quinta-feira, 22 de outubro de 2020

A burocracia pode matar mais rápido que a doença.

Machado de Assis — para mim um tremendo filósofo informal, além de literato — já disse que “Em matéria de língua, quem quer tudo muito explicado, arrisca-se a não explicar nada”. Disse ainda que “Se quiser aconselhar, aconselhe, mas seja breve”. 

Seguindo o conselho de Machado, tentei ser o mais breve possível, mesmo porque não sou médico. Mas como convencer sem explicar direitinho? Tudo em excesso é prejudicial, até o pouco. 

As sugestões abaixo são apenas “ideias” que, após as discussões econômicas e jurídicas, poderão ser transformadas em lei. Rebater as possíveis críticas ao aqui proposto, sob todos os ângulos, afastaria os leitores. Deixaria de ajudar os candidatos a prefeitos e vereadores, em todo o Brasil, interessados em iniciativas que salvarão vidas, hoje perdidas por causa de burocracias pouco inteligentes. As sugestões interessam aos políticos e, mais ainda, à comunidade. 

As propostas não têm ordem de prioridade. Cabe a cada candidato avaliar a que lhe pareça mais útil.  São elas: 

1ª Sugestão. 

Obrigar os postos de saúde, e autorizar, as farmácias, querendo, a medir a pressão arterial de qualquer adulto que solicite esse serviço, mesmo sem pedido médico. A medição será feita por um profissional de farmácia, ou funcionário do estabelecimento comprovadamente apto para esse trabalho. A remuneração da farmácia para cada verificação será módica, com um teto anual fixado em percentual do salário mínimo. Sugiro não mais de dez reais, no momento, quando o serviço for prestado em farmácia. Se a medição for feita no posto de saúde, obviamente será de graça, ou também módica. 

Motivação da proposta: poucos meses atrás, no começo da pandemia do coronavírus, fui a um Posto de Saúde, na cidade de São Paulo, para medir a pressão arterial. Como a tenho normalmente baixa, tendência de família, e gosto de sal, achei prudente saber como ela estava. Se estivesse normal, eu não precisaria ir a um médico, do meu plano de saúde, com risco de contágio pelo vírus. 

Para minha surpresa, a farmacêutica, ou médica, do posto — não me lembro do detalhe —, disse-me, educadamente, que para medir a pressão eu precisaria apresentar um pedido médico, sem o qual ela não poderia fazer a medição. Espantei-me com a exigência porque é comum ver-se, em farmácia, u’a máquina em que a pessoa pode, inserindo uma moeda no aparelho, medir a pressão. Se uma simples máquina pode fazer isso, por que a obrigatoriedade de procurar um médico? Com o SUS já sobrecarregado, por que esperar meses, para ser atendido em algo tão simples? 

2ª Sugestão 

Verificar o nível de glicose no posto de saúde, ou na farmácia. 

A burocracia municipal, porém, não se limitou a isso. Quando solicitei à mesma enfermeira, ou médica, que tirasse uma gota de sangue do meu dedo, para verificar a glicose, ela, sempre educada, me disse que isso também não seria possível, porque também nesse caso era necessário pedido médico. Ela me perguntou se eu era diabético. Disse que não, porque a cada dois ou três meses eu pedia a uma pessoa amiga, diabética, que examinasse minha glicose, usando o aparelhinho dela, e nunca passei de 108 mg/dl, mas essa amiga estava agora fora do Brasil. Por isso tinha ido ao posto.

 Essa burocracia municipal, ou estadual, ou federal parece pensar que nosso país é riquíssimo, todos com um excelente médico a seu dispor, quando o que existe é o contrário, com pessoas deitadas no corredor do hospital, por falta de leitos e de médicos. Em linguagem franca, a burocracia está, embora involuntariamente, matando, cegando e amputando pernas, por falta de realismo, de senso de proporção e excesso de zelo profissional dos médicos, confundindo o país como uma Suíça do futuro. 

Por que matando ou aleijando? Porque o homem pobre que está com pressão muito alta, pode imaginar que apenas anda “meio indisposto” porque dorme ou se alimenta mal. Na verdade está é, apressando sua morte com um ataque cardíaco. Procurar um médico depois de ver negado seu pedido no posto de saúde? Nem pensar. E se estiver altamente diabético, pode nem saber qual é sua real situação porque sua doença é silenciosa. Até que um dia acorda cego ou é o brigado a cortar uma perna. Ou duas, como relato a seguir. 

