Para não citar eu mesmo, ilustre desconhecido, cito uma das
melhores cabeças que praticam o bom jornalismo no Brasil, Eliane Cantanhêde, sempre
lúcida. Ela sintetizou, em poucas linhas o que se deve fazer para salvar o
Brasil da anarquia total — política, jurídica e econômica — que nos aguarda,
caso Temer fique impedido de continuar seu trabalho de saneamento das finanças.
Eliane Cantanhêde encerrou seu artigo de ontem (07/07-2017)
no “Estadão” dizendo o seguinte: “O que ninguém está percebendo, porém, é que a
troca de Temer por Maia não assegura tranquilidade, nem aprovação de reformas,
nem recuperação da economia. E quem lucrará com o esfarelamento do governo?
Lula, o PT e Bolsonaro. Basta olhar a curva das pesquisas. Se Temer cair, ele
vai, mas a crise fica”.
Se a Câmara dos Deputados tiver um mínimo de juízo, coragem,
previsão e patriotismo inteligente — porque existe também o patriotismo burro —
ela, Câmara, deve negar, ao STF, a autorização para receber a denúncia
apresentada pelo atual Procurador Geral da República. Este combativo cidadão não
esconde seu rancor — profissional e pessoal — contra o Presidente em exercício.
Já prometeu, em discurso metafórico, flechá-lo
ou envenená-lo com dardos, enquanto tiver fôlego e caneta na mão.
Ninguém pode negar que o Dr. Rodrigo Janot é um profissional
capaz e combativo. É especialista do Direito Penal e do Processual Penal, mas
um excesso de especialidade pode — às vezes —, ter seus efeitos negativos. É o caso
do Dr. Janot, no item “derrubar agora, o Michel Temer”. Ele sabe que se a
Câmara negar, hoje, a autorização ao STF, nem por isso eventuais crimes comuns
de Temer ficarão impunes.
Quando Temer terminar
seu mandato provisório, em janeiro de 2019, ele poderá ser processado por causa
da conversa com Joesley. Seus “crimes” não estarão prescritos com essa diminuta
espera — saneadora, por isso virtuosa —, se o Congresso tiver juízo. Temer está
se esforçando, com competente assessoria econômica, para achar o melhor
caminho, com medidas de curto e longo alcance. Curto, porque brasileiros mais
pobres não têm reservas para esperar o saneamento de longo percurso, conforme
os planos racionais de Meirelles. Por isso, Temer transige com algumas medidas que
desafogam o atual aperto oriundo do desemprego.
Assim, se Temer poderá ser futuramente processado, por que
essa ânsia de Janot em derrubá-lo agora, impedindo-o de prosseguir com reformas
extremamente necessárias, como é o caso da trabalhista, previdenciária e muitas
outras, em doloroso andamento?
Alguém já definiu que “ especialista é aquele que sabe cada
vez mais de cada vez menos”. Por causa de sua especialização, o especialista vê
o mundo só pelo ângulo de sua especialidade. Um ambientalista fanático é capaz
de tudo para, por exemplo, travar, por anos, com medidas judiciais, a
construção de uma estrada de ferro porque sua realização implicaria em aterrar
uma lagoa, ou charco, onde existem determinadas rãs, ou sapos, em perigo, de
extinção. Outras vezes a necessidade de cortar uma grande e bonita árvore trava
uma obra que traria enormes benefícios. Rãs ou uma árvore não valem mais que
gente.
A política pode ser praticada com visão curta, média ou
longa. Assemelha-se ao jogo de xadrez. Só que cem vezes mais complicada, porque
nesse jogo são poucas as peças cujos movimentos precisam ser pensados. No
“xadrez” da política há uma infinidade de “peças” em movimento: velhas
práticas, legislação defasada, tribunais, mídia, investimentos, luta encarniçada,
pelo poder, mentiras e verdades misturadas no liquidificador eleitoral, etc.
Não obstante a enorme diferença quantitativa entre o xadrez
e a política em ambos os jogos é necessário, para vencer, usar a inteligência
estratégica de sacrificar uma “peça” menos importante visando salvar outra mais
valiosa. Sacrificar até a própria rainha para conseguir, mais adiante, o
“xeque-mate”.
É esta a situação no Brasil de hoje. Derrubar Temer com base
nas acusações dos açougueiros bilionários — que se enriqueceram com favores de
Lula e Dilma, abrindo os cofres do BNDES —, é o “ xeque” que pode se
transformar em “xeque-mate” contra o país.
Temer não tem “carisma” — essa besteira superficial, embora
simpática —, mas tem se dedicado, sinceramente, para salvar a economia
nacional, cercando-se, na área econômica, de pessoas que entendem do que fazem.
Teve a coragem de mexer em dois vespeiros: a reforma da legislação trabalhista
— que afugenta qualquer investidor inteligente — e a reforma previdenciária,
que permitiu, legalmente, aposentadorias precoces, inclusive a minha.
