão, que seu trabalho será lido por uns poucos, a elite intelectual que precisa agradar. E para agradar, no caso, é necessário unir profundo conhecimento a um estilo não fácil de entender. Enfim, o “povão” não é o seu alvo. Mas se convém que o tema seja compreendido pela “massa” — não ignara, apenas sem escolaridade suficiente — é preciso que o esclarecimento  seja feito da mesma maneira que um professor catedrático, em seu lar, expõe sua opinião para o filho adolescente ou para a esposa que nada entende do assunto.

Como melhorar o país sem, ao mesmo tempo, informá-lo melhor — pela maneira de explicar — o que acontece no planeta, no seu país, no seu estado e até mesmo, por vezes, nas grandes capitais? Dizer que cabe apenas às escolas essa missão é fugir da realidade. O adulto que trabalha, ou mesmo o aposentado — ele vota... — precisa ser diuturnamente esclarecido para saber, em poucas mas sábias palavras claras, e com exemplos, o que significa uma série de siglas e temas que são mencionados até mesmo na televisão mas que, para o espectador, nada representam porque para eles o tema é “grego”. Principalmente os acontecimentos que ocorrem no dia a dia.

Não está, aqui, propondo-se a criação de uma página de jornal contendo apenas  um glossário de termos. Sugere-se que um grande especialista do assunto não só explique “o que é” tal coisa mas também que dê sua opinião sincera~— e por vezes corajosa — sobre o valor ou desvalor de determinada política, lei, projeto de lei, entidade governamental, tribunal, órgão, tema, conceito, ou o que lhe pareça necessário esclarecer sobre fatos da atualidade. Obviamente, as explicações da “página- resumo” não podem ficar a cargo de jornalistas não especializados — a não ser, excepcionalmente, quando um repórter foi, com sua investigação, muito além de qualquer teórico  —, porque um redator não especialista dificilmente estará em condições produzir sínteses inteligentes, não deformadoras e de fácil compreensão.

Einstein, em certa passagem, disse que a simplificação é útil, mas não pode ser enganadora. Esse cuidado obrigaria os grandes jornais a contratar conhecedores do mundo do Direito, da Economia, da Segurança Pública, da Saúde, dos Bancos, da Medicina, da Engenharia e de tudo o mais que aparece no noticiário e exige uma certa “ajuda” para entender.

Um ditado antigo dizia que “Os príncipes — melhor seria dizer, os reis — sabiam tudo sem nunca terem estudado nada”.  Um governante com muito bom senso, corajoso, honesto — mental e financeiramente — e preocupado com seus súditos pode realizar um bom governo.  Basta convocar para ministros e colaboradores pessoas confiáveis e recomendadas pelas melhores cabeças do país. Quando o assunto for intrinsecamente polêmico — não polêmico apenas porque fere interesses ilícitos — o governante pode convocar outro ‘expert” que discorde do anterior, para que os dois discutam na frente dele. Se ainda na dúvida, convocará um terceiro. Se for bem intencionado o governante poderá chegar a uma boa conclusão. Se o tempo mostrar que escolheu mau o caminho, procurará outro. Em suma, com auxílio dos realmente conhecedores do tema difícil — tornado o mais fácil possível —, poderá chegar à solução que melhor convém aos governados, sem a necessidade de tentar, inutilmente, ler vários volumes de um tema específico e difícil. Atualmente, todo presidente, governador e muitos prefeitos recebem, diariamente, um resumo dos assuntos que interessam ao governo. Se o assunto é longo, o resumo dirá em qual jornal o governante poderá se inteirar melhor dos detalhes.

Nos EUA é verdade sabida que a maioria dos discursos presidenciais não são redigidos pelos presidentes. Sabe-se até o nome dos jornalistas que escrevem os pronunciamentos mais notórios. Salvo engano, esses “speechwriters” têm até sindicatos, ou associações. O presidente diz ao seu “escritor fantasma”, com palavras bem diretas, o que ele pensa — ou duvida — sobre tal ou qual assunto que intriga a nação e o jornalista escreve do jeito que lhe parecer melhor, apenas preocupado em não contrariar as ideias do chefe, que depois apenas aprova ou pede alguma alteração.

Enfim, se hoje até presidentes da república e governadores — que no geral tiveram boa escolaridade — precisam de conhecedores e redatores que “mastiguem” certos temas difíceis, por que o “povão”, que escolhe o presidente ou governador, deve permanecer na ignorância de temas candentes que afetarão suas vidas e as vidas de seus descendentes?

Dos intelectuais, ou técnicos de alto nível, que aceitarem a algo “ingrata” missão de simplificar — sem deformar — problemas vitais do nosso tempo, será exigível muita bravura moral — e boa remuneração —, porque grandes controvérsias muitas vezes nada mais são que velhas feridas que poucos se atreveram a desinfetar. Não seria muito útil criar uma “página-síntese” se não for concedido, a quem nela escreve, o direito de opinar francamente, embora em termos educados, contra tal ou qual posição que lhe pareça — e demonstre — mera defesa de interesses inconfessáveis. E fazer uma síntese exata e sincera sobre certas questões é gerar ressentimentos ou mesmo inimigos mortais. Apenas brincando, sugere-se, aqui, que a remuneração do “sintetizador suicida” venha com o bônus de um colete a prova de balas.

Há ainda um lado bom, comercial, para os jornais nessa iniciativa da “página da verdade direta”: acredito que 80% dos assinantes, pegando o jornal, irão logo para a “página síntese”, e só depois — se houver tempo para tanto... — é que irão para as páginas que mais gostam de ler. Mesmo os conhecedores dos assuntos mais complicados e menos compreendidos certamente terão a curiosidade de ler tais “sínteses”, só para verificar se a sintetização está correta, na exposição e na conclusão. E teríamos belas polêmicas.

Em suma, se reis, antigamente, e presidentes, presentemente, necessitam de “mastigadores” do alimento intelectual mais “duro”, o cidadão comum também precisa dos grandes simplificadores capazes de facilitar a assimilação do nutriente mental. Não esquecer que um presidente da república não passa, essencialmente, de um mero representante, ou empregado, do seu senhor: o povo. E o empregado não deve “comer” melhor que o patrão.

Vamos ver se algum jornal do Brasil se interessa pela sugestão.

(15-01-2013)