Lembro-me da conversa que tive, anos atrás, com um senhor cego e sem as pernas, quando eu estava na Flórida, em viagem de turismo. Enquanto minha mulher visitava uma igreja eu a aguardava, na calçada, próximo da porta de entrada. Ao meu lado estava um cadeirante não muito idoso. Ele tinha no peito uma placa mencionando que era cego e pedia esmola. Dei a ele uma cédula, ele agradeceu e mantivemos uma breve troca de palavras. 

Como as duas pernas tinham sido amputadas na altura dos joelhos, simetricamente, atrevi-me a lhe perguntar se perdera as pernas em um acidente de trem. Ele me explicou que não. Estava sem as pernas por causa do diabetes. Não sabia que tinha essa doença, até que um dia acordou cego e pouco depois teve que amputar os membros por causa da gangrena. 

No Brasil, com tanta pobreza, haveria menos casos de cegueira, ou de amputação de dedos, pés, ou pernas, se o cidadão pudesse verificar sua glicose de graça, em posto de saúde, ou pagando menos de dez reais em uma farmácia. Constatado o diabetes, seria encaminhado a um médico, ou orientado para isso, sob pena de ficar fora do SUS, ou repreensão equivalente. Há um velho ditado: “o ótimo é inimigo do bom”, conselho que deve estar sempre presente no legislador.   

3ª Sugestão 

Testes médicos — visão e audição — obrigatórios ao entrar nas escolas públicas municipais. 

Resumo: toda criança, ou adolescente, admitida a uma escola pública deveria ter sua visão e audição examinadas. Se o aluno não ouve bem, apesar de dizer, ofendido — “eu não sou surdo!”—, ou não consegue ler textos com letras pequenas, com ambos os olhos — um de cada vez —, deveria, na escola, por lei, ser examinado por a um especialista para se ver o que é possível se fazer para que se interesse pelo que diz o professor. 

Ou, “se não gosta de ler” — talvez por um problema visual — é preciso saber se os dois olhos veem perfeitamente, com ou sem lentes corretivas. Se um olho enxerga bem e o outro não, isso trará aversão à leitura, que deveria sempre ser agradável, visualmente. 

A maioria dos dicionários, impressos com letras quase microscópica, desestimula sua leitura, que seria muito útil  porque, se lidos com frequência, habituam o consulente, ou leitor prazeiroso, a pensar e se expressar com concisão, tal a objetividade das definições, um bom remédio contra o “analfabetismo funcional”. Os dois olhos devem trabalhar com igualdade de forças, principalmente nas leituras mais extensas. 

 Posso lhes garantir que há muitos “maus alunos” que poderiam se transformar em “bons alunos” se ouvissem e lessem perfeitamente. Como não podem ficar, o tempo todo, pedindo ao professor para repetir o que disseram — seriam vaiados —,  sentam-se no fundo da classe, pensando em tudo, menos no que diz o professor. 

Outras vezes os maus alunos precisam apenas de óculos, com os graus certos para cada olho. Se os pais não têm dinheiro para a comprá-los a escola faria isso, pensando do futuro do menino ou rapazola. Se o glaucoma, por exemplo, já lesou o nervo ótico do olho deficiente, o aluno, ou responsável será orientado para um treinamento que lhe permitirá ler textos, usando as técnicas que  os oculistas já ensinam quando o cliente perdeu um olho em acidente. 

Ficam por aqui minhas sugestões na esfera municipal. Com perdão pela extensão inevitável, exigível para eventual convencimento. Daqui a uns dias, farei novas sugestões, se alguém gostou destas. 

(21/10/2020)

sábado, 10 de outubro de 2020

Celso de Mello está claramente enganado no seu último voto

Foto divulgação

O decano, homem inteligente, de invulgar memória mas excessivamente politizado na sua função judicante, insistiu, no seu voto de despedida, que o presidente Jair Bolsonaro é obrigado a prestar um depoimento presencial, físico ou virtual, no inquérito — inquérito, vejam bem, não ação penal —, que investiga a suspeita — mera desconfiança de Sérgio Moro — de que Bolsonaro pretendia influir na Polícia Federal, protegendo seus filhos em investigações. Moro não chegou a dizer que Bolsonaro interveio na investigação, disse apenas que provavelmente tinha essa intenção. 

O ilustre Ministro Celso de Mello, no seu voto, insistiu na ideia de que “todos são iguais perante a lei”. Lei que, no caso, seria o CPP, Código de Processo Penal, que no seu capítulo VI, contém vários artigos, a partir do 202 até o art.225, orientando o juiz — juiz, frise-se — como proceder a respeito de depoimentos de vítimas e testemunhas. 

