domingo, 21 de fevereiro de 2016

A volta da CPMF, agora com redução do I. Renda. Depardieu e Putin

No dia 1º do corrente mês de fevereiro, publiquei no meu blog em português — francepiroblogspot.com — um artigo (“Conciliando crescimento econômico com ajuste das contas públicas”) tecendo considerações não só sobre a difícil convivência de políticas econômicas opostas — ajuste e crescimento —, como também sugerindo, na parte final, a aprovação da CPMF com o dobro da alíquota mencionada como intenção do governo: 0,2%.

Se qualquer “imposto do cheque” é tão odiado, por que sugeri o dobro da alíquota pretendida pelo governo?

Porque o acréscimo de 0,2% — em toda transferência de dinheiro via cheque, cartão de crédito e de débito e transferência eletrônica — seria destinado especificamente à redução do percentual do Imposto de Renda, pessoa física, descontado na fonte. A alíquota máxima atualmente, como todos sabem, é de 27,5%. E é possível que venha a ser aumentada, caso o Congresso não aprove a CPMF. Essa (má) intenção já foi mencionada meses atrás.

Repetindo: com o percentual total de 0,4% — ou outro percentual mais adequado, resultante do estudo e projeções entre os interessados, governo e oposição — em cada transação, metade da arrecadação da CPMF iria para a destinação já mencionada pelo governo e a outra metade serviria especificamente para a redução do IR da pessoa física.

Disse, também, que com a redução do IR da pessoa física, aqueles contribuintes “na marra”, os assalariados com desconto na folha de pagamento —, sem possibilidade de sonegação, por mais habilidosos que sejam —, sentir-se-iam menos revoltados com a perspectiva do retorno da CPMF. E frisei que essa redução do IR teria que vigorar na mesma data da cobrança da CPMF. Nada do governo desfrutar do “imposto do cheque” e jogar para um incerto futuro o “estudo” visando diminuir ou suprimir o IRPF (pessoa física).

Com esse contrapeso na área tributária a classe média não mais consideraria a CPMF como sendo apenas “mais um imposto!”. Passaria a encarar esse tributo como tendo “algumas virtudes”. Metade do percentual desse novo tributo seria realmente, um imposto à mais — destinado a aliviar um urgente problema de caixa do governo federal — porém, em compensação, a outra metade aliviaria a classe média do peso do imposto de renda descontado na fonte.

No fundo, tudo o que digo aqui é um aceno para futura adoção do Imposto Único, ou quase único. O Imposto Único, no longo prazo, é o tributo do futuro, unificador, sem burocracia, sem sonegação, sem papelada, mas que precisa começar em algum momento. Se não foi utilizado, até agora, por nenhum país importante é porque obrigava todo mundo a contribuir, democraticamente. Esperar que o Brasil esteja em um mar de rosas para iniciar a aplicação dessa nova forma de tributar é esperar que as galinhas nasçam com dentes. Ressalte-se que a CPMF é um tributo de substituição, trocando dezenas de impostos por no máximo três, quatro ou cinco, se tanto.

Por que sou favorável a um tributo tão antipatizado como a  CPMF? Porque é simples, direto, indesviável, insonegável e abrangente. É uma arma contra a sonegação. E não se diga que prejudica o pobre porque o realmente pobre não usa cheques, não faz transferências eletrônicas e geralmente não paga suas compras com cartão de crédito. Utiliza, quase sempre, dinheiro vivo, não tributado quando passa de mão em mão.

No artigo, lembrei que o presidente russo, Vladimir Putin, ex-comunista — portanto com algum residual DNA socialista—, considerou suficiente, e justa, a alíquota única do I. Renda em 10% para todas as rendas. Por causa disso, o ator francês, Gerard Depardieu mudou de país, adotando a cidadania russa, revoltado com a perspectiva, anunciada na França, da alíquota máxima francesa subir para 75%. Um verdadeiro confisco de seu ganho como ator de grande talento e sucesso. Salvo engano, a alíquota máxima russa subiu depois para 13%, certamente por causa do cerco econômico que a Rússia vem sofrendo, por motivação política, dos EUA e da União Europeia.

Caso os assalariados brasileiros conseguissem — aproveitando a “onda” da CPMF — a redução do IR (pessoa física) para 10%, ou bem menos dos atuais 27,5%, é possível que milionários de todo o mundo sentir-se-iam motivados a residir e trabalhar no Brasil, trazendo parte de sua riqueza para cá, em vez de deixar na mão de seus países de origem, “fanaticamente arrecadores”. Imitariam, no Brasil, o que, na Rússia, fez Depardieu, sem precisar mudar de nacionalidade.

