quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Podemos confiar no resultado da eleição de 2014? Não, mas pelo bem da ordem e da paz, convém fingir que sim.

(Nota: O título é longo demais, mas considerando que os leitores estão cada vez mais solicitados — e impacientes... —, convém que os artigos de opinião digam logo qual a conclusão do autor.)

Depois de gastar algumas horas lendo, na imprensa e na internet — nesta também ouvindo extensas explicações técnicas — sobre a confiabilidade, ou não, do resultado das eleições de 2014, principalmente a presidencial, não tenho a menor dúvida de que os números exatos proclamados oficialmente têm valor mais simbólico do que real.

Quem se interessar mais profundamente pelo assunto, e disponha de tempo, acesse o site https://www.youtube.com/watch?v=vy2gt58cmaQ&feature=youtu.be assistindo as diversas exposições, nem sempre totalmente compreensíveis, tecnicamente,  mas que transmitem, pelo menos, a impressão de que os expositores conhecem profundamente o assunto e dizem o que realmente pensam. A linguagem corporal —, no caso, a voz e o olhar —, não pode ser totalmente desprezada em qualquer comunicação verbal.

Depois de ouvir todos eles, ou a maior parte deles, e reunir as informações captadas em outras fontes, a conclusão, praticamente inafastável, é a de que somente uma fé quase religiosa — porque não exige comprovação — dará como totalmente confiável o resultado da eleição presidencial de 2014. Em decorrência da própria fragilidade da técnica de apuração, ora utilizada, provavelmente nenhuma perícia judicial garantiria que a contagem verdadeira seria de exatamente xis votos para cada candidato.

Não se discute, aqui, a confiabilidade das autoridades e funcionários que trabalharam na fase de recepção do votos. Pelo menos nas maiores cidades. A dúvida, severa — pelo que se deduz das explicações técnicas que ouvi —, é sobre o que acontece após o ato de votar, quando do manejo dos números durante suas transferências de um “lugar” eletrônico para outro. No mesmo computador e entre computadores diferentes, operados por variadas pessoas que provavelmente sabem da dificuldade de se comprovar um eventual “engano” durante  sua digitação.

Os digitadores são seres humanos e todos sabem, até por experiência própria, como age o “homo sapiens”, quando sabe que sua eventual “inexatidão” — talvez autodesculpada como “patriótica”— dificilmente poderá ser comprovada.

Qualquer eleição, exclusivamente eletrônica, no Brasil ou em qualquer outro país — sem a emissão concomitante de um impresso a ser depositado em urna, para a hipótese de eventual recontagem de votos — permite a alteração de dados conforme os números parciais vão passando de um computador para outro no longo processo de soma dos resultados parciais.

O processo de apuração é realmente longo e tremendamente complexo. Ouça, leitor, os depoimentos acima recomendados. Centenas de mãos manipulam — no bom e mau sentido —, os resultados parciais.

Mesmo que a Justiça Eleitoral, como instituição, se esforce para que a apuração seja perfeita, esse desejo será utópico. Utópico porque dependente de uma perfectibilidade moral humana que não existe em parte alguma, principalmente quando é grande o número de operadores “clicando” no sistema. Somente dois países, no mundo, adotam o sistema brasileiro: o Brasil e a Índia.

O voto exclusivamente eletrônico não foi invenção brasileira, informou um expositor. Foi usado, pela primeira vez, na Holanda, dois anos antes de ser adotado no Brasil. O grande atrativo estava na rapidez da apuração. Uma maravilha, realmente, se não houvesse  o fator humano. Todavia, a própria Holanda, inventora do processo, concluiu, após experiência, que o voto eletrônico não era à prova de fraudes.

No Brasil — e não só no Brasil —, basta saber que um sistema qualquer não é totalmente seguro para concluir que “haverá fraude, com toda certeza!”, quando estão em jogo interesses poderosíssimos, como foi o caso da nossa última eleição presidencial.

Se, pelo ângulo técnico, há uma desconfiança generalizada da possibilidade de fraude, não há porque manter, nas próximas eleições, um sistema que gera fundada desconfiança. É muita pretensão nossa dizer que o Brasil e Índia são os dois únicos países “inteligentes”, no mundo, adotando o voto eletrônico sem um rastro físico, escrito, que possa depois permitir uma recontagem segura.