O art.221 diz que “O Presidente e o Vice-Presidente da República, os senadores”... (segue-se longa lista de autoridades) “serão inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados entre eles e o juiz”.    (Redação dada pela Lei nº 3.653, de 4.11.1959).  

E no seu parágrafo 1º está expresso que “ O Presidente e o Vice-Presidente da República, os presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal poderão optar pela prestação de depoimento por escrito, caso em que as perguntas, formuladas pelas partes e deferidas pelo juiz, lhes serão transmitidas por ofício. (Redação dada pela Lei nº 6416, de 24.05.1977)    

O leitor já deve ter notado que todos os artigos acima citados, usam a palavra juiz para designar quem fará as perguntas ao acusado, ou réu. E na nossa sistemática legal, juiz é a pessoa mencionada nas transcrições acima mencionadas. A figura jurídica do juiz só “existe”, legalmente, depois que um promotor — que não é juiz —, ofereceu a denúncia contra alguma pessoa que já foi investigada em inquérito policial que concluiu haver provas ou indícios da existência de um crime previsto na legislação penal. E Bolsonaro ainda não foi nem investigado, nem indiciado, nem denunciado como autor de Fake News. Esse inquérito estranho, um tanto vago, e sem precedentes, um dia será classificado como uma excrescência jurídica, de triste memória, na sua formação e desenvolvimento. Uma espécie de tribunal de exceção. 

Apenas a título de ilustração do leitor não afeito a temas jurídicos, vejamos o que diz Guilherme Nucci, no seu Dicionário Jurídico:

“INQUÉRITO POLICIAL: trata-se de procedimento administrativo preparatório da ação penal, conduzido pela autoridade policial, de natureza inquisitiva, regido pelo sigilo, voltado à formação do convencimento do Ministério Público para que possa propor demanda policial”. Como diz, deve ser conduzido pela polícia, não pelo STF.

Não sendo Bolsonaro réu em processo judicial relacionado com Fake News, descabe a fundamentação do ilustre decano. Ele cita artigos só aplicáveis quando o procedimento já está em juízo, quando houve inquérito, denúncia e esta foi recebida por um juiz de direito. 

Se Alexandre de Morais sente-se à vontade, juridicamente, para continuar com sua incumbência de atacar e desmoralizar um presidente — agindo simultaneamente como vítima, investigador, delegado, promotor denunciante e juiz recebedor de denúncia — cabe-lhe prosseguir colhendo provas, onde ela existirem, sem a necessidade de obrigar um “mero” investigado, presidente da república, a ser interrogado com possível arrogância de um delegado que talvez o detesta e só fará perguntas maldosas,  relacionadas com eventuais maus procedimentos de filho ou amigos de longa data. 

O leitor talvez não saiba que em um “interrogatório” policial, ou judicial, só quem interroga tem o direito de escolher os tópicos do “diálogo” unilateral. O interrogado não pode criticar a eventual má intenção oculta das perguntas, e muito menos criticar o possível jeitão agressivo, arrogante, da autoridade. Se fizer isso, leva um pito, com um “cala a boca”! E pito em presidente da república dá um cartaz tremendo. Mesmo quando maneiroso, um delegado ou juiz pode, por fingida “livre associação momentânea de ideias”, insistir em lembrar malfeitos de parentes ou amigos do interrogado. E se o interrogado tiver pavio curto, tornando-se agressivo, isso trará prejuízo de sua imagem pública. 

Alguém dirá que Bolsonaro pode apenas silenciar, alegando que ninguém pode ser obrigado a se auto acusar. Se ele fizer isso, na frente da televisão, seus inimigos, e pessoas ignorantes dirão que “quem cala consente, se fosse honesto não teria o que esconder”. 

Para não cansar os leitores — deve haver mais de um — concluo que essa exigência de depoimento do Bolsonaro presencial visa apenas prejudicá-lo politicamente. 

Apoio Bolsonaro, pelo conjunto da obra, pela sua coragem, por ser inimigo da corrupção e por ter sido legitimamente eleito pela população. Não sou cego para suas falhas e penso que algumas das suas más decisões são fruto do seu isolamento político e da falta de leituras de alto nível. Os ataques coordenados contra ele não visam apenas tirá-lo do poder. Querem caçar a “chapa” inteira, presidente e vice, porque querem logo o poder. Para tais inimigos, é uma imensa alegria cada vez que ele, atacado, reagem conforme seu temperamento. E quando ele, contrariado, reage de modo pacífico, é atacado por ter sido brando demais, “ele no fundo é mole e só tem objetivos eleitorais”. 

Por acaso, os ataques contra ele não têm intenções eleitorais? 

(10/10/2020)