 Com uma alíquota baixa do IR, aproximadamente igual à da Federação Russa, o Brasil seria mais atraente que a terra do Presidente Putin porque o Brasil não está sob cerco financeiro internacional. E não paira, sobre nossas cabeças, a ameaça de conflitos bélicos de grau até mesmo nuclear. Lembre-se que a Rússia enfrenta, brava e perigosamente, o Estado Islâmico e apoia a Síria e o Irã, países ricos em petróleo, ambicionado por interesses internacionais que me dispenso de mencionar aqui, talvez já percebidos pelo leitor.

O único “senão”, brasileiro, para atrair estrangeiros altamente posicionadas financeiramente está no fraco desempenho, em anos mais recentes, de nosso governo federal, em termos de planejamento e execução de metas. A demagogia e a impunidade, que travam nosso progresso, estão em vias de baixar de nível, conforme recentes decisões judiciais. Essa situação, porém, não é algo irreversível porque a população não aguenta mais e exige isso até nas ruas.

Nada impede, além do mais, que o Brasil, constatando o benefício da redução do IR da pessoa física, venha também a reduzir o mesmo tributo para as pessoas jurídicas. Isso atrairia investidores de todo o mundo. Levariam em conta o nosso “lado bom”: não sofremos terremotos, tsunamis, situação de pré-guerra, terrorismo, nem cercos financeiros internacionais.  

É comum o argumento de que a alíquota máxima do nosso IR, pessoa física, é um dos mais baixos, em comparação com o que é cobrado — aparentemente sem revolta dos contribuintes — em outros países do primeiro mundo. Na faixa máxima da Suécia, o percentual é de 58,2%; na Alemanha, 51,2%; no Japão, 45,5%; na Espanha, 48%; no Japão, 45,5%.

Como minha desconfiança em assuntos que envolvem o vil e santo metal — “mexam com minha alma, mas não mexam com meu bolso” — aumenta com o passar dos anos, confesso que sempre estranhei a resignação dos “endinheirados” europeus e americanos em aceitar uma tributação tão alta do IR, pessoa física, mesmo levando em conta que os governos de seus países assumem despesas não assumidas devidamente pelo governo brasileiro na área da educação, saúde, e previdência social.

Como nunca morei fora do Brasil, conhecendo alguns países apenas como breve turista, nunca me interessei nem perguntei aos locais se eles, quando altamente remunerados, aceitavam de boa vontade deixar para seus governos, mais de metade do que auferiam com o próprio trabalho, ou engenho inventivo. Hoje, bem mais velho — portanto mais desconfiado — pergunto-me se por trás dessa conformidade com tanta resignação de contribuinte, não haveria um explicação mais rasteira que nunca conviria verbalizar. Se mencionada, aumentaria a fiscalização.

Refiro-me à hipótese — mera hipótese... — de haver brechas legais, contábeis e bancárias permitindo, nesses países de altíssimos percentuais de IR, que um contribuinte, tendo auferido, por exemplo, um ganho anual, real, de dez milhões de euros, ou dólares, possa declarar, na declaração anual — sem infringir diretamente a legislação —, que ganhou metade, ou menos, do que realmente ganhou.

Toda legislação, de qualquer país, enseja manobras, jurídicas e/ou contábeis, permitindo, em maior ou menor escala, que parte da renda auferida pelo contribuinte seja aplicada de tal ou qual forma, não ilegal, reduzindo seu desembolso para o Fisco. Fusões, incorporações ou desmembramentos previstos em lei permitem, provavelmente, substancial economia para o contribuinte, embora essa parte “meio escondida” não possa ser, de imediato utilizada. Fica como reserva, mas permanece no patrimônio do contribuinte.

 Um tributarista especialmente capaz pode, certamente, montar um esquema que, não sendo tecnicamente ilegal, permitirá que um altíssimo percentual da riqueza do cliente escape do “Leão”. Isso incentiva o “felino’, forte mas comodista, a morder à vontade a “caça” miúda,  classe média, manietada pelo desconto do IR no holerite.

Talvez essa situação — ou eventual situação, não condenemos sem provas — explique a aparente tranquilidade da aceitação, nos países ricos, desses altos percentuais do IR da pessoa física de altos rendimentos. Na verdade, o contribuinte, escondendo legalmente a metade do ganho, não se sentiria prejudicado deixando para o “leão” a metade da metade, 25% de um total de 100%.

Se estou sendo calunioso dos países ricos, que um raio não me mate agora, porque é só a hipótese de um inato descrente do ser humano. Sem esquecer que pertenço a essa miserável espécie.

Se eventualmente — quanto otimismo... — falei alguma bobagem, sinto-me confortado pelo que disse um grande economista inglês, Alfred Marshall, falecido em 1924: “No fim de quase meio século de estudo quase exclusivo de economia, estou consciente de uma maior ignorância em relação a ela que no início”. (“Antologia da Maldade”, dicionário de citações, de Gustavo H.B. Franco e Fabio Giambiagi. Ed. Zahar)

(21-02-2016)

Nenhum comentário:

Postar um comentário