Se eventualmente Temer pedia dinheiro aos dois irmãos
Batista, para campanhas eleitorais de seu partido, ou coligados, ele fazia o
que quase todos os políticos (eleitos) também faziam, porque no Brasil pessoas
físicas nunca tiveram por hábito dar dinheiro aos políticos, para fins
eleitorais. Essa era a realidade em um país em que sua população pouco lê e
depende da televisão e do rádio para sua informação — quase sempre tendenciosa,
convenhamos.
Janot valorizou demais o fato de Temer ter recebido, à
noite, sigilosamente, um dos ex-açougueiros que financiavam partidos. Conversas
sigilosas sempre existiram na política. São próprias dos políticos, como se vê
diuturnamente na televisão, políticos conversando com a mão escondendo a boca,
porque inimigos e repórteres podem conhecer a leitura labial e o fuxico
incrementa a venda de jornais e revistas. A luta pelo poder raramente é elegante.
Não só no Brasil.
Lendo recente resenha de um livro escrito por Alzira Vagas
sobre seu pai, Getúlio Vargas, ela nos informa que quando seu irmão caçula
estava para morrer — vítima de paralisia infantil não tratada — ela informou ao
pai que seu filho “Getulinho” — por quem Getúlio tenha verdadeira adoração —
estava morrendo, precisando de sua presença, Getúlio chorou mas informou à
Alzira que não poderia ir ao leito de morte porque tinha marcado uma reunião sigilosa
com o presidente americano Franklin Delano Roosevelt, que estava no Brasil para
isso. Provavelmente para tratar de um assunto importantíssimo: a adesão do
Brasil na luta contra Hitler. Getúlio, apesar de pai amoroso, era pessoa responsável,
sabia que não poderia faltar a essa reunião secreta.
Há na vida de todos
nós, vez por outra, há momentos em que precisamos conversar a sós. Não acredito
que jamais o Dr. Janot disse, em conversa particular, alguma frase que poderia
prejudicá-lo caso sua conversa estivesse sendo gravada. Não seria próprio de um
ser humano — principalmente em sua delicada função —, manter tão rígida
vigilância na escolha de palavras. É por isso que o “estado policial”, ou “governo
do fuxico” é visto com antipatia. Quem fala tudo o que pensa, sem escolher
audiência, logo terá que se arrepender.
Temer sabia quanto os irmãos da
JBS haviam ajudado, com doações eleitorais, os deputados de todos os partidos,
inclusive Eduardo Cunha. Sabia o quanto esse ex-presidente da Câmara era
perigoso e imprevisível. Contrariado, provisoriamente sem dinheiro para manter
a família no padrão de vida habitual, preso, julgando-se traído, Cunha poderia,
por vingança, dizer ou escrever um monte de verdades e/ou mentiras a respeito
de todo mundo, inclusive contra Temer, pondo contra ele inúmeros deputados,
beneficiados pelas vastas doações dos irmãos Batista. Por isso, seria de toda
conveniência, manter Cunha sossegado, sem anseios vingativos, embora preso mas com
sua família amparada. Temer precisava do máximo de votos possíveis para suas
reformas. Não se deve cutucar onça (Cunha) com vara curta. Digo isso caso seja
total verdade o que consta na gravação da conversa sigilosa gravada por Joesley
Batista. Resumindo: se Temer eventualmente recomendou a Joesley que não fizesse
nada capaz de, naquele momento, provocar Cunha, ele agiu pensando em algo mais
alto, mais importante: sanear as finanças do país.
Alguém dirá que Janot, como
Procurador Geral, ouvindo as gravações traiçoeiras feitas por Joesley, não
poderia simplesmente ignorá-las. Teria que pedir as investigações contra Temer,
sob pena de incorrer em um crime funcional por omissão. Certo, esse raciocínio.
Ele cumpriu sua função. Acusou formalmente o presidente. Mas não precisava,
depois, ficar fazendo de tudo para derrubar o presidente, como se ele fosse seu
inimigo pessoal.
Cabe, porém, à Câmara dos
Deputados, numa visão mais abrangente, decidir não apenas com a visão jurídica,
mas também com o critério político de oportunidade, considerando que o
afastamento de Temer, agora, só prolongaria, sem resolver, a agonia do povo
brasileiro, fuga dos investidores estrangeiros e nacionais, anarquia e
paralisia administrativa, jogando para o lixo tudo o que está sendo encaminhado
pela equipe econômica.
Como já disse alguém, o Brasil
não é para principiantes. Mas Temer faz o que pode para desentortar o Brasil.
Quem quiser apenas “pegar” o Temer, porque não simpatiza com ele, que espere os
meses que faltam para a eleição do próximo presidente, que não será ele. Lembro
também que Temer, como vice-presidente, nada decidia quando no cargo,
marginalizado por Dilma, como todos sabem. Não foi um traidor. Apenas cumpriu
sua função normal de substituir a presidente, afastada pelo impeachment.
Desculpem a extensão, que mesmo assim,
não disse tudo que poderia ser dito.
(08-07-2017)