Há, também, outro fator, jurídico, sugerindo modificações na técnica de contagem de votos, em futuras eleições.

Pela nossa legislação cabe à Justiça Eleitoral julgar demandas de natureza eleitoral. Ocorre que o prejudicado pela aparente má-apuração pode estar alegando falha estrutural ou pessoal — falta de confiabilidade — da própria Justiça Eleitoral, em seu órgão máximo, o Tribunal Superior Eleitoral. Em suma: o “réu” (Tribunal) julgando seu próprio ato. E julgamento em causa própria sempre é visto com suspeição.

Pela Constituição Federal —art.121 § 3º — as decisões do Tribunal Superior Eleitoral “são irrecorríveis, salvo as que contrariarem esta Constituição e as denegatórias de "habeas-corpus" ou mandado de segurança”.

Em assuntos técnicos, relacionados com a informática e operações  matemáticas a solução do problema exige conhecimentos que obrigam os magistrados a recorrerem a peritos muito especializados, implicando em depósito de quantias elevadas a título de honorários dos peritos. Em um caso de Alagoas, a falta de depósito resultou na condenação do reclamante a pagar dois milhões de reais, como “litigante de má-fé” ( porque não depositou os honorários da perícia). Tal decisão funcionou como um poderoso desestímulo a qualquer candidato que, mesmo de boa-fé, não se conforma — talvez com razão — com o baixo número de votos quando tinha razões para crer que sua votação seria muito maior.

Não é razoável, nem prudente, o Brasil, apenas acompanhado da Índia, considerar-se, com ela, os dois únicos países “certos”, no Planeta, quanto à segurança da urna eletrônica. A Alemanha já considerou inconstitucional essa forma de apuração..

Não obstante a existência de uma dúvida que jamais desaparecerá, na recente eleição presidencial, a melhor solução, ou “saída patriótica” para o país, está em aceitar, ou mesmo “engolir” o resultado oficial, mesmo de difícil digestão.

Uma decisão judicial, depois de longo processamento, proclamando eventualmente que “houve engano” e que o presidente eleito é Aécio Neves, incendiaria literalmente o país, com conflitos diários nas ruas. Os seguidores de Dilma diriam que “se o primeiro resultado oficial não vale para a presidência, também não deveria valer para a escolha dos governadores”, tendo em vista a possibilidade de fraudes em toda a eleição. Seria o caos. O país mergulharia na anarquia.

A modificação, pela justiça, de uma eleição presidencial só é factível em um país pequeno, ordeiro, de alto grau de educação. Em uma Suíça, ou Noruega, essa modificação de resultado seria acatada com tolerância. No Brasil, porém, com os baixos índices de educação e respeito pelo Poder Judiciário, essa dúvida tornaria o país ingovernável. A insegurança se instalaria não só no Governo Federal como também em quase todos os Estados. A própria complexidade técnica na busca — ideal, quase impossível — da contagem exata de votos forneceria a “gasolina” necessária ao incêndio de centenas de ônibus, lojas e casas. E talvez tanto esforço na busca judicial da exatidão teria utilidade relativa.

Imaginemos que uma perícia judicial excepcionalmente perfeita —, algo improvável —, concluísse, após anos de disputa judicial, que dois milhões de votos dados a Aécio foram atribuídos à Dilma. Tal esforço seria praticamente inútil porque a diferença de votos proclamados foi de quase três milhões. Dilma continuaria presidente.

Para finalizar, o PSDB pode, hoje, no fundo, preferir a “vitória moral” do alto índice de aprovação. Os próximos anos serão trabalhosos para qualquer presidente brasileiro, considerando os  escândalos, baixo crescimento econômico, insegurança e um extenso rol de problemas.

O que não pode acontecer é que na próxima eleição presidencial o voto continue apenas eletrônico. Se nosso atual sistema de captação de votos continuar como está — a oposição querendo mudar e o governo lutando contra —, essa resistência já será prova, ou forte indício de má-fé. Desejo explícito e confessado de perpetuação no poder.

(27-11-2014)

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